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A briga por herança na centenária Melhoramentos

No centro da disputa estão os três irmãos Plöger, herdeiros do Grupo Melhoramentos, um dos primeiros a ter ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo

Por Leandro Mode e de O Estado de S. Paulo
Atualização:

SANTO ANTÔNIO DO LEVERGER - Uma das mais tradicionais famílias de industriais de São Paulo vive uma disputa por herança com ingredientes novelescos. No centro da briga estão os três irmãos Plöger, herdeiros do centenário Grupo Melhoramentos, um dos primeiros a ter ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

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Embora seus papéis, hoje, sejam pouco líquidos, a companhia tem valor de mercado na casa dos R$ 200 milhões. As atividades do grupo incluem uma editora, produção de celulose e uma área patrimonial que administra várias fazendas. Para se ter uma ideia, grande parte das terras que margeiam as rodovias Anhanguera e Bandeirantes em um raio aproximado de 30 quilômetros a partir de São Paulo pertence ao Melhoramentos.

A cisão entre os irmãos – Paul, de um lado, Alfried e Ingo, do outro – se deu no fim de 2009, logo após a morte da mãe, Adolfa. Paul conta que, ao procurar os irmãos para definir a divisão da herança, recebeu uma informação que lhe tirou o chão: ele não teria direito a nada relacionado à Melhoramentos.

O rateio incluiria apenas o patrimônio pessoal da mãe, que não tinha mais participação no grupo. Paul compara a sensação que teve ao receber a notícia com a de uma criança ao descobrir que, em vez de uma viagem à Disney, ganharia um passeio ao Playcenter.

Diferenças. Nascido em Kiel, norte da Alemanha, e criado em São Paulo, Uwe Paul Otto Plöger, hoje com 65 anos, teve trajetória diferente dos outros dois irmãos. "Infelizmente, Paul é daquelas pessoas que nasceram para perder dinheiro. Você pode lhe dar R$ 100 milhões e, dez anos depois, não haverá mais nada", afirma um amigo.

Exemplo prático do que diz o amigo é o destino do dinheiro que Paul recebeu, na década de 90, como parte da venda da mansão da família, localizada na Alameda Itu, nos Jardins, um dos metros quadrados mais caros de São Paulo. Uma parcela foi investida em uma casa de bom padrão num bairro nobre de Cuiabá. Outro quinhão foi aplicado na compra de uma fazenda no interior de Mato Grosso.

Hoje, Paul não tem mais a fazenda – perdida por falta de pagamento de um crédito que contraiu para investir na produção de grãos. A casa está à venda há dois anos e já exibe claros sinais de deterioração. "Não consigo vender, mesmo pedindo metade do que vale", lamenta-se.

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No fim dos anos 60, como milhares de brasileiros, Paul enxergou no Centro-Oeste uma oportunidade única para progredir na vida. Então com 22 anos, recém-chegado da Alemanha com um diploma de engenheiro agrônomo no bolso, ele conheceu o Mato Grosso. "Me apaixonei perdidamente assim que desci do avião", relata. Decidiu ficar por lá. Daquela época até hoje, ele morou, ora no Mato Grosso, ora no Mato Grosso do Sul.

Sentia que estava no lugar certo para fazer o que gostava. "Fiz muita coisa de alta qualidade. Fui um bom engenheiro agrônomo", comenta. Ao levar ao limite suas escolhas, afastou-se da família. "Mas isso nunca significou ruptura. Enquanto mamãe estava viva, passei todos os Natais com ela em São Paulo."

Da Melhoramentos, porém, ele sempre esteve distante. E reconhece isso. "Nunca me interessei pelos negócios", conta. "Escondido" no Centro-Oeste, só participou de assuntos relacionados à empresa por meio de procurações emitidas em nome do pai e dos irmãos. "Eles usaram essas procurações para me tirar o direito à participação na companhia. Fui enganado", diz.

Danos morais. O advogado Fabio Renato Vieira, que representa Alfried Plöger no processo de inventário da mãe, tem outra versão para a história. "Como parte do planejamento sucessório do casal Paul Otto Wilheim e Adolfa Maria, na década de 80, o Sr. Uwe e os outros três irmãos ainda vivos na ocasião receberam sua parte no patrimônio da família", afirma. "No início dos anos 90, o sr. Uwe alienou sua participação na Melhoramentos para os irmãos Alfried e Ingo."

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A operação ocorreu pela holding chamada Uger, por meio da qual Paul participava do capital da Melhoramentos. Hoje, a Uger ainda existe e detém 2,06% das ações ordinárias e 7,75% das preferenciais do grupo. O advogado de Alfried frisa que todas as tentativas de Paul de anular o inventário da mãe e recuperar a participação na empresa fracassaram na Justiça até agora. Segundo ele, a partilha deve ser homologada nos próximos meses.

Uma das sequelas das ações de Paul contra os irmãos é outro processo – mas contra ele. Alfried pede R$ 194 mil de indenização por danos morais porque Paul fez contra o irmão um boletim de ocorrência. "O oficial de Justiça de Santo Antônio do Leverger (onde Paul mora) vem tentando citar o réu desde agosto de 2011, sem sucesso", diz Vieira. O advogado faz questão de dizer que Alfried e Ingo arcam com um plano de saúde de primeira linha para Paul. "Os irmãos sabem que ele está em uma situação financeira difícil e resolveram bancar o plano porque Paul não teria condições."

Uma das pessoas que ajudam Paul nos processos contra os irmãos reconhece que, juridicamente, sua situação é difícil, uma vez que ele assinou procurações que davam plenos poderes aos familiares. Ainda assim, Paul diz que não vai desistir. "Eu podia ser um viciado em drogas, um fanfarrão, o que fosse. Nada disso me tira o direito à herança de meus pais", argumenta.

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O engenheiro está animado porque levantou recentemente um documento que, segundo ele, comprova o que vem afirmando desde 2009. É uma cópia da alienação (venda) da holding Uger para os irmãos Alfried e Ingo. No documento de 1991, obtido pelo Estado, o pai de Paul assina, por procuração, no lugar do filho. Ele morreria pouco depois, em 1992.

Paul pretende levar esse documento à Justiça para tentar provar que está certo – ou seja, que as principais decisões sobre a participação dele na Melhoramentos não foram ratificadas de próprio punho.

Ele também argumenta que o contrato social da holding Uger proibia que mudanças societárias pudessem ser feitas por meio de procurações. Ao que tudo indica, a briga na tradicional família de industriais está longe do fim.

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