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Práticas empresariais sustentáveis

Como medir a diversidade para promover um ambiente mais inclusivo nas organizações

Todas as organizações usam dados e informações para decisões estratégicas. Os KPIs (Key Performance Indicator, ou, em português, Indicadores-Chave de Desempenho) são parceiros das empresas para promover uma base na hora de explorar novos mercados ou melhorar produtos e serviços, por exemplo. No entanto, quando pesquisamos KPIs ou indicadores de diversidade na internet, encontramos poucos resultados e, na maioria das vezes, são materiais em inglês. Por que ainda se fala pouco neste assunto no Brasil?

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Por Amcham Brasil
Atualização:

Apenas recentemente a cobrança sobre índices de diversidade e sustentabilidade começou a ser feita: e os dois estão correlacionados. O pilar do desenvolvimento social da empresa não se relaciona apenas ao entorno, mas também dentro da empresa, como lembra Guilherme Bara, gerente de Relacionamento e Diversidade da Fundação Espaço ECO, instituída pela BASF: "Temos uma tendência, mesmo os profissionais de sustentabilidade, de dar um peso muito maior ao pilar ambiental. Nisso acabamos abandonado o pilar social, ou dando um peso menor. Mesmo quando olhamos para esse pilar social, costumamos olhar para questões mais assistenciais: a gente esquece de perceber que o público interno da empresa é um aspecto social importante. E você trabalhar a qualidade da relação entre as pessoas, ter um ambiente diverso e inclusivo, é fundamental para um pilar social forte".

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Se a inclusão é algo subjetivo, como transformar esse assunto em algo palpável, usando números? Segundo Bara, há dois tipos de indicadores dentro do processo de medir a diversidade. Um é o que chama de "retrato", o que dá uma visão do que a empresa está fazendo agora. São números como quantidade de homens e mulheres, brancos e negros, e que podem ser segmentados por hierarquia, setor e localidade. O outro é chamado pelo especialista de "diagnóstico", e tem um papel um pouco mais estratégico, de entender aqueles resultados anteriores.

"Uma coisa é você saber que 20% da sua liderança é formada por mulheres. Outra é entender esse número, tentar ver qual o índice de retenção que você tem dois anos após a licença maternidade, e comparar com a volta da licença paternidade. A partir disso, você consegue ver se o seu ambiente é inclusivo para mulheres que voltam da licença", exemplifica Bara. Fazer questionamentos sobre quem pede mais demissão, quem é mais demitido e quem procura a empresa pode detectar gaps nos processos de seleção, retenção e desenvolvimento de carreira.

O grande desafio dos líderes de diversidade é utilizarem esse indicador de forma estratégica, expondo os benefícios das diferenças dentro da equipe. Bara vê que existe uma grande dificuldade de transformar o conceito da inclusão em ações. Nesse caso, os KPIs tem um peso muito grande, pois tangibilizam e racionalizam a questão. Mostrar o desafio que as mulheres enfrentam com a dupla ou tripla jornada de trabalho mexe com o emocional da liderança para sensibilizá-los quanto à questão da desigualdade de gênero. Juntando com dados racionais - como, por exemplo, que quase 60% das pessoas com nível superior são mulheres -, é mais fácil para esses gestores enxergarem que a exclusão na organização pode estar afastando talentos. O mesmo raciocínio vale para outras tantas minorias. "Esse gestor, por mais que ele seja homem, sabe a dificuldade que é para arrumar um talento no mercado, porque no Brasil tem um gap educacional muito forte. Então, se não tiver um ambiente inclusivo, o líder tem mais dificuldades de trazer pessoas legais para dentro da empresa", explica.

Achar talentos é cada vez mais necessário para a sobrevivência da organização. Para Bara, romper com os vieses inconscientes significa aumentar essa possibilidade. Além disso, as gerações mais jovens têm mais identificação com as empresas que tem como foco as próprias pessoas. Um jeito de promover esse foco é a inclusão. "Cada vez mais, as pessoas não querem abrir mão de suas singularidades na hora de escolher um emprego. E nos índices de melhores empresas para se trabalhar, a grande maioria das organizações que ganha sempre têm como destaque temas de diversidade", lembra.

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Uma das ações da Fundação Espaço ECO é justamente trabalhar dando suporte a empresas que buscam a organização para fomentar o tema. Não há uma fórmula ou caminho pré-determinado para desenvolver o tema - Bara lembra que, inicialmente, é preciso avaliar o estágio de maturidade em que a empresa se encontra antes de implementar qualquer programa ou ação. "Começamos com o engajamento da alta liderança e trazendo indicadores externos, como os do IBGE e dados de outras empresas, para mostrar que é um tema que tem relação com o negócio. Depois, quando a empresa quer se aprofundar, identificamos o que é prioridade para essa empresa, vemos se tem metas [de inclusão], para ajudar a priorizar", orienta.

Autodeclaração

Uma questão importante sobre indicadores é que alguns deles dependem de autodeclaração. Na hora de realizar censos sobre a população LGBT, a organização necessita que os próprios colaboradores declarem sua orientação sexual ou de gênero. No entanto, muitas vezes não se sentem à vontade por conta da discriminação. Nesse caso, Bara lembra que a construção de um ambiente inclusivo antecede esse processo. A partir do momento que a empresa realiza campanhas e comunicações internas voltadas a esse grupo, deixando claro seu posicionamento contra a LGBTfobia, o reflexo é que as pessoas desse grupo se sentem mais seguras para se autodeclararem.

Como exemplo é possível citar as diversas ações e campanhas das organizações no dia Dia Internacional contra a Homofobia, Bifobia e Transfobia, celebrado no dia 17 de maio, um dia que acabou engajando diversas companhias e instituições. "Imagina a diferença para a vida dessas pessoas que antes precisava deixar parte delas em casa para trabalhar, não podiam atender celular, se referiam a seu companheiro ou companheira como amigo ou amiga, e a partir dali podiam ser elas mesmas. Construir esse ambiente inclusivo, ter ações de comunicação e a liderança como porta-voz faz toda a diferença, principalmente para o público LGBT ficar mais à vontade", explica.

Na PwC, Ana Malvestio, sócia e líder de Diversidade & Inclusão da organização, conta que essa foi a ação da empresa no campo do grupo LGBT. Durante uma apresentação no comitê de Diversidade e Inclusão da Amcham - São Paulo, no dia 14/08, Malvestio relatou que a empresa realiza um censo com seus colaboradores anualmente - chamado de Global People Survey. Dentro desse questionário, algumas perguntas relacionadas à diversidade foram incluídas para começar o trabalho nesse pilar. No entanto, nenhuma dessas perguntas foi colocada como obrigatória, justamente para que as pessoas que não se sentissem coagidas a falar. Nos processos seletivos, também é questionado se o candidato faz parte de algum grupo diverso.

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"O que é aconselhável é não tornar isso uma exigência. Se a empresa estiver bastante engajada [com o tema diversidade] e isso for público, estar no código de conduta, por exemplo, há todo um ambiente favorável para medir. A partir dessas análises, dá para saber qual o grupo mais necessitado de políticas e o que está funcionando ou não em nossas estratégias", relatou.

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Esses índices ajudaram a identificar algumas particularidades da organização. Uma delas é o gap geracional: a maioria dos colaboradores da PwC é millennial, mas a liderança ainda é majoritariamente baby boomer. Ou seja, é necessário trabalhar para que haja sinergia entre esses dois grupos.

Há também uma parte do questionário voltado à avaliação de políticas de inclusão. Assim, a empresa consegue identificar o nível de satisfação dos colaboradores em relação a essas ações, identificando o que funciona para cada grupo e o que precisa melhorar. "Precisamos engajar as pessoas que acham que diversidade é perda de tempo. E, para engajar a alta liderança, temos que mostrar a realidade a partir de fatos e dados, do quantitativo e qualitativo, para desmistificar paradigmas que são criados", resume Malvestio.

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