O economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, acredita que o desemprego só vai começar a melhorar a partir da metade do ano que vem. Apesar de considerar absurdo o número de trabalhadores desempregados de 14 milhões - o equivalente a população da cidade de São Paulo - ele não ficou surpreso com esse resultado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) continua do IBGE no trimestre encerrado em abril.
Para ele, a principal variável de ajuste da economia hoje é o mercado de trabalho. Nos últimos anos, diz, foi construída uma nova classe média e com isso a renda real subiu. "Na hora que a renda real sobe, isso significa que o custo para o empresário aumenta e a margem de lucro cai. Esse é o jogo todo."
A seguir os principais trechos da entrevista.
Surpreendeu o resultado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), que apurou o aumento da taxa de desemprego para 13,6% no trimestre móvel encerrado em abril ante o trimestre terminado em janeiro (12,6%), mas um pequeno recuo de 0,1% ante o trimestre encerrado em março (13,7%)? Cair 0,1 ponto porcentual é estatisticamente irrelevante. Esse resultado mostra o drama que estamos vivendo: 14 milhões de pessoas desempregadas. É uma cidade de São Paulo desempregada no Brasil. É muita gente. A questão é a seguinte. Hoje a principal variável de ajuste é o mercado de trabalho. Desde o início do Plano Real os salários reais vieram subindo de forma constante. No período Dilma e Lula os salários reais dispararam. Mas o que estamos vendo agora, pode parece antipático o que eu vou falar, é que a boa notícia é que está ruim. Esse processo de desaceleração econômica está colocando no lugar essa variável.
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Até quando vai piorar o desemprego? Emprego é uma das últimas variáveis a serem afetada pela crise e uma das últimas a sair dela. Estamos no meio de um caos político, uma situação bastante delicada. O plano do Temer é um ajuste de longo prazo. No curto prazo tanto faz o que está acontecendo. Isso porque algumas coisas já estão no lugar. A taxa de juros vai continuar caindo, o dólar sob controle. Mas a queda do desemprego demora. A taxa de desemprego é calculada sobre quem procura emprego. Se a situação começar a melhorar, as pessoas começam a procurar emprego. Então,até parece que o desemprego piorou porque tem mais gente procurando emprego. Também quando a crise está muito forte a taxa de desemprego pode cair porque há pessoas param de procurar emprego. Esse é jogo. Acho que a taxa de desemprego começa melhorar na metade do ano que vem. O Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) começa a dar sinais mais tímidos de alguma melhora. O mercado de trabalho está ruim e o ajuste todo é esse. Acredito que esse ajuste pelo emprego não foi sem querer, não. Em 2014 a discussão era sobre a inflação de serviços. E lá já se falava que a taxa de desemprego estava sistematicamente muito baixa. Estamos passando por um momento extremamente difícil e está tendo este ajuste. Espero queele aconteça o mais rápido possível. Hoje o problema do Brasil não é econômico, é político. Eu não sei quem é o dono da lojinha lá em Brasília.
Com essa crise política, o sr. refez as projeções de aumento do desemprego e qual é o número que está trabalhando para o pico da taxa? Estou com 14,3%. Éa minha projeção no final deste ano. Depois vai ficar estável e começar a cair na metade do ano que vem. Por que eu não mudei? Qual o sentido do ajuste que o presidente Temer está fazendo? A despesa do governo vinha subindo, mas a receita também vinha crescendo. Daí caiu a receita e criou-se um déficit gigante. Para aumentar a receita ou você aumenta imposto no curto prazo, coisa que o governo não quer fazer, ou incentiva a economia para crescer mais. Ele não conseguiu. O que ele fez foi criar um ajuste de longo prazo, criar um teto, fazer reforma da Previdência. Com isso ele trouxe a valor presente uma mudança que vai ocorrer no futuro.Com isso, caem os juros e gera-se investimento. Mas empresário não investe porque juros é baixo. Ele investe porque tem demanda. O outro ponto é que o empresário está com uma ociosidade gigantesca, porque investiu fortemente até 2014. Não mudei as projeções por conta da crise política porque não é preciso: o ajuste é de longo prazo.
Como o sr. compatibiliza os últimos dados positivos de contratações do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) com os números negativos do desemprego da Pnad? O Caged mostra a geração líquida ou a destruição de vagas. Você pode aumentar o número de vagas e pode ter crescido mais que proporcionalmente o número de pessoas procurando emprego. É normal que isso aconteça. É preciso cautela ao avaliar os dados do Caged. O ajuste é o salário. Nos últimos anos construímos uma nova classe média e com isso a renda real subiu. Na hora que a renda real sobe, isso significa que o custo para o empresário subiu e a margem de lucro caiu. Esse é o jogo todo.
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Como é possível aumentar a produtividade do trabalhador neste momento, com uma taxa de desemprego enorme? Não é possível. Se o salário não sobe, o empresário não investe. Dado que a mão de obra é sistematicamente muito barata no Brasil, não há incentivo para o empresário aumentar a produtividade.