Publicidade

Em Camboriú, a disputa pelo prédio mais alto

Na fila dos grandes empreendimentos, um edifício de 70 andares concorre com outro que pode ultrapassar 80 pavimentos

Por Mariana Segala e Balneário Camboriú (SC)
Atualização:

Os engenheiros da construtora catarinense FG Empreendimentos passaram o segundo semestre de 2013 debruçados sobre o planejamento de uma operação que deve, finalmente, ser colocada em marcha daqui a algumas semanas. Trata-se da concretagem das fundações do Infinity Coast, um edifício residencial de 66 pavimentos que está sendo levantado em Balneário Camboriú, no litoral norte de Santa Catarina. Só essa etapa da construção consumirá 5,5 mil metros cúbicos de concreto, o equivalente a 785 caminhões betoneiras cheios, uma imensidão que será despejada na obra em apenas cinco dias. É que para formar um bloco único, como deve ser, o material não pode secar. Por isso, também será preciso montar duas fábricas de gelo no pátio da concreteira fornecedora, exclusivamente para atender ao empreendimento.Se tudo correr conforme o planejado, as fundações do maior prédio em construção no Brasil, segundo a consultoria Council of Tall Buildings and Urban Habitat (CTBUH), estarão prontas na primeira quinzena de fevereiro. "O volume de concreto usado apenas nessa fase seria suficiente para erguer um prédio inteiro de 30 andares", diz José Antônio Roncaglio, diretor comercial da FG Empreendimentos, que afirma faturar R$ 200 milhões por ano. "O desafio tecnológico e logístico de obras gigantescas como essa é enorme."Encontrar saídas desse tipo é a rotina da indústria imobiliária de Balneário Camboriú. Na cidade, de 120 mil habitantes, a guerra é para ver quem consegue subir mais. Na fila de obras da FG há um edifício de 70 pavimentos, que vai concorrer com um prédio com potencial para ultrapassar 80 andares, previsto para ser lançado em 2015 pela Embraed, outra construtora local. "O que existe de mais caro numa construção são os terrenos. Para fazer valer o investimento, tentamos elevar os prédios tanto quanto possível", diz Adriana Amorim, diretora da Embraed, que afirma faturar R$ 400 milhões por ano. Nessa disputa, em que grandes incorporadoras nacionais não conseguem entrar, a Embraed ainda ostenta um título. No seu portfólio de obras está o Villa Serena, edifício entregue em março de 2013 que, por enquanto, ocupa o posto de prédio residencial mais alto já pronto. A questão básica é a escassez de áreas disponíveis para construção. Em território, Balneário Camboriú é um dos menores municípios de Santa Catarina. Tem 46 quilômetros quadrados, o equivalente a menos de 7% da área de Florianópolis, a capital do Estado. A extensão da praia central, onde ficam os terrenos à beira-mar, não chega a 7 quilômetros. Por isso, eles praticamente já não existem. Nos últimos anos, as construtoras têm ocupado a chamada Barra Sul, área menos explorada - e onde, agora, se concentram os "espigões", como a população da região chama os prédios mais altos. Sem limites. O plano diretor da cidade impõe índices de ocupação máxima dos terrenos. Porém, não estabelece limites para a altura dos prédios. Nos anos 2000, a prefeitura regulamentou a transferência de potencial construtivo (TPC), instrumento que permite às incorporadoras aumentar a área construída nos terrenos, mediante o pagamento de taxas usadas para realizar investimentos em intervenções urbanas específicas. Isso facilitou o caminho rumo ao céu - e ao luxo. Praticamente só há construções de alto padrão em Balneário Camboriú. Um estudo conduzido pela consultoria Brain, de Curitiba, indica que 60% do estoque de apartamentos lançados na cidade custa acima de R$ 1 milhão. "Temos de nos adaptar para atender os compradores que, basicamente, são grandes empresários da região e do Paraná, além de fazendeiros dos Estados do Centro-Oeste, como o Mato Grosso", explica Luiz Alves Mendes, sócio da construtora Mendes Sibara. Mendes vai entregar no primeiro semestre de 2014 a primeira torre do Marina Beach Tower, um edifício residencial em que cada apartamento, além de três ou quatro vagas de garagem, inclui uma vaga para barco - em uma marina exclusiva acessível pelo elevador do prédio. Cada unidade custa a partir de R$ 2,5 milhões, mas o preço pode chegar a R$ 7,5 milhões dependendo do andar e da planta. Segundo o empresário, apenas 25% dos apartamentos ainda estão por vender. No Infinity Coast, da FG - que contratou a atriz americana Sharon Stone como garota-propaganda no ano passado -, os apartamentos estão sendo vendidos, em média, por R$ 2,5 milhões. A entrega está prevista para 2018.A aposta no luxo não ocorreu por acaso - foi um caso bem pensado, diga-se de passagem. "As regras de zoneamento estabelecem que à beira-mar os apartamentos devem ter, pelo menos, 220 metros quadrados de área", diz Carlos Humberto Metzner Silva, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) de Balneário Camboriú. Nas quadras que ficam entre a praia e a Terceira Avenida, segundo o executivo, só valem apartamentos com 150 metros quadrados ou mais. Foi a alternativa encontrada para "qualificar" o mercado local. Afinal, quem tem cacife para bancar uma segunda residência a esse preço também tem muito dinheiro para gastar com outras atividades na cidade. "A altura dos prédios dá a falsa sensação de adensamento populacional. Mas, na verdade, cada prédio tem um, no máximo, dois apartamentos, por andar", explica o secretário do Planejamento da cidade, Auri Pavoni. Para a prefeitura, é uma grande jogada - e uma fonte gigantesca de recursos. As faturas de IPTU por apartamento são proporcionais ao seu tamanho e, portanto, elevadas. Mas como a maior parte dos proprietários é formada por veranistas, a demanda social permanente da população é relativamente pequena. "Temos infraestrutura para atender o público quando a praia está cheia. Mas durante o ano, na verdade, ela é até subutilizada", avalia Pavoni. A prefeitura estima que a população da cidade no verão chegue a um milhão de pessoas.Impactos. Enquanto o céu é o limite para as construtoras, ninguém se dispõe a precisar os impactos que construções tão grandes podem causar à cidade. "Não há estudos que nos indiquem quais podem ser as consequências sobre a incidência de luz, o regime de ventos ou o meio ambiente, e muito menos temos referências de como mitigá-los", diz o arquiteto e urbanista Ênio Faquetti, membro do Conselho da Cidade, órgão consultivo vinculado à Secretaria de Planejamento e formado por representantes da sociedade civil. Há pelo menos uma década Balneário Camboriú discute a necessidade de aterrar a praia para alargar a faixa de areia, de modo a evitar que a sombra dos prédios se abata sobre os banhistas. Atualmente, acredita-se que o projeto possa ficar pronto até a temporada 2015/2016.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.