O maior risco da permanência de Michel Temer na presidência é político, e não econômico, para Fernando Abrucio, cientista político da Escola de Administração da Fundação Getulio Vargas (EAESP/FGV) em São Paulo.
Esse risco político, por sua vez, pode se traduzir em sérios danos econômicos de médio e longo prazo, a partir de 2018, em sua opinião. Adicionalmente, Abrucio considera relativamente alta (mas não garantida) a probabilidade de Temer resistir até o final do seu mandato, dado que "este grupo no poder é o mais profissional da política brasileira".
O cientista político nota que o atual presidente não está defendendo seu cargo sozinho, mas o faz em coordenação com "centenas de pessoas que estão no poder há muito tempo, e que sabem que, se Temer cair, elas podem cair juntas".
Usando um termo da política mineira, Abrucio diz que profissionais da política como Romero Jucá, Moreira Franco e Eliseu Padilha sabem que seria desastroso para eles "ficar no sereno". Já o ministro da Justiça, Torquato Jardim, atua de forma mais concentrada e eficaz como advogado de Temer que seus antecessores, inclusive no governo de Dilma Rousseff.
"É um grupo muito mais profissional que o de Dilma, que sabe qual é o objetivo e está focado nele, e que tem uma grande capacidade de dividir os outros para governar", resume o pesquisador.
A sobrevivência de Temer, entretanto, vai agravar ainda mais o descrédito da política junto à população, o que, segundo Abrucio, já está sendo captado nas pesquisas de opinião.
"É assustador, e dá ainda mais força para quem se apresentar em 2018 como antipolítico", analisa o cientista político.
Ele observa que, ao contrário dos Estados Unidos, em que o setor público e a sociedade têm bastante autonomia em relação ao poder político, neutralizando parcialmente os estragos causados por um demagogo como Donald Trump, "o Brasil precisa reconstruir a política, e não destruí-la". E a reforma da política, para Abrucio, não virá de alguém com a bandeira da antipolítica.
O pesquisador se diz mais preocupado em "construir uma visão de longo prazo sobre a Previdência do que aprovar a reforma agora". Assim, o risco de que o aprofundamento do descrédito político leve a uma saída "a Berlusconi" para a atual crise brasileira, e inviabilize qualquer agenda racional a partir de 2018, é a seu ver o que deveria estar de fato preocupando o setor privado no momento.
Abrucio nota ainda que os desdobramentos da atual crise dependem de "muitas pedras desconhecidas no caminho" sobre o teor e a abrangência da atual safra de denúncias, que atinge o presidente da República. Ele pensa que essa grande incerteza explica parcialmente a hesitação do PSDB sobre ficar no governo ou deixá-lo, para além da velha tradição de indecisão do partido.
Ainda assim, Abrucio considera que os tucanos estão incorrendo em alto risco de contaminar-se pela "sarneyzação" do governo Temer. "O PSDB ficou 13, 14 anos na oposição e hoje parece que está há 30 anos no governo, é uma sensação absurda", ele diz.
Dessa forma, o perigo é que o PSDB aja para preservar a aliança com o PMDB e os muitos minutos de propaganda eleitoral gratuita em 2018, mas acabe como Ulysses Guimarães em 1989, com muito tempo de TV e votação minúscula.
"A sensação é de que quem estiver grudado em Temer cairá em descrédito com a sociedade", ele diz.
Em termos do que esperar de um governo Temer que consiga sobreviver, Abrucio vê como possível a aprovação da reforma trabalhista, que é infraconstitucional, e no máximo a idade mínima na Previdência.
"Mas governo não é só reforma, as políticas públicas estão muito fragilizadas com o grau baixíssimo de legitimidade e capacidade de operacionalização", ele conclui. (fernando.dantas@estadao.com)
Fernando Dantas é colunista do Broadcast
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 19/6/17, segunda-feira.