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Confiando pela terceira vez no próprio taco

Um dos fundadores do Twitter aposta que vai revolucionar de novo o universo das publicações digitais com o Medium, plataforma para artigos e ensaios

Por THE ECONOMIST
Atualização:

Ao ver a internet tomada pela inconsequência dos tuítes de 140 caracteres, poucas pessoas experimentam sensação tão ambígua quanto Evan Williams. Na condição de co-fundador do Twitter, o empreendedor lucrou bastante com o sucesso da rede de microblog e ainda hoje é seu maior acionista. Apesar disso, o principal projeto de Williams agora é contrapor o borbotão de tuítes, tantas vezes saídos da cabeça de gente que não tem mesmo muito o que dizer, a textos mais profundos e extensos.

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Lançado em 2012, o mais recente empreendimento de Williams, chamado Medium, é uma plataforma simples e elegante para artigos, cartas abertas e ensaios reflexivos. A ideia é transformá-lo num polo para os textos do público em geral, desempenhando papel semelhante ao que o YouTube tem para os vídeos amadores. Jornalistas, empresários e chefes de Estado, incluindo Barack Obama, já publicaram textos no site. Quando a Amazon quis manifestar sua discordância com uma reportagem do New York Times, em que a cultura do trabalho da gigante de comércio eletrônico era descrita em termos nada favoráveis, um dos executivos da empresa postou uma réplica no Medium, sem medir as palavras. Jornais e empresas de mídia digital de pequeno porte, como Pacific Standard e The Ringer, têm usado a plataforma para publicar conteúdo.

Como acontece em Hollywood, também no Vale do Silício é mais fácil vender algo que dê sequência a sucessos de bilheteria já comprovados. Em 1999, quando comandava a Pyra Labs junto com Meg Hourihan, Williams criou o Blogger. Ao possibilitar que, mesmo sem saber nada de programação, as pessoas postassem na internet reflexões, pontos de vista, sentimentos, análises, observações e apontamentos em geral, a startup fez com que “blogar” se tornasse uma das atividades (e também uma das palavras) mais populares do mundo.

Depois que o Google comprou a empresa, em 2003, Williams fundou com Noah Glass a empresa de podcasting Odeo, que em 2006 se metamorfoseou na Obvious Corp., entre cujos projetos estava o serviço de mensagens de texto que deu origem ao Twitter. “Eu não titubearia em renovar pela terceira vez a minha aposta em alguém que mudou o mundo em duas ocasiões anteriores”, diz Jeff Jarvis, professor de jornalismo da Universidade da Cidade de Nova York.

Foi o que fizeram alguns investidores: associaram-se a Williams e reuniram US$ 130 milhões para financiar o Medium, colocando seu valor estimado em algo como US$ 600 milhões. A esperança é que a plataforma consiga rivalizar com o Facebook e se estabeleça como um espaço para a publicação de opiniões pessoais e a circulação de notícias.

“O mundo precisa de um hedge contra o Facebook”, diz Kevin Thau, do Spark Capital, um dos fundos de capital de risco que investiram no Medium. (O argumento deve ganhar força depois da controvérsia gerada por uma decisão tomada no início de setembro pelo Facebook na Noruega, quando postagens contendo uma foto histórica da guerra do Vietnã, mostrando uma menina nua fugindo de um vilarejo bombardeado com napalm, foram removidas da rede social.)

O Medium não é, de forma alguma, um Facebook: sua aparência minimalista, em que abundam os espaços em branco, pôs a experiência de leitura na web em outro nível. Os usuários aprovam características como a estimativa de quanto tempo a pessoa deve levar para ler determinado artigo e a indicação de quais de seus trechos foram mais vezes sublinhados pelos leitores.

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Nem por isso Williams deixa de fazer algumas críticas: “Acho que tivemos uma preocupação um pouco exagerada com o design e a engenharia da plataforma e com quem poderia escrever nela”, diz ele, admitindo que, num primeiro momento, talvez tenha havido excesso de cautela na introdução de novas funcionalidades.

Agora o Medium começa a experimentar alternativas para ganhar dinheiro. Uma ideia é ficar com um porcentual do valor pago pelos assinantes das publicações que utilizam a plataforma. Ainda que o modelo atualmente só se aplique a veículos de menor expressão, talvez venha a atrair o interesse de jornais e revistas de maior porte no futuro. Também há planos para gerar faturamento com a introdução de anúncios, por meio dos quais as empresas poderiam promover as postagens que publicam.

No entanto, para criar um negócio publicitário rentável, o Medium precisará conquistar um número muito maior de leitores. Com 30 milhões de usuários mensais, em sua maioria integrantes de uma elite ilustrada, cosmopolita e fã de inovações tecnológicas, a plataforma está muito longe de atingir a escala de um Twitter, que é utilizado por quantidade mais de dez vezes superior de pessoas, para não falar no Facebook, com 1,7 bilhão de usuários.

Para John Battelle, da NewCo, editora online de negócios hospedada no Medium, a grande questão é saber se o foco do site em textos mais extensos o deixará vulnerável ao déficit de atenção que caracteriza a sociedade atual.

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Em outras paragens do mundo online, as histórias são cada vez mais contadas com o auxílio de imagens, emojis e vídeos. Williams permanece otimista. Tendo ajudado as pessoas a se expressar em frase curtas, sintéticas e espirituosas, ele acredita que ainda há “apetite por uma prosa mais suculenta”. Pode até ser verdade, mas isso não é suficiente para gerar lucros significativos, como pode atestar qualquer um que se veja incumbido da ingrata tarefa de comandar um jornal ou revista nos dias que correm.

© 2016 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.

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