PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES

A ressaca da zona do euro

A Europa acredita que salvou a Grécia, mas ela é que precisa de uma reforma urgente

Por Gilles Lapouge
Atualização:

A Grécia permanece na zona do euro. Os gregos respiram, mas seus pulmões estão tão fracos que continuam sufocados. A cada dia que passa os "senhores de Bruxelas" apertam um pouco mais a corda que colocaram no pescoço da Grécia. Na terça-feira, o imposto sobre valor agregado (VAT) aumentou de 13% para 23%, incluindo os restaurantes, uma maneira infalível de afogar um país cuja única indústria mais ou menos forte é o turismo. No caso dos demais europeus, nem todos estão satisfeitos com o memorável acordo que permitiu à Grécia continuar na zona do euro e conservar o euro, em vez de voltar à sua antiga moeda, o dracma. Ontem, uma voz que estava muda havia muito tempo, fez-se ouvir: a do francês Dominique Strauss-Kahn, o ex-diretor do FMI que se tornaria presidente da França no lugar de François Holland se não tivesse tido a ideia absurda de agarrar uma empregada de um hotel em Nova York. Desde então, Strauss-Kahn, envolvido em vários processos, desapareceu. Nesta terça-feira ele se manifestou. Disse que a Alemanha impôs à Grécia um "diktat" e que os deveres impostos ao país são assustadores. As reuniões confusas em Bruxelas não apenas tiraram da Grécia o pouco de forças que ainda lhe restavam, mas, além disso, "a Europa deus as costas para a Europa". A voz de Strauss-Kahn, apesar das asneiras de caráter sexual que cometeu, deve ser levada em conta. Ela confirma o que muita gente pensa. E a prova é que, após o salvamento catastrófico de Atenas, fala-se pouco da Grécia e muito da Europa. O veredicto mais frequente é este: "A Europa saiu muito prejudicada dessa aventura. Ela acredita que salvou a Grécia. Na realidade, a União Europeia e, sobretudo, a zona do euro é que foram afetadas. É a Europa que deve passar por uma reforma urgente". Que Europa? Há duas: uma Europa do norte, com sua imagem de trabalhadora, rica e egoísta, e uma Europa do sul, com fama de preguiçosa, hedonista e egoísta. Como reconciliar essas duas Europas que o drama grego afastou ainda mais? Dois países mostram-se dispostos a repensar essa arquitetura falha, a França e a Alemanha. Paris e Berlim são os senhores da Europa (especialmente Berlim). Seus dirigentes se entendem bem. Mas, quando se trata de reformular a União Europeia, Hollande e Merkel divergem. A Alemanha não quer ouvir outra coisa senão o respeito às regras, à disciplina orçamentária. O projeto francês é menos contábil. Hollande repete que a União Europeia não pode ser reduzida a mecanismos, disciplinas. É um projeto político baseado na solidariedade. Mas Merkel responde que "a Europa representa 7% da população mundial e 25% da riqueza do globo. A União Europeia só poderá preservar seu modelo se for competitiva". O ex-premiê italiano, o excelente Romano Prodi, proferiu um julgamento sombrio sobre o conclave de Bruxelas: "Evitamos o pior, mas o mal foi criado". Lembrou o comportamento dos EUA no final da Segunda Guerra Mundial. A Europa era um campo em ruínas. Alguns americanos (plano Morgenthau de ocupação da Alemanha) queriam que os alemães indenizassem suas vítimas, como foi feito estupidamente após a Primeira Guerra Mundial, no Tratado de Versalhes, abrindo espaço para Adolf Hitler assumir mais tarde o poder. O general George Marshall, então o secretário de Estado de Truman, escolheu o caminho e a filosofia contrários. O plano Marshall (1947) injetou na Europa e na Alemanha volumes enormes de dólares. Acompanhou a sua ressurreição. Uma demonstração de que a generosidade e a inteligência caminham às vezes lado a lado. Angela Merkel não é Marshall. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO  

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.