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Economia e políticas públicas

Opinião|Otimismo com horizonte curto

Antes do escândalo do Friboi, o otimismo do mercado já se baseava em encadeamento de hipóteses favoráveis.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

(esta coluna foi publicada antes do choque político dos dias 17 e 18/5/17, quando foi noticiada a gravação da conversa comprometedora entre o presidente Michel Temer e Joesley Batista, do Friboi)

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Um experiente gestor, com passagem pelo governo, resume de forma simples os fatores internos na maré de otimismo do mercado nacional nos últimos dias (apesar da pequena correção na bolsa no momento em que esta coluna está sendo escrita): "Aumentaram bem as chances de a reforma da Previdência passar, e está todo mundo vendo o Lula se 'ferrar'".

A suposição implícita, portanto, é de que o atual curso de política econômica vai se manter num horizonte pelo menos de médio prazo, com o governo Temer conseguindo entregar as peças chaves da sua estratégia econômica e a perspectiva de um sucessor que não destrua o laborioso conserto dos estragos da nova matriz econômica que vem sendo implementado.

O mesmo analista nota que "a economia aparentemente encontrou um chão". Apesar se se antever um refluxo no segundo trimestre, dados recentes como o IBC-Br de 1,12% no primeiro trimestre (na comparação dessazonalizada com o quarto do ano passado) e o bom Caged de abril divulgado hoje, com saldo líquido de quase 60 mil vagas formais, combinam-se à percepção intensificada de ciclo de cortes da Selic para condensar a percepção de que a retomada finalmente está a caminho.

Dessa forma, a aprovação da reforma da Previdência com um conteúdo minimamente satisfatório torna-se ainda mais decisiva, no sentido de que agora há efetivamente algo a perder em termos da conjuntura de curto prazo. Se o início de embalo for torpedeado por uma derrota surpreendente do governo na primeira votação da PEC 287 na Câmara, pode-se abortar a superação da pior recessão brasileira em um século.

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Se o cenário de surpresa ruim na Previdência se verificar, uma discussão é sobre qual seria o impacto na economia: puramente recessivo ou estagflacionário? Nesta segunda hipótese, que seria o pesadelo do Banco Central, uma eventual disparada do dólar poderia se combinar com o fenômeno de reajustes preventivos voltados a lucros de curto prazo para criar uma situação infernal para a autoridade monetária.

Por outro lado, não é nada disso que está na cabeça da maioria dos participantes do mercado, como fica claro no comportamento recente dos ativos brasileiros. O Banco Central (BC), entretanto, deve estar atento aos riscos negativos, e o perigo remanescente do cenário ruim descrito acima talvez seja um dos poucos argumentos que restam para ir com calma em termos do tamanho do corte da Selic na próxima reunião do Copom no fim de maio.

Evidentemente, a peça mais frágil e incerta da narrativa rósea que o mercado faz para si mesmo é a continuidade da política econômica deste primeiro ano de governo Temer. A janela para o audacioso esforço reformador do presidente provavelmente deve se fechar em algum momento do segundo semestre, quando o empuxo político da imprevisível eleição de 2018 deve passar a dominar o País.

Em termos estritamente jurídicos, não está claro que Lula esteja fora de combate, por mais que engrosse o noticiário incriminador, e, em termos políticos, as pesquisas mostram que o ex-presidente lidera e cresce. Há outros nomes dispostos a sacudir a economia para se beneficiar eleitoralmente, como Ciro Gomes. Os tucanos para variar estão divididos, com mais uma disputa fraticida - desta vez entre Alckmin e Doria, sua criatura - se aquecendo em fogo lento. Marina anda tão sumida que já nem se sabe ao certo o que ela faria em termos econômicos. O horizonte do otimismo definitivamente se encurta diante de uma análise mais fria da conjuntura. (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é colunista do Broadcast

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Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/5/17, terça-feira.

 

Opinião por Fernando Dantas
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