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Energia - o custo da mudança do preço

Por PAULO PEDROSA
Atualização:

A decisão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de modificar o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) certamente ameniza a grave situação de agentes expostos ao mercado de curto prazo de energia elétrica, especialmente distribuidoras e geradores. O problema é que, nesse processo, criaram-se custos que foram destinados a indústrias consumidoras livres com contratos que deveriam protegê-las contra variações nos preços da energia, comprometendo a confiança no mercado e na estabilidade de suas regras. Com isso, por mais bem-intencionada que tenha sido, a intervenção confirma processos em desfavor da indústria que se vêm repetindo no setor, e vai exigir tratamento, inclusive por ter efeitos talvez tão negativos quanto os que buscou coibir. Os consumidores contratados entendem que não é seu o papel de receptores dos custos associados à geração das térmicas, cujo valor de operação é superior ao novo PLD máximo, por meio do Encargo de Serviços do Sistema (ESS) por Restrição Elétrica. Conceitualmente, a mudança é inadequada, pois é obvio que a operação dessas térmicas não se deve a questões elétricas pontuais - como as associadas a uma falha momentânea do sistema de transmissão -, mas, sim, a necessidades estruturais energéticas. Os efeitos, portanto, deveriam ser rateados entre os agentes beneficiados pela medida, como determinam as regras setoriais. Também preocupa que, ao beneficiar alguns segmentos em detrimento da indústria grande consumidora, a Aneel possa ter ido além de sua alçada nesse processo, uma vez que a decisão tomada pode ser entendida como um ato de política tarifária ou de política industrial (aliás, anti-industrial). Ademais, a alçada do regulador ainda foi ultrapassada com a criação de um encargo, o que também ocorreu, na prática, quando se atribuiu função totalmente nova a um encargo já existente. O fato é que foi criado um subsídio setorial, que transferiu para indústrias custos de distribuidoras - decorrentes de exposição involuntária ao mercado de curto prazo e de contratos por disponibilidade assinados com térmicas - que foram deslocados para agentes que não fizeram parte desses contratos. O subsídio ainda beneficia geradores hidráulicos que tiveram sua garantia física reduzida, atrasaram empreendimentos e fecharam contratos de fornecimento de energia além do recomendável ou com problemas de desempenho. O processo reforça a tendência, pois, de a indústria grande consumidora de energia ser chamada a subsidiar outros agentes. Isso foi verificado em diversas situações recentes, e a principal delas é o fato de não terem recebido cotas de energia das concessões antigas - apesar de amplamente demonstrado que isso não só era justo, como a alternativa que traria mais benefícios à economia do País. A mudança recente, em particular, criou uma situação paradoxal para algumas empresas, como o caso hipotético de quem em meados de 2014 adquiriu um contrato de energia a R$ 450 por MWh para 2015. Trata-se de energia extremamente cara, mas comprada dentro das regras do jogo por consumidor que assumiu sua responsabilidade com o mercado, com seus acionistas e com seus próprios consumidores. Hoje essa indústria se defronta não só com um contrato com valores superiores aos do PLD máximo, mas também com a responsabilidade de suportar um encargo cujo efeito pode favorecer até concorrente que tenha optado por ficar exposto ao mercado e assumir as consequências disso. A situação compromete a confiança na estabilidade regulatória e no mercado, pois foram significativamente onerados justamente aqueles que tomaram decisões orientadas pelos princípios e regras do modelo vigente. A qualidade das equipes e dos processos da Aneel nos permite, porém, ter confiança em que haja espaço para ajuste de rumo. Com isso o regulador evitaria ainda que, ao tentar contribuir para a solução de um problema reconhecido por todos como muito grave, fossem criados outros conflitos no setor, ameaçando o processo como um todo. PRESIDENTE EXECUTIVO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE GRANDES CONSUMIDORES INDUSTRIAIS DE ENERGIA E DE CONSUMIDORES LIVRES (ABRACE)

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