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'Ações nos EUA são um risco muito maior para a Petrobrás'

Novaes França explica que as cortes americanas protegem e são sempre muito favoráveisaos investidores

Por Vinicius Neder e RIO
Atualização:

As ações contra a Petrobrás na Justiça americana representam um grande risco para a estatal, muito maior do que as investigações e processos em curso no Brasil. A avaliação é do advogado Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França, professor associado de direito comercial da Universidade de São Paulo (USP), ressaltando que não conhecia os meandros do processo civil do Estado de Nova York, em cuja Corte Distrital (judiciário federal dos Estados Unidos) correm os processos. Diante das diferenças entre a Justiça no Brasil e nos EUA, as ações na Corte Distrital de Nova York representam um risco para a Petrobrás? Representam um risco muito maior. No direito americano, os investidores são protegidos e as cortes americanas são muito favoráveis aos investidores. Eles estão alegando a violação da regra 10B5 da legislação da Securities and Exchange Comission (SEC, a CVM dos Estados Unidos). Essa regra diz que você tem de revelar "any material fact", ou seja, qualquer fato relevante, que possa influir na decisão do investidor de adquirir ou vender valores mobiliários. Você tem o dever de revelar e, se você não revelar, está sujeito a pagar os danos que daí decorrerem, além de multas punitivas. Eles estão pedindo na primeira ação os danos de 2010 a 2014, quando foram negociados na Bolsa de Nova York mais de 700 milhões de ADRs. Veja o risco!Como funciona a ação?Eles chamam lá de "class action", porque o investidor entra na Justiça dizendo para o juiz: 'É impossível reunir todos os investidores, então, estou entrando em meu favor e em favor da classe'. Provavelmente, as outras ações serão reunidas e a sentença proferida beneficiará todo mundo.Qual o mérito da ação? À medida que os fatos sobre a Petrobrás foram sendo revelados, e agora, em Nova York, o ministério público (o Departamento de Justiça dos EUA) ingressou com uma ação criminal e a SEC ingressou com medidas administrativas, o valor dos ADRs foi caindo. A ação mostra, na linha do tempo, que, a cada revelação, os valores caíam. Chegaram a cair 46%. O risco para a Petrobrás é grande. Evidentemente que vai ter defesa. Eles alegam que a Petrobrás fez declarações falsas, enganando os investidores, porque ela inflou o valor de contratos, de maneira que pudesse tirar dinheiro desses contratos para a corrupção e, consequentemente, os valores que estavam no balanço e os valores dos ADRs foram inflados. E, mais ainda, a Petrobrás teria feito declarações falsas durante todos esses anos, de 2010 a 2014, porque ela disse que tinha um comitê de ética e uma política anticorrupção. Esse tipo de alegação funciona à luz da lei americana? No caso da Enron, a indenização chegou a US$ 7,2 bilhões, ou seja, essas ações envolvem tanto dinheiro que as empresas preferem fazer acordos do que chegar ao final. Por que no Brasil as investigações não chegam a esses valores? Primeiro, é uma tradição a proteção dos investidores ser sempre em nível federal. O direito de mercado de capitais é federal e há julgamento pelo júri. Aqui, só tem júri para ações criminais, que atentem contra a vida. Nos Estados Unidos, há júri em ações de responsabilidade civil e, por isso, eles dão aquelas indenizações fantásticas lá, porque o júri é formado por gente comum. Tem um aspecto cultural, da importância do mercado na sociedade? Claro. Os Estados Unidos não tiveram um pensamento do Estado de bem-estar social, como existe no nosso direito e no direito europeu. Lá, os investidores são protegidos porque a poupança deles vai para isso. Não há uma previdência social paga pelo Estado.O autor original da primeira ação nos EUA comprou as ações há pouco tempo, em outubro. Isso influi no processo?Se fosse no Brasil, influiria. Ele comprou as ações quando esses fatos todos já estavam sendo revelados, mas com o sistema de "class action", ele está pedindo não só para ele, mas para todos que se acham em igual posição e que negociaram os ADRs de 2010 a 2014.

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