PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Economista e sócio da MB Associados

Opinião|A indústria ainda terá uma chance?

Duas importantes decisões ocorreram recentemente no cenário internacional: em 30 de novembro o Fundo Monetário Internacional decidiu incluir o yuan na cesta de moedas que compõe os Direitos Especiais de Saque, na qual já estavam o dólar, o euro, a libra inglesa e o iene japonês. Esta decisão confirma pelo menos três coisas: quando em agosto o Banco Central da China permitiu uma abrupta desvalorização de quase 2% do yuan frente ao dólar, muita gente pensou que o gigante asiático poderia estar voltando àquela fase de baixa da moeda, buscando melhorar o desempenho das exportações, como compensação pelo enfraquecimento da economia. 

Atualização:

Aqui na MB, nós sempre achamos, em linha com nossos colegas da Gavekal, que o que se buscava era mesmo a maturidade da moeda e não a desvalorização competitiva. Isto é da maior importância para o Brasil, como discutiremos adiante. Da mesma forma, a política cambial chinesa confirma a decisão do governo de alterar o modelo de crescimento chinês na direção da expansão do mercado interno e na menor dependência da evolução das vendas ao exterior e dos investimentos em infraestrutura. 

PUBLICIDADE

Finalmente, tudo indica que o governo chinês está evoluindo para a aceitação de mais alimentos importados na composição do abastecimento do mercado doméstico. Esta é uma decisão difícil, dada a história de fome no país até algum tempo atrás. Entretanto, a escassez de água e terras de boa qualidade acaba produzindo um custo de alimentação relativamente elevado. Entre junho de 2003 e novembro de 2015, o custo de alimentação subiu 110%, muito mais do que o índice do custo de vida, que se elevou 45%. O barateamento da oferta de alimentos, via importações, permitiria elevar o poder de compra das famílias em termos de bens industriais e dar suporte à expansão do mercado doméstico (algo muito parecido com o que aconteceu no Brasil nas últimas três décadas). 

Poucos dias depois, na reunião da Opep, realizada em 4 de dezembro, decidiu-se não restringir a produção de petróleo dos seus membros. Ora, como se sabe que o Irã irá, assim que as restrições comerciais forem eliminadas, exportar tudo o que possa produzir, é absolutamente seguro que a atual situação de sobra de óleo no mercado internacional irá se agravar. Não é por outra razão que os preços do produto estão apontando para um número inferior a US$ 40 o barril. 

Estes acontecimentos afetam nosso País, como tentamos mostrar no gráfico 1. Ali, vê-se claramente a tendência de enfraquecimento do preço do petróleo, que afeta negativamente a Petrobrás, pois boa parte de seu valor depende de suas reservas. Devemos lembrar que a cesta de petróleo brasileira vale menos que o Brent, que tem qualidade superior. Neste ano, por exemplo, o barril custou US$ 55, entre janeiro e outubro, enquanto que a média do preço FOB exportado pelo Brasil, no mesmo período, foi de US$ 43. Esta perda de valor soma-se aos grandes dilemas que enfrenta a Petrobrás. 

 Foto: Infográficos/Estadão

Ainda na área de commodities, o valor do minério de ferro (e do aço), mostrado no gráfico 2, despencou, afetando as empresas produtoras. Note-se que este movimento é estrutural. 

Publicidade

O único grupo que se mantém numa boa posição é o de commodities agrícolas, ainda que os preços internacionais também tenham caído, especialmente, como decorrência da valorização do dólar. Ocorre que este grupo de produtos tem forte suporte na demanda internacional e, especialmente, chinesa, bem como tem a desvalorização do real repassada diretamente ao preço dos produtos, dada sua característica exportadora. Como resultado, os preços em reais se mantêm bastante elevados, como se vê no gráfico 3 representado pelos preços da soja. Não é de se surpreender que a cadeia de produção viva bons momentos, mesmo quando se considera que parte dos seus custos sobe com o dólar. 

Indústria. A indústria brasileira continua no seu inferno astral. Os dados da produção referentes ao mês de outubro são calamitosos. Por exemplo, o setor de bens de capital contraiu-se mais de 32% em relação à produção de outubro de 2014. No período de janeiro a outubro, em relação ao ano anterior, a produção global caiu 7,8%, os bens de consumo duráveis caíram 17,2%, os não duráveis 7,2%, os intermediários 4,5% e os bens de capital espantosos 24,5%.

Entretanto, no meio deste tumulto, três mudanças começam a ocorrer e, no seu devido tempo, irão implicar em melhoras no cenário industrial. O primeiro, e o mais importante elemento, é a substancial melhora da competitividade da produção brasileira frente à importação da China. A razão básica está exposta no gráfico 4. 

Ali, se vê que nos dois últimos anos, o real se desvalorizou frente ao dólar em torno de 60%, enquanto que o yuan enfraqueceu apenas 6%. Ou seja, os produtos chineses chegam muito mais caros no Brasil, o que reabre espaço para a produção nacional. Este movimento não se aplica apenas a bens finais, mas, também, a componentes e partes. 

Em alguns casos, como confecções, o longo tempo de viagem da China para cá também permite que a produção nacional gire coleções muito mais rapidamente que os produtos importados. Esta mudança tem sido tão drástica que já existem casos, nos quais os chineses passam a construir fábricas aqui para manter os mercados conquistados, o que implica, inclusive, fazer do Brasil sua base de distribuição para América do Sul.

Publicidade

A segunda melhora em gestação é a elevação das exportações. Por ora, apenas os produtos mais leves, nos quais nossas vantagens são evidentes, é que têm apresentado uma expansão grande das quantidades embarcadas, como, por exemplo, metalurgia, têxtil, produtos de madeira, celulose etc. Entretanto, quem acompanha o desempenho das companhias já vê decisões de ampliação das vendas ao exterior em andamento, que deverão aparecer nas estatísticas já em 2016, especialmente entre as multinacionais. 

Finalmente, a distensão protecionista na Argentina pode permitir alguma recuperação das exportações para aquele país. Apenas nos últimos anos deixamos de vender mais de US$ 10 bilhões ao vizinho do sul.

Em nosso próximo encontro buscarei detalhar estas possibilidades.

Opinião por José Roberto Mendonça de Barros
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.