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Decisão de Donald Trump leva crise à OMC

Países-membros denunciam tentativa da Casa Branca de esvaziar entidade e de bloquear funcionamento dos tribunais da organização

Por Jamil Chade e correspondente
Atualização:

GENEBRA - O governo dos Estados Unidos se recusou ontem a apoiar o texto de declaração ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), levando as negociações para um acordo na entidade, que se reúne em dezembro em Buenos Aires, a um impasse. A Casa Branca ainda anunciou no mesmo dia que vetaria a nomeação de novos juízes para os tribunais da OMC, abalando o sistema de solução de controvérsias.

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Num texto que falaria da importância em se manter o sistema multilateral do comércio, da abertura dos mercados e de se buscar formas de encontrar acordos para agricultura, pesca e outros setores, o comportamento dos EUA foi interpretado como um ato deliberado para minar a entidade.

A Casa Branca alegou que o texto não atendia a suas expectativas, acusando-o de dar atenção excessiva a questões de desenvolvimento e que não aceitaria a declaração sobre a “centralidade” do sistema multilateral do comércio.

A OMC foi criada para o benefício de todos, menos para o nosso, disse Donald Trump Foto: Andrew Caballero-Reynolds/AFP

Durante a reunião do G-20, Trump já havia se recusado a aceitar uma linguagem parecida. Um processo semelhante foi registrado na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e mesmo na Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec). Desta vez, não seria diferente no caso da OMC.

A partir de agora, o processo apenas pode ser resgatado por uma decisão política, num acordo entre ministros. O governo argentino, anfitrião do encontro, garantiu ontem que não vai desistir do processo. Para o porta-voz da OMC, Keith Rockwell, governos fizeram avanços importantes nos últimos dias. “Mas não atingiram a meta”, disse. “O bastão agora será passado aos ministros”, explicou.

Mas, entre as delegações, o gesto dos EUA foi interpretado como um sinal claro de que a administração de Donald Trump não está interessada em fortalecer a OMC. Durante sua campanha eleitoral, o americano chegou a ameaçar uma retirada da entidade e, por meses, o esforço do brasileiro Roberto Azêvedo, diretor-geral da OMC, foi a de garantir que os canais com a Casa Branca estivessem abertos.

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A interpretação, agora, é de que Washington poderá privilegiar apenas acordos bilaterais ou mecanismos pelos quais ele possa manter o controle.

O golpe, se consumado, pode ter um sério impacto para os países emergentes, entre eles o Brasil, que dependem das regras internacionais para ter alguma chance de evitar medidas protecionistas e corrigir distorções. O fracasso desta semana, depois de dez dias de negociações, deixou vários governos em alerta.

Esvaziar. Mas o golpe contra a entidade não ocorreu apenas na declaração de Buenos Aires. Governos ainda denunciam a tentativa da administração de Donald Trump de esvaziar a OMC, impedindo que seu órgão máximo de solução de disputas possa nomear juízes para avaliar os casos. Ontem, a entidade realizou a última reunião do ano para debater a situação do funcionamento de seus tribunais. O governo americano, uma vez mais, rejeitou qualquer iniciativa para preencher as vagas abertas entre os juízes.

O resultado da posição americana é que, a partir de dezembro, a OMC contará com apenas quatro membros do órgão de solução de disputas, instância que serve como uma espécie de Supremo Tribunal do comércio e que tradicionalmente dispõe de sete juízes. Hoje, o órgão conta com cinco membros. Mas o mandato de um deles termina no dia 11 de dezembro e não há substituto designado.

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Com praticamente metade de seus delegados, o tribunal máximo do comércio está ameaçado, justamente num momento em que as disputas tiveram um salto importante.

PARA ENTENDER

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Em fevereiro, a OMC precisa dar início à seleção dos novos juízes, porque os mandatos vão vencer. Mas o governo Trump tem usado diferentes justificativas para frear o processo. No início do ano, Washington apontava que a transição entre as administrações exigia um certo tempo da Casa Branca para avaliar suas posições no comércio global. 

Mas, em meados do ano, problemas técnicos foram alegados para impedir que a nomeação de novos juízes fosse realizada. Documentos revelados na semana passada pela imprensa americana, porém, revelam que o governo Trump já tratava da questão das nomeações desde fevereiro, na surdina. 

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Roberto Azêvedo, diretor-geral da OMC, chegou a tratar do assunto em uma viagem a Washington em setembro e a esperança era de que a crise pudesse ser superada antes do fim do ano. 

Ontem, porém, a administração Trump voltou a bloquear a escolha de novos membros. Como resposta, 52 países se uniram para propor que a escolha dos novos árbitros ocorra no início de 2018, evitando assim a paralisia da entidade. Para a delegação brasileira, o que mais preocupa é que os americanos não estão dando esclarecimentos sobre o que deve ser feito para que seu veto seja alterado. Para o Itamaraty, o risco é de que o órgão passe a ser “disfuncional”.

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