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Desafios da inserção internacional do Brasil

Por Antonio Corrêa de Lacerda
Atualização:

Qualificar a inserção internacional do Brasil se coloca dentre os principais desafios futuros. Há uma clara desproporção entre o posto que ocupa de sétima maior economia mundial, pelo critério de Produto Interno Bruto (PIB), o quinto no ranking dos maiores receptores de investimentos diretos estrangeiros e apenas o vigésimo segundo exportador, o que nos dá uma dimensão da magnitude do descompasso.O tema em si não é novo. Nas últimas duas décadas nossa participação nas exportações mundiais gira ao redor de apenas 1%, em um longo processo de estagnação. O que torna premente a sua melhora quantitativa e qualitativa é o rápido aumento da vulnerabilidade das contas externas. A nossa história econômica, assim como da maioria dos países, já demonstrou que o crescimento econômico, condição necessária para o desenvolvimento, só se sustenta, no longo prazo, mediante uma sólida posição do Balanço de Pagamentos. Isso é o que permite minimizar os impactos da instabilidade internacional e aumentar o grau de autonomia das políticas econômicas domésticas.O fato de possuirmos hoje maior grau de autossuficiência energética relativamente ao passado e contarmos com níveis recordes de reservas cambiais são fatores amenizadores do problema, mas que não eliminam totalmente a exposição ante a volatilidade e instabilidade dos mercados. Assim, a melhora do padrão de desenvolvimento depende fundamentalmente da superação da vulnerabilidade do Balanço de Pagamentos.O déficit em conta corrente brasileiro acumulado nos últimos 12 meses até março passado atingiu US$ 81,5 bilhões, o equivalente a 3,6% do PIB. Mais do que o volume absoluto, salta aos olhos o rápido crescimento ao longo dos últimos anos, lembrando que tínhamos uma posição de equilíbrio há pouco mais de seis anos, no auge da demanda chinesa e seus impactos positivos nos preços das commodities, o que, aliado a uma situação cambial mais favorável, nos permitiu gerar superávits comerciais expressivos, compensando o déficit estrutural na conta de serviços e rendas.Desde então, a diminuição do ritmo de crescimento chinês impactou negativamente os preços e a demanda do complexo agromineral brasileiro, ao mesmo tempo que a perda de competitividade da manufatura deteriorou a nossa capacidade de geração de resultados comerciais. Em poucos anos passamos de superavitários a deficitários, com destaque para o setor industrial. Embora estejamos longe de um risco iminente de insolvência, o crescimento exponencial do déficit em conta corrente é uma trajetória insustentável. A resolução da questão passa necessariamente por uma estratégia de desenvolvimento que leve em conta uma melhor inserção internacional e fortaleça o papel que devemos e podemos ter na configuração global:- construir um escopo de políticas de Estado, para além das políticas de governo, de incentivos estáveis e perenes de estimulo à produção local, inovação e exportação;- rever a estratégia de privilegiar as relações comerciais prioritariamente com países sul-americanos e africanos;- negociar acordos comerciais com grandes mercados (EUA, UE, Ásia, etc.) que possam nos proporcionar maior acesso a relevantes cadeias globais de valor;- estabelecer e apoiar a internacionalização das empresas brasileiras para torná-las elementos de apoio às vendas externas, fortalecimento de marcas e posição nos mercados;- aproveitar mais consistentemente a excelente base de empresas transnacionais aqui instaladas para estimulá-las a desenvolver maior valor agregado local, inovações, ampliar e qualificar as exportações;- para atingir os objetivos anteriores se faz necessário atacar nossa agenda de competitividade, tanto sistêmica quanto empresarial, e garantir condições minimamente isonômicas de financiamento, tributação, assim como demais fatores;- por último, mas não menos importante, implementar uma política cambial que leve em conta objetivos de longo prazo, desvinculando-a do caráter distorcido de âncora da política de estabilização de curtíssimo prazo, prática recorrentemente vigente nas últimas três décadas.*Antonio Corrêa de Lacerda é professor-doutor, coordenador do Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política da PUC-SP. E-mail: lacerda.economista@gmail.com.

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