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O blog do Caderno de Oportunidades

Crise hídrica é um estímulo à criatividade

A possibilidade de haver racionamento de água e de energia faz empresários repensarem o modelo de operação e buscar alternativas

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Por Cris Olivette
Atualização:

Erika Fischer e Marcelo Jacaré Foto: Estadão

No Dia Mundial da Água, comemorado hoje, empresários dizem o que estão fazendo para reduzir o consumo do precioso bem. O dono do Jacaré Grill, Marcelo Jacaré, conta com o apoio da agência de comunicação MXK9, comandada por Erika Fischer, que o ajuda a elaborar projetos de redução de gastos e estratégias para envolver funcionários e clientes na luta contra o desperdício.

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Há dois meses, a equipe de 37 funcionários passou por treinamento para aprender a economizar água e energia, tanto no restaurante quanto em suas casas. "Eles estão reutilizando tudo o que podem. A água de banho-maria, por exemplo, é reutilizada na lavagem de louças e panelas. Água fervendo é ótima para tirar a gordura, resultando em muita economia."

Ele diz que há meses aboliu o uso de mangueira. "No jardim vertical usamos regador e não lavamos mais o piso, porque coloquei madeira acrílica que requer só pano úmido." Mesmo com capacidade de armazenamento de 30 mi litros de água, suficiente para operar por três dias sem receber água da Sabesp, Jacaré capta água de chuva para lavar os banheiros.

Erika conta que os clientes são estimulados a usar álcool gel na higienização das mãos. "Criei uma forma simpática para comunicar a medida, para que eles aceitem e colaborem. As mensagens são inseridas nos displays de mesa, aviso nos banheiros e na área do buffet. Também pedimos que reutilizem o prato usado para a salada, para servir o prato quente. Os clientes devem ser convidados a colaborar em prol de todos."

Ela diz que a MXK9 atende 15 bares e restaurantes, todos com várias filiais. "Tenho feito muita personalização de frascos de álcool gel, que ganham a marca do estabelecimento."

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Segundo ela, todos os seus clientes já tomaram iniciativas para economizar água, como a colocação de válvulas de descarga e de torneiras redutoras de vazão de água, além de usarem produtos químicos que não são diluídos em água. "Também reaproveitam a água da lavagem de saladas e frutas para fazer a limpeza de pisos e banheiros", diz.

Preocupado com um possível racionamento de energia, Jacaré também reformou a parte elétrica. "Troquei o cabeamento e coloquei disjuntor termoelétrico, que detecta a queda de energia e desliga automaticamente os equipamentos, eliminando o risco de queimá-los. Também economizamos energia com o teto retrátil, que nos permite aproveitar a luz natural. Além disso, não ligo o ar condicionado, só os ventiladores. Estamos fazendo a nossa parte."

Sheyla Angelotti, da incube Foto: Estadão

Empresas de outras áreas também se preparam para enfrentar cenários mais severos caso haja racionamento de água e de energia. A diretora de recursos humanos da incube (com letra inicial minúscula mesmo), Sheyla Angelotti, diz que a empresa já criou um método de trabalho à distância. "Assim poderemos manter o time trabalhando, sem baixar a produtividade e nem prejudicar os prazos de entrega dos trabalhos."

A incube é um híbrido de incubadora, investidora e aceleradora de startups voltadas à tecnologia e ao desenvolvimento de plataformas mobile. "Ficamos todos, cerca de 50 pessoas no momento, em um mesmo espaço físico, dessa forma estimulamos a sinergia, a troca e o compartilhamento de informações e de novas descobertas."

Ela afirma que mesmo com o trabalho à distância, a equipe deverá manter a troca de informações. "Eles não podem ficar totalmente à distância, precisam se encontrar virtual ou presencialmente para que ocorra o compartilhamento do conhecimento tácito. Também deverão retornar à sede periodicamente para reuniões em grupo."

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Segundo ela, o controle de frequência será feito por meio da gestão de projetos e entrega de tarefas. "Quem ainda não se preparou para o racionamento deve fazê-lo o quanto antes." A diretora afirma que a incube tem um trabalho continuo de desenvolvimento da consciência da cidadania de seus funcionários.

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"As empresas têm a obrigação social de conscientizar a equipe quanto a utilização inteligente da água e da energia. Inclusive em relação ao uso de descartáveis, já que a produção de plástico consome muita água."

O CEO da plataforma de prestação de serviços Iguana Fix, Mathias Rechia, diz que 25% das demandas recebidas são relacionadas ao tema água. "São pedidos de verificação de vazamentos, regulagem de caixa acopladora de sanitários, colocação de redutores de saída de água nas torneiras, instalação de caixas d'água e de segundo encanamento para reaproveitamento de água do chuveiro. Em cidades que não passam por crise de água, não temos o mesmo volume de demandas para este tipo de trabalho. Há muita gente se preparando para o racionamento de água e energia."

Mathias Rechia, da Iguana Fix Foto: Estadão

Rechia afirma que recebe muitos pedidos para a instalação de placas de captação de energia solar, bem como de lâmpadas de baixo consumo e de disjuntores que protegem os equipamentos em caso de queda de energia.

Ele diz que a Iguana não será muito prejudicada por um eventual racionamento de energia, pois também opera por meio de aplicativo para smartphone.

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Corte em serviço essencial acarreta indenização 

Os desdobramentos decorrentes de um possível racionamento de água e de energia passam, até mesmo, por questões jurídicas e trabalhistas. O sócio da assessoria jurídica SBAC, Pedro Schaffa diz que o primeiro perigo é conseguir cumprir os prazos de entrega.

"Para se precaver, o empresário pode fazer acordo com o cliente e acrescentar uma cláusula ao contrato, especificando que para remediar o problema irá alugar um gerador, ou comprar água de caminhão pipa."

Pedro Schaffa, sócio da assessoria jurídica SBAC Foto: Estadão

Ele lembra que isso irá resultar em um custo maior do serviço. "Assim, o cliente saberá de antemão que haverá aumento no custo de produção, evitando uma porção de problemas. É importante formalizar e não deixar só no acordo verbal."

O sócio de Schaffa na SBAC, Lucas Colferai ressalta que o custo adicional pode ser levado à justiça para obter indenização. "Serviços considerados essenciais, como o fornecimento de água e energia, segundo a própria constituição, devem ser contínuos. Caso não sejam, são passíveis de indenização", diz.

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Colferai acrescenta que mesmo que a situação seja revertida com o aluguel de gerador ou compra de caminhão pipa, a situação gerou um estresse desnecessário, que pode causar a perda de um cliente. "Com certeza isso é passível de indenização. Depende, é claro, do entendimento do juiz e das provas apresentadas. Schaffa enfatiza que é sempre melhor tomar medida preventiva, conversando com clientes e fornecedores, do que recorrer à justiça. "O prazo para indenização desse tipo de processo pode levar de quatro a cinco anos. É uma briga longa e cara, apesar de ser causa ganha."

Eles dizem que para acionar empresas públicas, é importante ter tudo muito bem documentado. "Guarde todos os documentos que possam ser usados como prova, inclusive e-mails. Issa facilita o trabalho do advogado e torna mais simples o processo. Quanto mais provas, mais rápido corre o processo."

Segundo eles, se uma empresa que atua com internet ficar dois dias seguidos sem energia, presume-se que ela terá algum tipo de dano. "Para provar o quanto de dano ela teve, pode apresentar prova testemunhal, ou uma média histórica de quanto ele recebe por mês."

Colferai destaca que não existe um rol de provas fixas. "Depende muito do contexto e do entendimento do juiz. Mas o histórico de produção da empresa e os contratos, podem ajudar a comprovar o dano."

Já a opção pela adoção de home office, segundo eles, tem um aspectos delicado, que é o controle de horas trabalhadas. "O risco é que as horas trabalhadas em casa, virem hora extra, gerando um passivo trabalhista. Existem maneiras de fazer ponto eletrônico tanto pela internet quanto por aplicativos. É importante que a empresa vá atrás desse tipo de serviço."

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Outra questão é como controlar a produtividade do funcionário. Esta é uma realidade nova no País e o direito ainda está se adaptando. Porém, não deixa de ser uma solução para a redução do uso de eletricidade e de água, além de ser um estímulo para a retenção de talentos."

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