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Pesquisa aplicada no dia a dia (FGV-EESP)

Opinião|E agora José: denúncia acabou, fiscal piorou!

Ajuste do preço dos ativos pode ocorrer com o fracasso das reformas e com a discussão dos candidatos de 2018

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Atualização:

*Marcelo Kfoury Muinhos

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O mercado financeiro passou ao largo da discussão sobre mudança no déficit fiscal desse ano e está precificando a sobrevivência do Temer até o final do mandato e as chances de se aprovar algumas reformas ainda esse ano. Os preços dos ativos voltaram as mínimas depois do pico com a delação do Joesley da Friboi em meados de maio, sendo um exemplo disso, o dólar ter ido acima de R$3,30 em maio e estar novamente se aproximando dos R$3,10. Há uma mística que o "mercado" é mais bem informado e geralmente antecipa os movimentos. Porém, um ajuste pode ocorrer no caso de uma decepção com o calendário das reformas e com as discussões das propostas dos candidatos à eleição de 2018. Tenho repetido nos meus últimos artigos, que o calcanhar de Aquiles da economia brasileira é a fragilidade fiscal e seria condição necessária para voltar ao crescimento sustentável o equacionamento da dinâmica da dívida pública no médio prazo. A discussão sobre mudança na meta do déficit público, não só para esse ano como para o próximo, pode afastar para as calendas gregas qualquer chance de os gastos primários serem menores que a receita primária, ou seja, a volta do superávit primário. A questão é saber até quando o mercado continuará dando o benefício da dúvida ao Governo Temer, que faz o ajuste a passos de cágado. A equipe econômica parece que teve um choque de realidade e já admite que a meta de déficit primário de 2017 do setor público de R$139 bilhões não é factível, dada a frustração de receitas. Segundo a reportagem do Estadão (quarta-feira 02/08/2017), a nova meta que será anunciada na próxima semana e proporá ao Congresso o mesmo déficit verificado no ano passado (R$159 bilhões). Além disso, há pressão política sobre a equipe econômica para mudar também a meta de 2018, ano eleitoral, para esse mesmo patamar. Isso significa que não há ajuste fiscal sendo feito, pois o déficit continuará superior a 2% do PIB, esse ano e possivelmente no próximo. Para se estabilizar a dívida bruta seria necessário um superávit primário superior 2%, portanto há necessidade de um ajuste de mais do 4% do PIB, o que significa um ajuste ao R$250-300 bilhões. A relação dívida PIB já está em cerca de 73% do PIB com o resultado de junho e se o ajuste for ainda mais suave do que anteriormente imaginado, ou mesmo inexistente, é plausível chegar a simulações ao redor de 100% em 2020. Passado a votação da denúncia na Câmara, todos estamos fazendo as contas sobre o tamanho do apoio do governo Temer e as possibilidade de se aprovar emendas constitucionais. O quórum necessário para essas reformas é de 308 deputados e o presidente teve 263 para barrar a denúncia. Numa conta simples de padeiro, essa diferença pode vir dos votos contra do PSDB (21) e dos ausentes (19). A base de apoio do governo parece ter encolhido, o que coloca em risco a reforma da previdência, que é sem dúvida impopular, sendo, portanto, ingênuo contar plenamente com os votos dos partidos mais fisiológicos, que apoiaram Temer essa semana. Não necessariamente o farão novamente simplesmente visando o ajuste futuro das contas públicas. A opção que está sendo discutida é aprovar uma versão mais diluída da reforma, que inclua a idade mínima e alguma regra de transição, mas que trará mínima melhora no déficit primário no curto prazo. Paralelamente, estuda-se a possibilidade de inverter a pauta e tentar aprovar uma reforma tributária nos próximos meses. Segundo o blog da jornalista Miriam Leitão, a ideia não seria reduzir a carga tributária, mas sim fazer a fusão de alguns impostos federais, estaduais e municipais em uma única taxa. Essa espécie de tributo sobre o valor agregado seria depois dividido pela União e os outros entes federativos. A guerra fiscal entre estados perderia força e os gastos com isenções fiscais cairiam. No lado das empresas, a simplificação reduzirá as perdas com a burocracia. Concluindo, um ajuste fiscal consistente e definitivo está sendo postergado, aumentando o risco para o próximo mandato. Se por ventura ficar claro que nada está melhorando no fiscal e que, também nas discussões para a eleição de 2018, o próximo presidente pode não ter disposição em aprovar as reformas fiscais, o mercado pode se ajustar de maneira descontínua, num pulo. Uma correção similar à de 2002 pode ocorrer nos preços dos ativos ao se explicitar a insustentabilidade da dinâmica da dívida pública. Nesse caso, a ameaça da dominância fiscal não será mais latente, mas cristalina e clara.

* Professor e coordenador do Centro Macro-Brasil da FVG-EESP

Opinião por mosaicodeeconomia
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