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Economia e políticas públicas

Opinião|O leilão eleitoral

Cientista político Marcus Melo, empregando conceitos de seu colega de profissão Iain McMenamin, analisa relação entre empresas e políticos no Brasil, e prevê futuro melhor.

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Atualização:

As eleições no Brasil são extremamente caras por - entre outros motivos - serem "leilões", na visão do cientista político Marcus André Melo, da Universidade de Pernambuco.

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Ele parte da abordagem do cientista político Iain McMenamin, da Dublin City University, que distingue dois tipos de doações empresariais. A primeira, que tende a só ter sentido quanto é feita para partidos de direita, poderia ser chamada de doação pró-mercado - isto é, as empresas apoiam um determinado político porque ele defenderá políticas públicas favoráveis à expansão e ao aprofundamento da economia de mercado.

Um segundo tipo de doação empresarial é "pró-business", isto é, visa especificamente trazer benefícios individuais para determinadas empresas ou setores, e não fortalecer a economia de mercado. Este tipo de doação perverte o sentido da democracia. Segundo o trabalho de McMenamin, citado por Melo, as doações empresariais a partidos de esquerda tendem a ser sempre do tipo "pró-business"; enquanto que aquelas dirigidas a partidos de direita podem ser tanto pró-mercado quanto pró-business.

A distinção entre os conceitos pró-mercado e pró-business, na verdade, remete a outro acadêmico, o economista Luigi Zingales, da Universidade de Chicago.

O fato, porém, é que no Brasil parecem prevalecer de forma assustadora as doações pró-business. Um sinal disto é que as campanhas eleitorais seguiram tornando-se mais e mais caras desde a redemocratização, com crescimento das doações empresariais - e a chegada da esquerda ao poder e a sua permanência no Executivo federal por 13 anos não mudou absolutamente nada neste processo. A pesquisa de McMenamin indica que a esquerda no poder em sociedades pouco corruptas tende a reduzir as doações empresariais, pelos motivos expostos acima.

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Para Melo, o "leilão" nas campanhas empresariais brasileiras se dá pelo fato de que as empresas tentam se cacifar o máximo possível junto aos candidatos favoritos, por meio de doações, de forma a que os eleitos ajam para lhes trazer benefícios específicos e individuais. E isto se dá indistintamente em relação a políticos de direita e de esquerda. Aliás, no Brasil é costume que empresas financiem simultaneamente candidatos rivais de diferentes polos da política.

Do ponto de vista teórico, o cientista político acha que, numa democracia saudável, pode haver doações empresariais "pró-mercado", mas que, entretanto, devem ter limites claros e rígidos. A ideia aqui é que é normal que empresas se identifiquem ideologicamente com a agenda de partidos, o que normalmente se dá com o eixo à direita, mas se elas puderem fazer doações ilimitadas há severo prejuízo para o princípio de igualdade de condições na competição eleitoral.

Esse problema é abordado de formas diversas em diferentes democracias maduras. Enquanto algumas limitam ou proíbem o financiamento empresarial, outras - entre as "melhores", como nota Melo, incluindo Inglaterra, Suíça, Holanda e países escandinavos - o permitem sem limites. No caso destas sociedades altamente avançadas, entretanto, o pesquisador observa que os próprios partidos de direita são seletivos em relação ao financiamento empresarial, porque os excessos podem ser punidos pelo eleitor.

"O grau de informação do eleitor médio é relativamente alto e ele penaliza o abuso do poder econômico, sem necessidade do Judiciário", diz Melo.

No caso do Brasil, finalmente, o cientista político julga que o Supremo em parte reagiu à opinião pública quando reinterpretou a lei e proibiu o financiamento empresarial em 2015.

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A grande dúvida, segundo Melo, é se agora o Brasil vai voltar à situação pré-governo Collor, em que o financiamento empresarial era proibido, mas as empresas financiavam candidatos pelo Caixa 2 de forma praticamente impune.

O cientista político não crê nesse cenário. Para ele, a Lava-Jato, o recente fortalecimento das instituições de controle e a crescente intolerância da opinião pública quanto à corrupção aumentaram acentuadamente o risco de punição do financiamento ilegal, "reduzindo muito o valor esperado do rendimento da doação empresarial pró-business".

"Houve uma mudança tectônica no Brasil, uma quebra estrutural, e acredito que (a doação ilegal) vai diminuir bastante", conclui Melo. (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 14/3/17, terça-feira.

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Opinião por Fernando Dantas
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