Com o crescente índice de obesidade registrado no mundo todo, em especial entre as crianças, o tema tem despertado a atenção de diversas organizações públicas e privadas. Não por acaso a ONU proclamou em 2016 a década da nutrição. Se por um lado temos cerca de 1,9 bilhões de pessoas no mundo com sobrepeso, na outra ponta temos cerca de 2, 6 bilhões de pessoas que sofrem com a fome ou desnutrição. Um desafio que convoca nações, sociedade civil organizada e iniciativa privada para atuar num processo colaborativo como recomenda a própria OMS (Organização Mundial da saúde).
Para prevenir e tratar a obesidade, diversas diretrizes já foram estabelecidas pelos órgãos globais e locais, mas na prática ainda existem poucas iniciativas multistakeholder conforme recomendado pela OMS. Acredito que a alienação de alguns setores econômicos - que ainda não reconhecem seus impactos negativos - e o radicalismo de outras organizações sociais - as empresas são sempre vilãs - impede que o avanço seja maior.
Quando setores ligados diretamente à causa, como as seguradoras de saúde, se envolvem mais fortemente na temática, caso da Amil, Bradesco e Allianz com ações preventivas para seus segurados, que também contribuem para redução da sinistralidade dos planos de saúde, parece não haver grandes novidades. A polêmica aparece quando a indústria de alimentos resolve fazer parte do jogo. É difícil para ativistas e organizações sociais mais radicais acreditar no interesse destes atores; até porque muitos são realmente oportunistas.
Vale ressaltar que a rotina intensa da vida contemporânea e o aumento da população mundial não nos permite viver e comer como nossos avós. Precisamos nos adaptar para uma vida mais prática, onde famílias não tem o tempo desejado para compra e preparo dos alimentos frescos. A indústria entra para otimizar a produção, o transporte e o desperdício de alimentos e, não muito raro, a busca pelo resultado sem entender seus impactos e riscos faz com que executivos coloquem no mercado produtos ricos em sódio, gorduras e açúcar. Os alimentos industrializados passam a ser mais práticos, saborosos e até mais baratos do que frutas, verduras e legumes.
Na última década, pressionados por legislação e sociedade, o setor intensificou mudanças no portfólio de produtos e no marketing. E é exatamente no marketing que as iniciativas confundem a cabeça dos envolvidos no tema. Nós da Lynx tivemos a oportunidade de vivenciar uma das principais polêmicas do marketing de causa que se iniciou no ano passado: a parceria entre o chef-ativista-celebridade internacional Jamie Oliver e a líder mundial em proteína animal, BRF/Sadia.
Para concretizar a parceria, o chef fez um acordo para criar uma linha de produtos com seu nome: além de exigir rigorosos padrões de cuidados animais, construiu junto com a Sadia um programa educacional infantil, que tem como propósito inspirar e educar a sociedade a se alimentar melhor e viver uma vida mais saudável, contribuindo para a redução dos índices de obesidade local e global. Um desafio que foi prontamente aceito por vários outros especialistas que acreditam no movimento coletivo. Entretanto, o programa também sofreu críticas dos mais conservadores e de grupos sem informação adequada: um ativista com a indústria? Jaime Oliver foi comprado.
Vejamos por outro lado: as mudanças que Jaime Oliver está promovendo são intensamente maiores do que se ele ficasse simplesmente criticando o líder mundial. O programa educacional Saber Alimenta, fruto da parceria, prevê atingir 500 mil crianças até 2019, por meio da formação de educadores de escolas públicas.
O projeto piloto realizado em Santa Catarina, em parceria com a Secretaria Estadual de Educação, já conseguiu resultados quantitativos e qualitativos incríveis. Educadores, famílias e crianças tiveram seus hábitos alimentares alterados num processo de aprendizagem ativo e inovador.
Agir com responsabilidade na execução de um programa como este é essencial para que não seja considerado um ação de marketing para vender produtos ou persuadir crianças, como uma propaganda subliminar.Se adaptar para transformar é um dos princípios essenciais para quem deseja de fato contribuir com um mundo melhor.
Por mais difícil que possa parecer, sim, a indústria de alimentos está e precisa viver novos tempos para garantir sua sobrevivência no futuro. De que lado você prefere estar: da crítica ou da transformação?