Essas dificuldades atingem principalmente os pequenos produtores ou as propriedades familiares. Responsáveis por mais de 80% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros, esse nicho representa entre R$ 300 e R$ 400 milhões no setor. Segundo Murillo Freire, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a perda de produção na fase inicial da cadeia envolve problemas de infraestrutura logística e baixo nível tecnológico nas propriedades. Erros no preparo do solo, a falta de equipamentos adequados para colheita e o armazenamento são algumas questões enfrentadas por esse nicho.
"O armazenamento é completamente inadequado, no caso de grãos: às vezes existem grandes silos, de 30 toneladas, em que os pequenos proprietários misturam quantidades de diferentes produtores, grãos colhidos com características e técnicas de cultivo diferentes. Então não há homogeneização do grão. Dependendo da finalidade do grão, isso pode provocar problemas de umidade excessiva, fungos e insetos que vão se desenvolver no armazenamento inadequado. Junto a isso, há o transporte rudimentar - um caminhão inadequado, estradas ruins, o que vai deixando um monte de grão na estrada", resume o especialista.
Além disso, no setor de armazenagem há um grande déficit: Marcelo Alvares de Oliveira, presidente da Associação Brasileira de Pós-Colheita de Grãos (ABRAPOS), lembra que a produção de grãos aumenta a cada ano no país, mas a capacidade estática de armazenagem não cresceu. Cálculos da Silo Verde, organização que produz silos (estrutura montada para o armazenamento de produtos agrícolas) voltados a grãos e ração de animais, apontam que esse déficit está entre 25% e 30%. Ou seja, de tudo que é produzido no território, mais de um quarto não tem onde ser apropriadamente guardado.
Como lembra Maurício Bruno, diretor de Marketing e Vendas da empresa, o impacto mais forte é sentido justamente pelos pequenos produtores. Pelas quantidades menores de safra e por menos condição de investimento, muitos acabam guardando grãos em sacas, deixando o produto mais vulnerável às mudanças climáticas e causando perdas.
Silo sustentável com plástico reciclado
A Silo Verde foi uma empresa que surgiu justamente dessa necessidade de melhorar as condições dos pequenos produtores. A empresa desenvolveu um silo voltado a essas propriedades, feito a partir da reciclagem de garrafas PET. Com capacidade para seis toneladas - usando a soja como parâmetro -, cada silo é feito a partir de quatro mil garrafas.
A vantagem do material, segundo Bruno, é a menor condutividade térmica do que o de aço, que é o material mais usual para os silos. Feito a partir de placas de plástico montáveis, o silo é construído em quatro horas e apresenta vantagens também no frete: o peso é menor e ele consegue ser despachado desmontado, em poucas caixas, o que diminui o preço. Além disso, o silo de plástico pode chegar a 80 anos de vida útil, enquanto o do aço dura no máximo 40 anos. A estrutura ajuda a preservar a qualidade do grão, o que ajuda o produtor a vender com maior rentabilidade. Além disso, ele ganha também em qualidade de vida, pois não tem que carregar sacos carregados e pesados.
"A armazenagem continua com os mesmos modelos arcaicos: latarias gigantes que dependem do preço do aço, de investimentos grandes e que só são viáveis a partir de um volume grande. Os grandes produtores já têm essas condições de boa armazenagem. Nossa proposta é trazer um produto acessível que traga ao pequeno produtor rural condições para ter qualidade em seus processos", resume.
A organização, que recebeu o Prêmio Eco de Sustentabilidade da Amcham em 2017, tem a tecnologia do silo patenteada em dez países e na comunidade europeia. O plástico é fornecido por empresas de reciclagem, recolhendo resíduos de grandes geradores de PET. "Auxiliamos essas empresas para tornarmos a logística reversa deles. São organizações que verificamos o histórico, para ver se entram dentro do mesmo conceito de sustentabilidade que temos", esclarece.
Cooperativas
No caso de pequenas propriedades no Sul do país, a prática que vem dado certo para as pequenas propriedades é confiar a armazenagem em cooperativas, segundo Marcelo Oliveira. "Produtores menores acabam entregando os produtos nas cooperativas que fazem esses processos nos grãos. Para eles, para montar estrutura de armazenagem com secadores, limpeza e pré-limpeza é muito custoso. As cooperativas conseguem receber do produtor e cobrar um custo de armazenagem pequeno", explica.
Para ele, a área de pós-colheita ainda carece de bastante estudo. Apesar de tecnologias importantes, é necessário cuidado quando importamos soluções de outros países. "Temos que pensar que as tecnologias que vêm de países de clima temperado carecem de mais pesquisas e estudos aplicados no Brasil para serem validadas. O que funciona no Canadá, às vezes, não funciona no Brasil", pontua.
A inovação, segundo Maurício Bruno, é a grande tônica para melhorar as condições de produção dessas propriedades menores: "Existe um campo para crescer. O jovem está voltando ao campo, se especializando e trazendo mais tecnologia, qualidade e quantidade também. A maneira que temos de colaborar é sair da mesmice e daquele campo da comodidade e ir para o campo da inovação. A Silo Verde vem puxando essa fila, com sustentabilidade e tecnologia. Se as empresas privadas enxergarem isso como potencial, o agricultor familiar vai ter melhores condições de ganho de vida".