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Ajuste com retomada dos investimentos

Por RAUL VELLOSO
Atualização:

O inferno astral vivido pelo governo após as eleições é cada vez pior. A base de sustentação no Congresso está apática e vive sob o temor do envolvimento no escândalo da Petrobrás, com respingos óbvios no governo. O candidato mais forte à presidência da Câmara é pouco confiável aos olhos do Palácio do Planalto. A oposição mostra-se crescentemente agressiva, secundada por inúmeras manifestações antigoverno e anti-PT. A mídia é cada vez menos paciente com tudo isso. Nos mercados financeiros, o sentimento antigoverno é muito forte. Abalados há algum tempo, os indicadores vitais da economia não dão sinais de melhora. O modelo econômico parece próximo do esgotamento. O risco de perda do grau de investimento concedido pelas agências de risco internacionais é muito alto. Isso levará ao isolamento do Brasil e a uma taxa de crescimento econômico menor. A derrocada fiscal, que decorre do agravamento dos problemas crônicos da área e de novas pressões que surgiram, é a face mais visível da crise econômica que vivemos, pelo desarranjo geral que dela decorrerá. Os resultados fiscais de todas as esferas vêm há algum tempo se deteriorando de forma sistemática, levando a projeções ascendentes da relação dívida/PIB para os próximos anos, a exemplo de outros momentos igualmente difíceis do passado recente. A se manterem as pressões sobre os gastos, e como é difícil de enxergar um caminho de retomada do crescimento econômico e da arrecadação, a questão fiscal se torna mais uma vez a preocupação central do País. Foi em reação a tudo isso que o governo, em parte reconhecendo fracassos, mas numa clara e contundente manifestação de instinto de sobrevivência política, que tende a imperar em tais momentos, acaba de sinalizar mudanças drásticas na condução da política econômica. Por enquanto, anunciou a nomeação de um ministro da Fazenda de postura e história diametralmente opostas às da administração anterior. Tanto assim que Joaquim Levy, o novo titular da pasta, disse no seu discurso inaugural que agora haverá: 1) maior transparência na área fiscal; 2) adoção do conceito - mais adequado - de dívida bruta para avaliar a evolução da dívida pública; e 3) metas de superávit fiscal primário, que perseguirá tenazmente, de 1,2% do PIB em 2015 e de no mínimo 2% do PIB nos dois anos subsequentes, ante a perspectiva de um resultado pífio este ano. O nome de Levy é suficientemente forte para ter provocado uma reação inicial favorável, mas perduram dúvidas atrozes diante de muita incerteza sobre a evolução de variáveis ou decisões críticas. Ocorrerá alguma mudança relevante no modelo do crescimento do gasto? O PIB pode crescer mais e turbinar a arrecadação? O governo consegue aprovar aumento da carga de impostos se isso se tornar imperioso para cumprir as metas? A presidente manterá o apoio ao ministro? Nesses termos, os analistas da área correm para "rodar" suas planilhas, a fim de verificar se essas metas são factíveis sob as condições subjacentes nas quais acreditam, e surgem mil dúvidas. Penso que a Levy não resta outra escolha e ele sabe disso: terá de cumprir a meta de 2015 e o governo terá de apoiá-lo nisso. Sua demissão é um evento de difícil viabilidade, podendo sinalizar degringolada. Só que é preciso também examinar em que medida o resto do modelo econômico poderá se modificar no Dilma II, em parte para reduzir a pressão sobre a área fiscal, mas também para construir um novo caminho com vistas a um maior crescimento da economia, peça-chave de qualquer estratégia macroeconômica que for traçada a partir de agora. É aqui que entra a correção dos erros existentes na área de infraestrutura, que terá de ser o carro-chefe da estratégia de expansão dos investimentos e do PIB. Será imperioso nomear outros Levys, que dominem o funcionamento dos segmentos respectivos, mesmo que não sejam políticos, e que atuem de forma bem articulada com a área econômica do governo e com o setor privado, peça-chave do processo.* É consultor econômico

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