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Política Econômica e Economia Política no Brasil e no Mundo

Blog de Estreia

Caros leitores e leitoras,

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Por Redação
Atualização:

É com enorme prazer que começo a escrever novo blog para o Estadão, onde pretendo postar vídeos, comentários, e vasto material publicado nos últimos anos sobre economia.

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Começo com fábula escrita em 2011, ano em que iniciei documentação minuciosa da destruição econômica de Dilma Rousseff. Vários desses textos foram publicados no Estadão, outros em meu blog pessoal. Sem mais, deixo-os com Meia Noite em Brasília.

Meia-Noite em Brasília (Artigo publicado em agosto de 2011)

No filme de Woody Allen, toda noite o protagonista esperava pelo (espaçoso) carro antigo que o levava de volta para a Paris de outras épocas, desfrutando da convivência com alguns dos principais pintores, escritores e intelectuais da era moderna. Em meados de 2011, integrantes do governo brasileiro se inspiraram nessa fantasia deliciosa para recolher antigas relíquias da política econômica e reciclá-las com ares de ousadia. O automóvel disponível para a volta no tempo da trupe de Dilma foi um Isetta, o primeiro carro produzido no País, em 1956. Toda noite, quando passava pela rampa do Palácio do Planalto, entrava alguém da equipe econômica para um tour nostálgico. O problema é que o Isetta é um microcarro - algo como o tio do Mini Cooper - e só acomoda um passageiro, além do motorista. Talvez seja por isso que as políticas recicladas tenham vindo de várias épocas distintas, prejudicando a congruência, dependendo das preferências particulares de quem entrava no carro, a cada noite.

Que a Presidente foi a primeira passageira, ninguém até hoje duvida. Escolheu os milagrosos anos 70 e inspirou-se nas políticas de campeões nacionais, nas benesses do crédito público e no debate sobre crescimento versus estabilização macroeconômica. Gostou da receita do bolo de Delfim Netto, e trouxe consigo um pouco daquele fermento, salpicando o Ministro da Fazenda e os Presidentes do BNDES e do Banco Central. Maravilhado com as histórias da Presidente, Guido Mantega sentou-se na rampa para aguardar o Isetta na noite seguinte e nas várias posteriores. Perambulou por diversas epócas distintas e colheu amostras de intervencionismo, repressão financeira, políticas de estímulo à produção nacional e algumas pitadas de câmbio fixo. Ignorou a inflação - afinal, passeios nostálgicos têm de possuir aquele sabor que os ingleses e americanos chamam de bittersweet. Não existe saudosismo inflacionário, pois o sabor é azedo, o cheiro, rançoso.

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Exultante com suas descobertas, Mantega relatou detalhadamente a experiência a Fernando Pimentel e Alexandre Tombini. O Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior não resistiu à tentação de visitar, logo que possível, a segunda metade dos anos 50, para ver de perto a execução do Plano de Metas. Gostou do que viu. Toda aquela história de que o mercado brasileiro pertence à indústria brasileira, de que os bens produzidos internamente têm de ter conteúdo nacional, de priorizar setores...uma bela inspiração para o Plano Brasil Maior. O nome é mais ambicioso do que o escolhido por Juscelino para batizar o seu plano de desenvolvimento - o conteúdo...bem, esse deixou um pouco a desejar. Não parecia ser a estrada milagrosa que levaria ao enaltecimento da indústria no País. E o custo - mais um caminhão de dinheiro do BNDES nos próximos 3 anos - prometia.

Passados alguns dias, depois de considerar, cautelosamente, os prós e os contras do passeio, o Presidente do Banco Central rendeu-se à curiosidade e entrou no Isetta. Não quis voltar tanto no tempo quanto os outros - talvez tenha achado que os detalhes minuciosos e a narrativa eletrizante dos demais já bastassem para que tivesse uma ideia clara do que falavam, sem ter de se arriscar por essas épocas em que o descontrole inflacionário decerto não lhe escaparia. Preferiu reviver o drama de 2008. Não que tivesse se esquecido dos detalhes de um dos episódios financeiros mais marcantes da história recente. Mas sim porque, com o distanciamento de quem observa o ocorrido com o olhar de quem já conhece o desenlace final, poderia ter novos insights sobre os rumos ainda tão incertos da economia mundial. A experiência, entretanto, foi traumatizante. Em contraste com o entusiasmo da Presidente e de seus companheiros de Isetta na volta do passeio, o Presidente do Banco Central retornou assustado. Mais assustado ficou quando viu o esfacelamento político nos EUA em meio à discussão sobre a elevação do teto da dívida, e os bruscos movimentos de reprecificação de risco nos mercados, derivados tanto da constatação de que fragilidade econômica com perda de governança não é uma boa equação, quanto da reavaliação dos cenários de crescimento para 2011 e 2012. Para complicar, observou que os alarmes vermelhos nos mercados de títulos soberanos da Itália e da Espanha continuavam a soar.

Ainda com o coração sobressaltado e com o nó na garganta provocados pelo recente tour por 2008, Alexandre Tombini sentiu-se compelido à declarar que a autoridade monetária brasileira agiria com prontidão e precisão para extirpar os riscos do sistema financeiro brasileiro antes que esses pudessem provocar qualquer estrago. Isso gerou certa confusão. Sobretudo depois que alguns bancos centrais - o suíço, o japonês e o turco - reduziram os juros para atenuar os efeitos da desorganização dos mercados provocada pela crise na Europa. Alguns, compreensivelmente, logo começaram a especular se o Banco Central não estaria cogitando medidas semelhantes, ou pelo menos outras formas de relaxamento monetário. Ficaram apreensivos. A inflação ainda está muito alta, pensaram, e o cenário para o ano que vem é, no mínimo, nebuloso.

Acalmem-se. O motivo da mais recente decisão de Tombini foi o passeio no Isetta, na toada da meia noite, em Brasília. No mínimo, uma boa fantasia.

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