SÃO PAULO - O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Rafael Marques, não vê a atual estratégia de algumas montadoras, de não repassar aumentos reais aos salários, como uma tendência. "Tem a ver com o momento da empresa, principalmente daquelas que passam por reestruturação", afirma.
O que é tendência, na visão do sindicalista, são as negociações por empresa e não mais por categoria. "Cada realidade leva a um caminho diferente", diz. Ele lembra que fabricantes como Ford e Scania negociaram reajustes e empresas do setor de autopeças, máquinas e eletroeletrônicos concederam aumento real de 1,55% neste ano.
Marques ressalta ainda que a estratégia de conceder abonos no lugar de aumentos também foi adotada nos anos 90 durante períodos de crise.
A Fiat concedeu aumento real de 0,38% aos cerca de 24 mil funcionários da fábrica de Betim (MG) e abono de R$ 1,6 mil, ante alta de 1,31% em 2013 e abono de R$ 1,753. No Paraná, Renault e Volvo deram 2,5% de aumento acima da inflação e a Volkswagen deu 2,8%.
O coordenador de Relações Sindicais do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), José Silvestre, acredita que, na soma de todas as categorias, o ano deve fechar com aumentos reais acima daqueles aplicados em 2013, apesar das negociações do setor automotivo.
"Pelo que acompanhamos até agora das campanhas salariais do segundo semestre é bem provável que se repita o que ocorreu no primeiro semestre", afirma Silvestre.
Na primeira metade do ano, 93,2% das 340 categorias profissionais analisadas obtiveram aumentos superiores à inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). O aumento médio foi de 1,54%. Em igual período do ano passado, 83,5% das categorias conseguiram aumento médio real de 1,08%.
Silvestre pondera que a indústria automobilística enfrenta dificuldades de vendas no mercado interno e nas exportações para a Argentina, "o que se reflete nas negociações salariais".
Apesar do significativo peso da indústria automobilística na economia, não dá para dizer, segundo ele, que essa tendência vai extrapolar para o conjunto das negociações, principalmente em 2015.
"Se a economia continuar com crescimento baixo, se tiver retração forte no consumo, redução de crédito e o emprego der sinais de esgotamento, aí sim é claro que terá reflexos".
Queda de vendas.
Neste ano, até novembro, as vendas da Volkswagen caíram 14,8% em relação a igual período de 2013 e as da General Motors diminuíram 11,5%. O mercado total de automóveis e comerciais leves caiu 8,2%. Já a Mercedes-Benz reduziu as vendas de caminhões em 6,6% e a MAN Latin American em 12,1%, num mercado total que caiu 12%.
Quase todas as montadoras deram férias coletivas ao longo do ano e várias delas abriram programas de demissão voluntária e colocaram trabalhadores em lay-off (suspensão dos contratos). Ao todo, o setor eliminou 10.800 empregos de janeiro até novembro.