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Economia e políticas públicas

Opinião|Campanha não aprofundou debate econômico

A campanha eleitoral do primeiro turno vai chegando ao fim sem que alguns dos grandes dilemas da política econômica brasileira tenham sido devidamente debatidos. O País parou de crescer nos últimos três anos, com um desempenho particularmente ruim da indústria e do investimento.

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Atualização:

Os dois principais candidatos de oposição, Marina Silva e Aécio Neves, fizeram sem dúvida a crítica da política econômica da presidente Dilma Rousseff, que levou àqueles resultados. A candidata à reeleição, contudo, conseguiu até agora se desvencilhar razoavelmente bem dos ataques à sua gestão da economia, graças ao fato de que o mercado de trabalho, apesar da lenta desaceleração em marcha, continua a apresentar resultados satisfatórios em termos de emprego e renda.

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Assim, a controvérsia entre o que seria o modelo mais desenvolvimentista de Dilma e a opção mais liberal de Aécio e Marina, apesar de proposta durante a campanha, praticamente não se desenvolveu. A crítica dos dois oposicionistas é bem mais a de apontar erros, e a de propor corrigi-los, em temas como política fiscal, combate à inflação e excesso de intervencionismo.

Mas o simples ajuste da política econômica em curso provavelmente não será suficiente para fazer com que o Brasil escape da armadilha da renda média, e cresça numa velocidade que restabeleça a convergência para o padrão de vida das nações mais ricas.

Na verdade, desde a redemocratização, o País praticamente não conseguiu crescer de forma sustentável a uma velocidade compatível com as ambições e as demandas sociais de uma nação emergente. É verdade que por um período do governo Lula o crescimento aproximou-se mais de uma média razoável, e que nos últimos dez a quinze anos houve uma melhora social admirável.

Mas a perspectiva de hoje mostra que tanto um fenômeno como o outro - o PIB de Lula e o avanço social - podem ter sido consequências de um alinhamento excepcional de condições favoráveis, com destaque para o boom de commodities. Em outras palavras, podem ter sido muito mais uma bonança temporária, ainda que duradoura, do que o início de uma trajetória que aponte para a superação da armadilha da renda média.

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O que fazer para restabelecer a convergência é a essência do debate entre economistas liberais e desenvolvimentistas, mas com muito pouca repercussão na campanha eleitoral. No primeiro grupo, há uma visão bem mais cética em relação à chance de que o Brasil possa replicar o modelo asiático de crescimento baseado em muita poupança, câmbio desvalorizado e um papel central da indústria. Uma das razões é que o País não tem estruturalmente a capacidade de poupança dos países da Ásia.

Assim, a receita é fundamentalmente a de reformas institucionais e política econômica ortodoxa e liberal, de tal forma que a economia consiga obter o máximo a partir de condições que impõem claras restrições: a ideia é não jogar todas as fichas na indústria, mas ainda assim melhorar suas condições de competitividade; não esperar taxas asiáticas de poupança e investimento, masincrementar as duas; reconhecer o crônico problema de um setor grande de serviços pleno de segmentos atrasados, mas lutar por um aumento gradual e generalizado de produtividade. É uma agenda que reconhece limitações e não tem a ambição de provocar uma arrancada fulminante rumo ao desenvolvimento pleno, mas que pelo menos tenta restabelecer as condições para uma trajetória gradualista de convergência.

Pelo lado desenvolvimentista, há a ideia de que o manejo correto (para os que pensam desta forma) de variáveis macroeconômicas básicas, como câmbio e juros, associado a políticas comercial e industrial adequadas (como a coreana) poderia restaurar um crescimento mais robusto e sustentável. A fracassada nova matriz econômica do governo Dilma foi uma tentativa deste tipo, mas alguns heterodoxos acham que o fiasco deveu-se a erros de implementação e à falta de uma aposta ainda mais ousada nesta estratégia.

As duas escolas de pensamento são extremamente críticas mutuamente. Os ortodoxos veem a opção desenvolvimentista hoje como um caminho que pode levar o País, voluntária ou involuntariamente, a um gradual "bolivarianismo". Já os heterodoxos consideram que a visão liberal é quase uma renúncia ao ideal de crescimento acelerado rumo ao desenvolvimento pleno. Um dos campos está certo, o outro errado, e, como fica claro, é um debate crucial para o futuro do Brasil por muitas décadas. Infelizmente, não é uma discussão que esteja sendo feita de forma madura e consistente na atual campanha eleitoral.

Fernando Dantas é jornalista da Broadcast

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Esta coluna foi publicada pela AE-News/Broadcast em 30/9/14, segunda-feira

Opinião por Fernando Dantas
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