PUBLICIDADE

Entidade tenta chamar atenção para história

ONG faz visitas guiadas pelas cidades de Neuchâtel e Winterthur para mostrar como parte da riqueza foi acumulada com o tráfico de escravos

Por Jamil Chade
Atualização:

 Na estátua imponente erguida em seu nome no centro da cidade, uma placa apenas diz que David de Pury era um “rico comerciante”. Na prefeitura de Neuchâtel, na biblioteca ou na universidade local, bustos e outras placas apenas indicam como os empresários e banqueiros da região contribuíram para erguer os luxuosos prédios. Só não dizem que parte do dinheiro vinha da exploração do comércio de escravos africanos, mesmo que na época fosse uma atividade totalmente legal.

PUBLICIDADE

Oficialmente, o governo suíço continua a apontar que não teve nenhuma participação oficial na escravidão, e ainda é um grande desafio colocar o assunto nas grades curriculares das escolas. Em 2003, pela primeira vez, a deputada Pia Hollenstein fez um pedido oficial ao governo do país para que esclarecesse sua participação no tráfico de escravos. “A Suíça nunca foi uma potência colonial e, portanto, é fundamentalmente diferente desses países no nível do comércio internacional”, indicou a resposta do Poder Executivo em Berna.

“Isso não esconde o fato de que muitos cidadãos suíços estiveram mais ou menos envolvidos no comércio de escravos, algo que o Conselho Federal (Executivo) lamenta na perspectiva atual”, reconheceu.

Sem responsabilidade. Mas a resposta do governo suíço ao pedido da deputada deixa claro que não se pode pedir, hoje, que o país seja responsabilizado. “A questão precisa ser tratada no nível internacional”, indicou. Desde então, o governo mantém a mesma posição em relação ao assunto. 

Para tentar recolocar o tema na pauta e forçar escolas a tocar na questão, a organização não governamental Cooperaxion iniciou visitas guiadas pelas cidades de Neuchâtel e Winterthur, percorrendo as ruas e palacetes para mostrar como parte da riqueza desses locais foi acumulada graças à exploração do comércio de escravos.

“Nosso engajamento é pelo dever de memória. A História nos ensina que a desigualdade social averiguada hoje entre os países antigamente envolvidos no comércio triangular não nasceu do nada”, declarou Izabel Barros, historiadora e uma das responsáveis pela entidade.

“Foi tentando equilibrar essa relação que começamos a desenvolver projetos de desenvolvimento sustentável no Brasil e na Libéria. É nosso dever reconhecer e cooperar com as reais vítimas desse comércio – os descendentes das populações que foram, durante quatro séculos, escravizadas – não em forma de caridade, mas como uma possível reparação”, completou. 

Publicidade

Guia do tour, a historiadora aponta que a reação de grande parte do público é “bastante positiva”. Mas admite que já teve pessoas em seu grupo que destacaram os benefícios que esses empresários e banqueiros haviam gerado para as cidades suíças.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.