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O blog do Caderno de Oportunidades

Perseverança contra um ambiente hostil

Brasil é 5º em ranking de determinação para empreender em um meio que envolve muitas dificuldades para um negócio prosperar

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Atualização:

Augusto Aielo, empreendedor e palestrante Foto: Estadão

Caroline Monteiro ESPECIAL PARA O ESTADO A burocracia brasileira tem fama. Lentidão e custos altos para um abrir negócio dificulta a vida do empreendedor. Mesmo assim, o País tem um grande números de novos empresários por habitante. Esse cenário fez o Brasil ficar em quinto lugar na pesquisa "Os Empreendedores mais Determinados do Mundo", da startup americana Expert Market, sediada no Texas.

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Para chegar ao resultado, a empresa cruzou outros dois rankings, ambos do Banco Mundial. Entre 130 nações, o Brasil é o 125º na lista que aponta a facilidade para se abrir um novo negócio. Enquanto isso, é o 48º em número de novos empresários per capita. Ou seja, apesar das dificuldades, há muita gente empreendendo.

Para a diretora de relações institucionais da Endeavor, Marcela Zonis, o quinto lugar não deve ser motivo de comemoração. "A pesquisa reitera que temos um dos piores ambientes de negócios do mundo, com burocracia em excesso, regras complexas e voláteis, que se alteram a todo instante, e com dificuldade de acesso ao capital", diz. "Se com tantos problemas, o brasileiro continua empreendendo, imagina se o cenário fosse favorável", argumenta Marcela.

Dificuldades. Um dos inconvenientes presentes na vida de qualquer empreendedor é a burocracia cartorial. Para o CEO do site de vendas de passagens de ônibus Guichê Virtual, Thiago Carvalho, de 34 anos, ir ao cartório é desperdício de tempo e dinheiro. "São processos que eu não exijo quando faço parcerias com outras empresas. Não vejo necessidade de autenticar assinatura, por exemplo", afirma.

Segundo a coordenadora do Centro de Empreendedorismo da FAAP, Alessandra Andrade, poucos países da Europa exigem a visita ao tabelião. "Aqui, existe uma desconfiança natural em relação às pessoas. Você tem de atestar tudo o que você está fazendo e dizendo. Isso traz custos e ainda mais demora aos processos", diz.

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A obrigação de ir ao cartório é apenas um dos serviços complicados que o empreendedor enfrenta. A apuração e o pagamento de impostos pode ocupar 2.600 horas de trabalho de uma empresa, segundo dados do Banco Mundial. "É um tempo que o empresário poderia investir em gestão, mas tem de usar para entender e pagar os tributos", diz Marcela.

O empreendedor e palestrante Augusto Aielo, de 25 anos, é sócio de três empresas, a Soul Urbanismo, que projeta parklets, a Soul Cultura, produtora de eventos, e a Eu Grande, que promove palestras motivacionais a respeito de empreendedorismo e negócios. Para Aielo, mesmo com algumas mudanças recentes no sistema fiscal brasileiro, a vida do pequeno empresário continua fatigante.

O Simples Nacional, regime tributário de micro e pequenas empresas, que unifica o pagamento dos tributos, facilitou o processo, mas ainda falta informação sobre ele, diz Aielo.

"Muito empreendedor ainda não entende a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), que rege os serviços que a empresa dele pode prestar." O desconhecimento pode causar problemas com a fiscalização. "Sempre indico que as pessoas procurem contadores que conheçam a área de atuação, que entenda bem a burocracia daquele tipo de negócio", acrescenta.

Marcela Zonis, diretora de Relações Institucionais da Endeavor Foto: Estadão

Essencial. Para continuar navegando de forma saudável nesse ambiente de negócios considerado ingrato pelos especialistas, a determinação do brasileiro, diagnosticada na pesquisa da Expert Market, é essencial. "Esse cenário não vai mudar tão cedo", afirma Alessandra. "As pessoas que desistem por causa da burocracia, no fundo, não tem espírito empreendedor. Elas precisam começar a empreender sabendo das dificuldades."

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Para Marcela, a oportunidade de crescimento para as empresas brasileiras é grande, porque o mercado consumidor do País é forte. Por isso, ter firmeza e ambição é importante. "O brasileiro acaba aprendendo a se virar nesse ambiente hostil. Ele faz muito com pouco. No fim, o cenário, que é ruim, cria um empresário criativo e determinado."

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A determinação, no entanto, não é suficiente para sobreviver. O preparo também é essencial. Segundo a diretora da Endeavor, os brasileiros deveriam planejar melhor a direção que seus negócios devem seguir. "O brasileiro costuma ir na fé e na coragem, em vez de aprender sobre fluxo de caixa e gestão de pessoas, por exemplo." Para Marcela, muitos dos erros cometidos poderiam ser evitados.

Desburocratização. A melhoria do ambiente de negócios brasileiro é a razão de existir de instituições como a Endeavor, que pressiona órgãos públicos para diminuir burocracias - ou se junta a eles para eliminar as dificuldades no empreendedorismo. Em 2016, junto com a prefeitura de Porto Alegre, criou um sistema que reduziu de 484 para 20 dias o tempo que se leva para abrir uma empresa na capital do Rio Grande do Sul.

A Contabilizei é outro exemplo de iniciativa para diminuir a papelada e o trabalho contábil de empresas. "Com preços bem mais baixos e operação digital, o escritório de contabilidade virtual me ajudou a fundar minha terceira empresa", diz Aielo.

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Edivan Costa, presidente da Sedi Foto: Estadão

Edivan Costa, de 45 anos, é presidente da Sedi, assessoria e consultoria empresarial que ajuda outras empresas a se regularizarem, por meio do controle de licenças governamentais. No mercado há 20 anos, Costa explica em três pontos o cenário atual da papelada no Brasil. À moda brasileira "A burocracia do País é dividida entre tributação e abertura de empresa. Primeiro, de acordo com o Banco Mundial, são 83 dias para colocar um CNPJ em funcionamento, analisando apenas São Paulo e Rio de Janeiro. Depois, gasta-se tempo demais conhecendo, apurando e pagando impostos. Além disso, a legislação é sobreposta. Há a federal, a estadual e a municipal. Cada cidade trata os procedimentos de uma forma diferente. Se a pessoa tem uma matriz em São Paulo e quer abrir filial em Campo Grande (MS), todas as regras vão mudar." Linha de partida "Com 13 milhões de desempregados, surgem muitos negócios, muitas franquias. E o governo tem um papel controlador. Esse controle faz com que as empresas paguem muitos impostos nos primeiros anos de funcionamento. O empreendedor ficar resiliente; começa do zero e ainda tem de se adequar à legislação cada dia mais pesada, além da responsabilidade fiscal e criminal muito grande. São muitas regras a cumprir, que dificultam o crescimento." Burocracia digital "Estamos criando o que chamo de e-burocracia, ou seja, a papelada virtual. Um exemplo é a Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios, o Redesim, sistema com dados da Receita Federal, que funciona para Estados e municípios. Parece desburocratização, mas não é. A administração pública continua coletando informação demais e você perde em produtividade. A quantidade de tempo que o empreendedor gasta para atender a essas necessidades do governo é enorme. Ele continua precisando de uma organização muito grande para se adaptar à legislação. Migrar para o digital, hoje, significa que você deixa de ser fiscalizado por um fiscal físico, que bate na sua porta, e passa a ser controlado por um sistema. Mas todo o sistema continua sendo de coleta de informação. Em vez de disso, o governo deveria fornecer soluções para melhorar a produtividade no tratamento com essa burocracia; ou para acelerar as autorizações de funcionamento, por exemplo. No Brasil, há 200 tipos de CNAE, mais de 70 variações de tipos de empresa. Passar essa burocracia para a internet, sem de fato facilitar os processos, não resolve."

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