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A confiança de Ilan

Queda gradual do juro real longo depende da continuidade das reformas

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Por Fernando Dantas
Atualização:

O presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, permanece confiante em relação ao acerto da atuação do Copom desde outubro de 2016, quando se iniciou o atual ciclo de cortes da Selic.

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Na entrevista que me concedeu ontem, Ilan pareceu menos preocupado com os indicadores de atividade decepcionantes desde fevereiro do que muitos analistas de mercado. O presidente do BC tem um foco particularmente forte no médio e longo prazo, e não dá sinais que vai se sobressaltar com as oscilações que considera normais em qualquer processo de retomada econômica.

Ilan, naturalmente, se esquivou de responder à pergunta sobre se consideraria ficar no Banco Central para além de 2018, caso fosse convidado pelo próximo presidente da República. No entanto, independentemente dessa questão, ele parece bastante conectado no legado que deixará – frisando, aliás, que não é só dele, e que alguns dos avanços já tinham as raízes plantadas quando chegou em meados de 2016.

Uma parte substancial desse legado é ter trazido a inflação e os juros do Brasil para níveis ineditamente baixos. Na próxima reunião do Copom, a Selic, a taxa básica de juros deve ir para 6,25%, conforme sinalizou o próprio BC. O juro real (isto é, descontada a inflação) de curto prazo está em 2,5%.

Como notou Ilan, nos últimos cinco anos, essa taxa foi de 5%, há dez anos era de 10% e nos tempos turbulentos da década de 90 chegou a 20%. Não há dúvida de que há um processo de melhora, ainda que irregular e turbulento, como quase tudo no Brasil.

A taxa de juro real de curto prazo não vai ficar em 2,5% – isto também fica evidente na entrevista do presidente do BC. A taxa atual, ele observa, está claramente abaixo do nível que os economistas chamam de “neutro”, isto é, que não estimula nem desestimula a demanda, e portanto, a inflação.

A tendência é que a Selic volte ao nível neutro, mas aí entra outra questão importante. Será que o novo juro real neutro será mais baixo que o patamar de 5% que vigorou no passado recente? É possível, e seria uma excelente notícia para o Brasil.

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Ilan prefere não opinar sobre qual julga ser o atual nível do juro real neutro no Brasil. Esta é de fato uma variável não observável, que só pode ser inferida, e é delicado fazer afirmações peremptórias sobre ela. Mas o presidente do BC deixa claro que o ajuste fiscal, a reforma da Previdência, a manutenção da inflação em níveis baixos e a autonomia legal do Banco Central são fatores que ajudariam a trazer o juro neutro do Brasil para baixo.

O mesmo vale para os juros muito longos no Brasil, indexados à inflação, e que ainda apontam taxas reais em torno de 5%. Uma queda gradual desse juro real longo, muito elevado para padrões internacionais, depende da continuidade das reformas econômicas.

E há, finalmente, a questão espinhosa do spread bancário. O cidadão comum vê a conversa sobre taxas reais de juros de 2,5% ao ano, ou mesmo de 5%, e se pergunta em que país está vivendo. Porque nunca viu nada nem perto disso. É que essas taxas, expressas, por exemplo, no chamado “swap” de 360 dias, só prevalecem nas negociações entre o BC e os bancos, ou entre os bancos e as maiores empresas do País.

Para o brasileiro médio, assim como para a pequena e média empresa, o que vale são as taxas com elevados “spreads”, que podem ir a níveis muito maiores, e verdadeiramente estratosféricos no caso de linhas como cheque especial e cartão de crédito.

Ilan reconhece o problema, e mostra o que está sendo feito para combatê-lo, o que inclui diversas frentes: reforço de garantias, redução de custos operacionais, melhor sistema de informações e mais competição. Ele descarta, porém, medidas que ataquem os sintomas, e não as causas. Ilan definitivamente não é um economista que aprecie milagres e atalhos. Talvez seja essa a razão de ele ter um legado do qual cuidar.

*COLUNISTA DO BROADCAST E CONSULTOR DO IBRE/FGV

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