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'É uma dor ver os parentes nessa situação'

Comunidade grega em SP teme rumo do país

Foto do author Anna Carolina Papp
Por Anna Carolina Papp
Atualização:
Com a mãe e a irmã na Grécia, Niqui teme desdobramentos da crise Foto: Alex Silva / Estadão

Pelas paredes do Acrópoles, restaurante grego tradicional no Bom Retiro, em São Paulo, dezenas de quadros exibem as maravilhas das terras helênicas. Ainda que a situação do país não esteja nada tranquila, os imigrantes que frequentam a casa preferem discutir outros assuntos.

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“Os gregos são muito patriotas, não gostam de falar sobre a crise”, diz Niqui Petrakis, de 29 anos, filha do dono do restaurante, Thrassyvoulos Petrakis. Conhecido como “Seu Trasso”, o patriarca da família, que chegou a São Paulo em 1961, também evita o tema. “Ele sempre diz que a crise é europeia, e não só da Grécia”, diz Niqui.

No entanto, turbulências políticas e econômicas à parte, quando o assunto é família, o coração aperta. “Muitos dizem que a situação não é tão crítica, mas a minha família lá vive outra realidade”, conta ela. “Minha mãe é esteticista, e o movimento caiu 40%, pois as pessoas não têm mais dinheiro para isso”, afirma.Sua irmã caçula, recém-formada em engenharia, não consegue emprego na área e se vira com bicos. “O desemprego só aumenta. Estão todos muito preocupados e com medo. Isso não é nem viver, é só sobreviver.”

No plebiscito de hoje, seus familiares vão votar pelo “sim”. “A Grécia é um país pequeno, que depende do turismo. Ela precisa continuar a negociar, pois sozinha não vai conseguir sair dessa situação”, diz Niqui.

Já a família de Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), vai votar contra as medidas de austeridade. “Está tão ruim que já estão numa situação de desespero”, afirma ele, filho de imigrantes. Há alguns meses, Tingas passou a enviar dinheiro a uma de suas irmãs na Grécia. Aposentada por um problema de saúde, tem uma filha adolescente e seu marido está desempregado.

“Nesses pacotes gregos, ela foi uma das que tiveram as pensões reduzidas. Hoje recebe só ¤ 300”, diz. “A quantia que mando é basicamente para comerem. Há meses ela não paga a conta de luz e está cheia de dívidas. Há muitos em condições duras assim”, diz Tingas.

Ele afirma que seus amigos gregos também estão preocupados com os familiares. “Estamos todos acompanhando perplexos. É uma dor ver os parentes nessa situação”, relata.

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Para o economista, as duas opções do plebiscito deixam a Grécia em situação delicada. “O ‘sim’ pode significar um pacote muito pesado; o ‘não’ coloca o país numa situação difícil, caso saia da zona do euro. Os dois votos são ruins para o povo grego”, diz. “Como descendente de grego, votaria ‘não’. Como profissional de mercado, votaria ‘sim’, no sentido de tentar depois disso uma negociação melhor.”

Polarização. A família de Stavros Kyriópoulos está dividida. Com tios e primos na Grécia, ele, vice-presidente da Comunidade Helênica de São Paulo, diz que uns votarão “sim” e outros “não”. Para ele, muito além dos problemas econômicos, o impasse da Grécia com os credores traz ao país um conflito social. “O que mais me preocupa é que esse plebiscito tem trazido discórdia entre os gregos”, afirma. “Tem muita gente que não está falando com tio, primo ou irmão porque um é de direita e outro de esquerda. Isso está polarizando demais as pessoas.” 

Embora nenhum de seus parentes tenha perdido o emprego, a crise deixou a vida mais apertada. “Meu primo é taxista e reclama que o movimento caiu muito”, diz Kyriópoulos. “As pessoas não estão gastando, baixaram os salários.” Caso pudesse votar hoje, optaria pelo “sim”. “Se a Grécia rejeitar as medidas, vai perder completamente as vantagens de estar no mercado comum europeu. Li no jornal que nem impressora para imprimir o dracma eles têm. É muito arriscado.”

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