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Pesquisa aplicada no dia a dia (FGV-EESP)

Opinião|O abismo da Previdência

A PEC 55 não vai resolver o problema fiscal e, se nada mudar, a Previdência vai falir o Estado

Atualização:
Sistema previdenciário pode quebrar Foto: Wilton Júnior/Estadão

Leonardo Weller

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A União gasta 22% do Orçamento com a Previdência Social, cujo déficit será de 183 bilhões de reais em 2016. A rubrica Previdência abocanha quase metade de todo o orçamento não financeiro, incluindo aí saúde, educação, defesa, habitação e transferência para estados e municípios, os quais são responsáveis por vários serviços públicos essenciais.

Se nada mudar, o sistema quebrará quando nos tornarmos velhos, o que não tarda muito. A população adulta cresce a uma taxa de 1% enquanto que a idosa aumenta em 4% ao ano. Essa proporção vai tender ainda mais para os idosos dentro em breve, pois há tempos as pessoas pararam de ter filhos: em média, uma brasileira fértil tinha quatro filhos nos anos 70 e agora tem menos do que dois.

A crise da Previdência será o fim do pacto fiscal. É difícil exagerar as consequências de tal crise geracional, na qual um enorme grupo de idosos esperará que o estado lhe transfira recursos que um grupo relativamente pequeno de adultos em idade ativa não terá nem de longe condição de suprir. Permaneceremos pobres e fiscalmente frágeis até o dia em que nos tornarmos velhos e terminantemente falidos? O relógio demográfico brasileiro é uma bomba relógio. Para desarmá-lo, é necessário substituir nosso já tradicional e consolidado pacto fiscal por outro, mais sustentável.

Um novo pacto fiscal deve partir do seguinte pressuposto: assim como tudo no mundo, as contas públicas têm limites. O atual pacto gerou inflação no passado e juros altos desde os anos 90. No futuro, ele terá consequências muito piores.

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É mais justo que os mais ricos contribuam mais com o ajuste. Na contramão do que é socialmente justo, a PEC 55 será um mecanismo de elitização do pacto fiscal ao invés de uma solução do problema. A PEC limita o Orçamento em termos reais, o que obrigará o governo a cortar gastos discricionários. As principais vítimas serão os pobres, que dependem do estado para cuidar da saúde, educar seus filhos e evitar a miséria.

Será difícil mexer nos gastos destinados às classes média e alta. Por lei, o governo não pode demitir nem rearranjar funcionários públicos. Ele também não pode mexer no benefício dos aposentados, mesmo nas aposentadorias generosos de muitos ex-funcionários públicos. Um calote na dívida pública tampouco é uma opção, pois comprometeria uma parte enorme da poupança da sociedade, quebraria empresas e geraria uma crise pior do que a atual.

O governo poderia aumentar a alíquota do IR para os muito ricos, os quais estão majoritariamente fora da CLT e pagam proporcionalmente pouco. Poderia também cortar subsídios e isenções a empresas ineficientes. Por enquanto medidas assim são politicamente impraticáveis.

A PEC dos gastos vai ser uma quimera a não ser que venha acompanhada por reformas que transformem a relação entre aposentados, servidores públicos, empresários e o estado. Sem isto, o buraco seguirá crescendo até que o governo deixe de pagar, algo que está em curso no Rio de Janeiro, ou volte a se financiar com emissão monetária, cujos resultados lamentavelmente vivemos até a década de 90.

Para se evitar o abismo é necessário que a classe média abra mão de direitos adquiridos, sobretudo relativos à Previdência, que ricos paguem mais impostos, e que empresas sobrevivam sem subsídios.

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Uma solução é atualmente improvável. Não devemos esperar que o débil governo Temer e o patético Congresso construam um novo pacto fiscal com uma sociedade cada vez mais polarizada. Isto é lamentável. O que está em jogo não são apenas as próximas gerações e os idosos do futuro próximo; é a capacidade do estado de proteger os mais fracos e civilizar a sociedade, algo que mal começamos a vivenciar e provavelmente tenhamos que abrir mão por completo mais breve do que se pensa.

*Professor da EESP-FGV e doutor em história econômica pela LSE

Opinião por Economia & Negócios
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