Apesar de analistas estarem refazendo as contas para câmbio, inflação e até desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) após o rebaixamento da classificação de risco soberano do Brasil pela Standard & Poor's (S&P), o maior impacto da perda do grau de investimento não será econômico ou financeiro e sim político.
A S&P cortou o rating soberano brasileiro em moeda estrangeira para BB+ e manteve negativa a perspectiva (outlook) da nota. Para o Brasil não voltar a cair na escala de ratings da S&P, será importante ver se a presidente Dilma Rousseff terá forças para cortar o espaço do PT - em particular o do ministro do Planejamento, Nelson Barbosa - na condução da sua política econômica.
O cálculo que os investidores vão fazer para decidir a alocação de recursos ao Brasil em comparação com outros países emergentes parece ser o seguinte:
Seguirá o Brasil em nítida deterioração política?
Seguirá a presidente Dilma recuando de medidas consideradas ortodoxas, impondo sucessivas derrotas ao plano de correção macroeconômica do ministro da Fazenda, Joaquim Levy?
Ontem, Dilma voltou a dar declarações de apoio a Levy. Mais ainda: em entrevista publicada hoje pelo jornal Valor Econômico, a presidente bradou que a meta para 2016 é um superávit primário de 0,7% e que vai perseguir tal meta.
Quantas vezes não se viram idas e vindas de Dilma em relação às medidas do ajuste fiscal?
Aliás, a reação do ministro Nelson Barbosa à notícia do rebaixamento não parece ser a de que a ficha caiu quanto à gravidade da situação econômica do País nem quanto à percepção de que o principal mal atingindo o Brasil é a completa falta de confiança de empresários, de investidores e de consumidores sobre a recuperação da economia brasileira.
Segundo o ministro, que concedeu entrevista no Palácio do Planalto, as medidas adotadas pelo governo ocorrem na velocidade necessária, possível e que o cenário econômico e político permitem.
Barbosa lembrou que este ano o governo fez um contingenciamento do orçamento vigente de cerca de R$ 78 bilhões e, no orçamento de 2016, revisou as metas e prioridades de vários programas do governo adaptando-a ao novo cenário fiscal. "Estamos tomando as medidas na direção certa, na velocidade certa e vamos tomar novas medidas para melhorar a situação do Brasil", disse.
Para um conhecido economista brasileiro, a perda do grau de investimento sanciona a interpretação das "barbeiragens" cometidas pelo governo Dilma. "E mostra o custo ao País de mantê-la na Presidência por mais três anos", diz.
Para ele, após o impacto inicial do rebaixamento sobre os preços dos ativos, os investidores vão ficar atentos à articulação política do governo nas próximas semanas.
"Sem articulação política eficaz, não se consegue cortar gastos ou aumentar impostos e qualquer afirmação sobre superávit no ano que vem fica fragilizada", afirma.
Assim, eis as dúvidas que o mercado vai tentar dirimir nos próximos dias:
Dilma fará um ajuste via corte de gastos - e não apenas aumentando impostos para cobrir o rombo nas contas do governo - sob pena de não sobreviver até o fim do seu mandato?
O PT, na figura de Nelson Barbosa, perderá espaço nas decisões de política econômica?
Na opinião de Cristiano Noronha, analista sênior da consultoria política Arko Advice, a perda do grau de investimento talvez não seja ainda o choque suficiente para a presidente Dilma finalmente adotar o remédio amargo e cortar as despesas do governo.
"Em vez de Dilma fazer o que tem de ser feito, ela fará o mínimo necessário", diz Noronha. Se ela avançar um ou dois passos em adotar medidas necessárias do ajuste, ela deverá adotar outras que amenizem o "remédio amargo" na linha que agrade o PT.
Para ele, o primeiro passo na direção de correção dos rumos seria o governo admitir a gravidade do momento e não emitir sinais contraditórios, como na reação do ministro Nelson Barbosa à notícia do rebaixamento.
Todavia, na visão de Noronha, a presidente Dilma não parece ter abandonado o "receituário" do seu primeiro mandato, que ficou conhecido como Nova Matriz Econômica.
"Ela parece ter ainda um cacoete de ficar presa à agenda econômica que se esgotou e levou o País a esta situação", diz Noronha. "Além disso, o próprio ex-presidente Lula afirmou em recente viagem à Argentina que a solução para a crise é via consumo, na mesma receita adotada em 2008 e 2009, o que cria um ambiente para a permanência da ala do PT no governo que tem posição contrária a do Levy."
Assim, o risco maior para o Brasil no curto prazo pode ser resumido no parágrafo final do relatório enviado ontem à noite pelo economista-chefe para América Latina do banco Goldman Sachs, Alberto Ramos:
"Finalmente, agora que a batalha para preservar o grau de investimento foi perdida (ao menos por uma agência de rating) há alguma probabilidade que o governo esmoreça ainda mais no esforço da difícil tarefa política de controlar e cortar gastos correntes obrigatórios e de não investimento", escreveu Ramos.
Ou seja, tão ou mais relevante saber se o rebaixamento da S&P fará Levy deixar o cargo é saber se Nelson Barbosa seguirá colecionando vitórias sobre o ministro da Fazenda.
Fábio Alves é jornalista do Broadcast