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Dois meses depois do Brexit

Os britânicos, como os europeus, seja em Londres ou em Bruxelas, caminham às cegas

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Por Gilles Lapouge
Atualização:

Esses ingleses! Não sabem o que inventar para nos incomodar; nós, que somos os verdadeiros europeus, franceses, alemães, italianos, alertamos os britânicos que, se decidissem deixar a União Europeia, sua economia iria desmoronar. 

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Nós prevenimos: se a Grã-Bretanha votasse em favor do Brexit, em 23 de junho, a orgulhosa Albion cairia de imediato na categoria de economia do terceiro mundo. A inflação dispararia, o desemprego aumentaria descontroladamente, os investidores fugiriam voando, os britânicos não consumiriam mais, o varejo iria à falência.

Mas conhecemos bem os britânicos há muito tempo. Não só são pretensiosos, como todos, não apenas não gostam dos franceses, mas também são cabeças-duras. E decidiram abandonar a UE, apesar dos nossos avisos. Bom, que saiam! Só lhes restará chorar. E que não contem conosco, os verdadeiros europeus, para chorar com eles.

Mas, dois meses depois do Brexit, como estão eles? Os primeiros dados nos chegam. E são surpreendentes. Por exemplo, as vendas no varejo subiram 1,4%, o que representa um avanço em um ano de 5,4%. Quanto ao desemprego, ele caiu. Em julho, o número de pessoas em busca de uma vaga de trabalho diminuiu em 86 mil. Melhor assim.

Mas por outro lado, esse caso lança algumas sombras sobre as ciências da economia e das finanças. Será possível que todos os analistas, operadores e banqueiros se enganaram, como se tivéssemos perdido de um só golpe todas as nossas bússolas e GPS? Felizmente, esses especialistas estão em estado de alerta. E explicam cientificamente esses resultados inesperados. Não podemos esquecer que a libra se desvalorizou 10%, se bem que os turistas correram para Londres e suas grandes lojas para gastar sem nenhum controle. E há outro aspecto com o qual não se contava. O mês de junho foi chuvoso, mas julho foi um mês ensolarado e todos os economistas sabem que o sol tem a propriedade de empurrar homens e mulheres para dentro das lojas.

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De qualquer maneira, o verdadeiro teste ainda não se verificou. O perigo para os britânicos será um congelamento dos investimentos por parte das empresas diante das incertezas provocadas pelo Brexit. E, neste aspecto, os especialistas se mostram prudentes. Na verdade, os britânicos, sempre astutos, não têm pressa para implementar o Brexit. O período de transição antes da saída efetiva de Londres da União Europeia deve se estender até 2019.

Então, como prever se ignoramos os futuros acordos que Londres deve assinar com Bruxelas, com a UE? O Reino Unido inevitavelmente vai tentar se beneficiar de um estatuto especial, mais ou menos como fizeram países que não aderiram à União Europeia, como Noruega e Suíça. Ele continuará a fazer parte do mercado único? Os direitos alfandegários atingirão bens e serviços?

Os britânicos, como os europeus, seja em Londres ou em Bruxelas, caminham às cegas. O banqueiro Dany Blanchflower resumiu a situação deste modo: “Os britânicos terão uma boa ideia de como foi o crescimento da sua economia no terceiro trimestre de 2015...em 2020!”

São essas as razões que mantêm um clima moroso na City londrina. Não obstante o desempenho paradoxal registrado no mercado de trabalho e nas vendas no varejo após o Brexit, no momento reina a prudência. Prova disso: o banco central lançou um plano de apoio à economia no início do mês de agosto, baixando a sua taxa básica de juros em 0,25 ponto porcentual, e acionou sua máquina de fazer dinheiro.

Em todo caso, mesmo nos inquietando, o cenário de catástrofe está afastado. Os especialistas reconhecem que não ocorreu um colapso e Londres deve escapar de uma recessão. Em compensação, sustentam que a economia do Reino Unido deve estagnar durante um ano, mais ou menos. “Estamos feridos, mas não é um ferimento profundo. Tampouco sofremos um golpe mortal”, é o que se fala em Londres. /TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

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