Se isso é verdade para o comum dos mortais, tudo indica que para o governo as coisas são parecidas. As sucessivas idas e vindas em relação à votação da reforma da Previdência, nos últimos dias, dão a impressão de que, no Planalto, a corrida para fechar o ano desta vez foi levada aos extremos. O vota-não-vota acabou se transformando numa bolsa de apostas, com as esperadas repercussões no vaivém dos mercados. E o Congresso virou palco de uma disputa surda entre os "senhores" da agenda econômica.
Os desencontros chegaram ao limite na semana passada: o precipitado anúncio de adiamento da votação para fevereiro, pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), foi desmentido logo em seguida pelo Planalto e confirmado no dia seguinte pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) - com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, tentando sustentar que o governo continuava disposto a levar o projeto ao plenário em 18/19 de dezembro. Agora o novo prazo é depois do Carnaval, a partir de 19 de fevereiro, e o ponto que falta na tal emenda aglutinativa - que, por sinal, não foi lida na sessão desta quinta-feira - é a regra de transição para garantir aposentadorias integrais aos servidores públicos que ingressaram até 2003 .
Claro que essa pressa não é de todo injustificada. Depois de um 2017 marcado pelas denúncias de corrupção contra Temer e a turma do Planalto, vem aí um 2018 contaminado pelo clima eleitoral - e ninguém tem dúvida de que reforma da Previdência não é exatamente uma promessa de campanha que atraia o eleitorado. Há inclusive uma certa desconfiança de que essa votação pule de 2018 para 2019 - já com um novo presidente instalado no Planalto e uma nova configuração da base parlamentar. O governo trata de passar o recado de que, sem a reforma, a projeção de crescimento do PIB do ano que vem cai de 3% para 2,85%.
Não faria muito sentido, contudo, votar já a reforma da Previdência a qualquer custo, sem abrir espaço para discussões de fundo. O próprio Maia argumentou que o Planalto ganhará tempo para esclarecer a sociedade sobre a importância das mudanças - ainda que isso pareça muito mais uma desculpa do que uma explicação real para o adiamento. O fato é que até agora o governo não conseguiu os 308 votos necessários à aprovação da reforma, apesar de todas as concessões feitas aos parlamentares e dos principais partidos da base terem fechado questão em torno desse apoio.
Com um governo em final de mandato e uma sucessão atribulada, como tudo indica que a de 2018 será, uma reforma dessa magnitude, sem um aval mais amplo da sociedade, tenderia a ser implantada de forma conflagrada. Só para lembrar: a reforma trabalhista, que enfrentou menos resistências durante sua tramitação no Congresso, mesmo assim não foi encampada integralmente nem pela Justiça do Trabalho.