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Economia e políticas públicas

Opinião|Como privatizar a Cedae?

Economista Mauricio Canedo ressalta que "monopólio mal regulado não é muito melhor que um serviço estatal".

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Atualização:

A aprovação da privatização da Cedae pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro surpreendeu pelo fato de que os quatro deputados da bancada tucana votaram contra, e o deputado petista André Ceciliano votou a favor. Afinal, o PSDB não é o partido das privatizações e o PT o defensor das estatais?

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Esse tipo de polarização, entretanto, prejudica o debate que importa verdadeiramente, que é sobre como expandir em quantidade e qualidade os serviços de água e saneamento nos municípios cobertos pela Cedae.

A atual decisão de privatizar está ligada à necessidade de fazer caixa, em função da situação financeira desesperadora do Estado do Rio. Como nota o economista Maurício Canêdo, do Ibre/FGV, a motivação para a privatização da Cedae cria dois condicionantes - a pressa e a busca pelo maior de valor de venda - que não necessariamente se compatibilizam com um redesenho institucional que garanta a melhor prestação de serviço depois que a empresa for privatizada.

Canêdo, que já pesquisou o tema, parte da constatação de que os serviços atuais da Cedae realmente deixam a desejar, como fica claro, por exemplo, na péssima colocação de grandes municípios da Baixa Fluminense no Ranking do Saneamento 2015 do Instituto Trata Brasil (que avalia os serviços de água e esgoto dos 100 maiores municípios do País). Nova Iguaçu, por exemplo, com cerca de 800 mil habitantes, está em 92º lugar. Duque de Caxias, com 350 mil, em 91º.

"É uma vergonha que tenhamos indicadores de água e esgoto do nível de municípios pobres do Nordeste, mesmo com uma renda per capita bem maior", observa Canêdo.

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O pesquisador, entretanto, alerta que "um monopólio mal regulado não é muito melhor do que um serviço estatal". No caso específico do saneamento, o que os trabalhos acadêmicos e diversos casos em particular apontam é que as empresas privatizadas no Brasil têm melhor desempenho quando a regulação é feita em âmbito municipal.

Este arranjo, segundo o economista, proporciona uma maior "controle social" sobre o desempenho da empresa. Ele nota que algumas das cidades fluminenses com melhor colocação no ranking 2015 do Trata Brasil, como Niterói (19º lugar) e Petrópolis (36º), são atendidas por operadoras privadas de âmbito municipal. Mesmo Volta Redonda, cuja empresa local de saneamento é pública, tem uma colocação razoável no ranking, no 41º lugar.

Outro ponto que Canêdo acha importante ressaltar em relação a privatizações de empresas de saneamento é que as melhoras de serviços decorrentes são normalmente acompanhadas por aumento de tarifas: "Não tem almoço grátis", diz o pesquisador.

O economista não estudou especificamente se é possível fazer um modelo de privatização da Cedae que permita o controle social em nível municipal, mas acha que esta é uma questão que merece ser investigada - embora, como observado acima, a busca pelo resultado financeiro máximo e a pressa envolvidas na atual decisão são fatores que complicam o desenho do melhor modelo do ponto de vista do serviço.

De qualquer forma, esta é uma questão que nem o governo fluminense nem seus opositores deveriam ignorar: mais importante do que a estéril discussão 'principista' entre privatizar e não privatizar, é importante definir um modelo de privatização que seja o melhor trade-off possível em relação a objetivos por vezes conflitantes. (fernando.dantas@estadao.com)

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Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 21/2/17, terça-feira

Opinião por Fernando Dantas
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