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2015 pode ser ano perdido para indústria

Economistas são unânimes ao apontar o setor como vital para a retomada do crescimento do País, mas só veem avanço em 2016

Por Dayanne Sousa e ÁLVARO CAMPOS
Atualização:
Mansueto, Mendonça de Barros, Castelar e Pedro Passos (da dir. para esq.) mediados pelo jornalista Cley Scholz Foto: Werther Santana/Estadão

Apesar de três grandes planos industriais e centenas de medidas pontuais nos últimos dez anos, a indústria brasileira continua perdendo participação no Produto Interno Bruto (PIB) e as perspectivas para o curto e médio prazos não são positivas. Mas o País não pode abrir mão do setor industrial, que concentra boa parte dos avanços tecnológicos e tem os produtos de maior valor agregado.

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Para o presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Pedro Passos, o Brasil está condenado a ter taxas de crescimento baixas sem a indústria. Segundo ele, aspectos macroeconômicos têm prejudicado o setor e políticas de incentivo específicas não terão efeito sem um acerto em questões como câmbio e juros. "Mesmo que tenhamos propostas no âmbito da indústria, se não acertarmos a parte macroeconômica, não haverá política suficiente para recuperar o setor."

Em fórum promovido pelo Grupo Estado na terça-feira, com apoio da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a preocupação com a competitividade da indústria brasileira foi o tema central das discussões.

O ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda e sócio da consultoria MB Associados, José Roberto Mendonça de Barros, também presente no evento, disse estar convencido de que o País não vai crescer sem a indústria, já que ela está associada ao grosso do avanço tecnológico. "Se a política macro vai mal, não tem como a política setorial compensar, isso está na base de boa parte das políticas setoriais que o governo fez recentemente", declarou. "O crescimento de 2015 já está comprometido qualquer que seja a política econômica adotada. O que está em jogo para a indústria é 2016."

Crise.

Para ele, o Brasil vive um paradoxo: nunca na história se fez tanta política para a indústria e, ao mesmo tempo, nunca a crise do setor foi tão grande. "Temos uma dosagem e uma variedade de políticas sem precedentes, com crédito subsidiado em doses maciças e operações de participação do BNDESPar em grande escala. No entanto, a indústria nunca esteve numa crise tão grande, o que mostra que algo está errado."

Segundo Mendonça de Barros, mesmo quando têm sucesso, políticas equivocadas do governo prejudicam a sustentabilidade das empresas. "Garantimos uma enorme crise no setor automotivo pela ambição de botar muro de proteção enorme para as empresas que atuam aqui", comentou o economista.

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O coordenador de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), Armando Castelar, acredita que o espaço do governo para cometer erros na economia, mesmo que bem intencionados, desapareceu. "De 2004 a 2011, não era tão custoso cometer esses erros. A grande questão agora é se as políticas vão mudar e como os erros serão tratados."

Entre os erros bem intencionados, o economista do Ipea Mansueto Almeida citou a desorganização do setor energético, que se agravou com as recentes denúncias de corrupção envolvendo a Petrobrás. Segundo ele, existe até mesmo o risco de racionamento de energia em 2015, que talvez só não se concretize em função do fraco desempenho econômico.

Gargalos.

O ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior Luiz Fernando Furlan afirmou que a maior prioridade hoje para os empresários brasileiros é a questão tributária. Nesse sentido, listou uma série de medidas que poderiam ser incluídas numa eventual reforma. Entre elas, está a simplificação do sistema tributário, com consolidação e diminuição do número de tributos. "Ao longo dos anos, as legislações tornaram o sistema tributário quase ininteligível."

Furlan defendeu a desoneração total de investimentos e a isenção integral de impostos sobre bens exportados. Conselheiro da BRF, Furlan disse que o sistema de devolução de crédito não funciona de maneira adequada. A empresa tem a receber cerca de R$ 1 bilhão em créditos, pois exporta mais de 50% da produção. A BRF foi criada em 2009, com a associação entre a Sadia e a Perdigão. Após o processo de fusão, finalizado em 2012, a empresa tornou-se uma das gigantes do mercado alimentício mundial.

O empresário ainda argumentou a importância de o Brasil confiar na iniciativa privada para resolver os gargalos na infraestrutura logística. O ex-ministro propôs também reformular a legislação trabalhista, sem que o trabalhador perca os direitos adquiridos. Segundo ele, nem mesmo a legislação italiana, que serviu de inspiração para a brasileira, continua inalterada, como acontece aqui. "A legislação trabalhista não leva em conta a evolução e a modernidade dos sistemas produtivos mundiais."

Política fiscal.

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Castelar afirmou não acreditar em uma grande mudança na política econômica no próximo ano. Ele questionou o desejo do governo federal de reduzir gastos públicos. "Acho muito difícil passarmos de um governo que aumenta gasto público ano a ano para um governo que reduz gasto público", disse. Castelar destacou o papel que receitas não recorrentes, como as obtidas por meio de concessões, tem tido nas contas públicas.

Para ele, porém, esse impacto tende a se reduzir. "Concessões no ano que vem vão ter um cenário cada vez mais complicado, notadamente no segmento de petróleo", comentou lembrando as investigações sobre supostos desvios na Petrobrás. Castelar acrescentou que um resultado primário negativo se torna mais preocupante num momento em que os custos de captação do Tesouro sobem.

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