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Europa fecha porta de negociações após novas acusações de Tsipras

Carta assinada pelo premiê e enviada pela manhã aos credores internacionais reabriu esperanças de acordo, mas acusações de chantagem no fim do dia irritaram autoridades de Bruxelas

Por Andrei Netto e CORRESPONDENTE
Atualização:

PARIS - Ministros de Finanças da zona do euro romperam o diálogo com vistas a um acordo com a Grécia até a realização do plebiscito sobre a austeridade convocado por Atenas para o domingo. A decisão foi tomada depois de mais um dia de posições ambíguas da parte do primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras. Depois de enviar carta à Comissão Europeia aceitando os termos estipulados por Bruxelas, o premiê realizou um pronunciamento na TV com duras críticas à Europa e seus dirigentes, aos quais chamou de "círculo de conservadores" e de "chantagistas".

O novo capítulo do drama da dívida da Grécia teve início com a carta assinada por Tsipras. A correspondência foi enviada pela manhã ao presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Trichet, ao presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, e à diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde.

A diretora-gerente doFMI, Christine Lagarde, foi uma das destinatárias da carta de Tsipras Foto: Jonathan Ernst/Reuters

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No documento, revelado pelo jornal britânico Financial Times, o premiê afirmou: "A República Helênica está preparada para aceitar o acordo sujeito às seguintes emendas, adições e esclarecimentos, como parte de uma extensão do programa do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FESF) que chega à expiração e um novo acordo de empréstimo do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MES) pelo qual foi enviada uma requisição".

A carta reiterava ainda que as emendas respeitavam o programa proposto pela Comissão Europeia. Entre essas adições estavam temas como a manutenção de taxas de impostos sobre o consumo, a TVA, mais baixas para as ilhas gregas e um adiamento do aumento da idade mínima de aposentadoria.

Na prática, a carta não acrescentou condições intransponíveis e reabriu de imediato a expectativa de um acordo quando da reunião do fórum de ministros de Finanças da zona do euro (Eurogrupo), que seria realizada às 17h30 em Bruxelas. Em caso de entendimento, especulou-se, Tsipras estaria pronto a cancelar a realização do plebiscito que convocara na sexta-feira sobre a adoção ou não do plano de austeridade de € 7,6 bilhões proposto pela Comissão Europeia no fim de semana.

Mas horas depois do aceno por um acordo, o governo radical de esquerda mudou de postura. Tsipras convocou um pronunciamento em rede de TV e voltou a disparar críticas em tom agressivo contra os dirigentes europeus. "Eles estão chantageando você para votar 'Sim' para todas as demandas dos credores", afirmou, dirigindo-se à população e acusando "o círculo de conservadores" de exigir sacrifícios de "pensionistas e pobres".

O premiê não apenas manteve o plebiscito, como também voltou a fazer campanha aberta pelo "Não", garantindo que esse resultado criará melhores condições para seu governo negociar com os credores internacionais. "Depois que anunciamos o plebiscito, ofertas melhores foram colocadas na mesa - e nós continuamos com nossas contrapropostas", afirmou, assegurando que a consulta popular não é sobre a saída do país da zona do euro, mas "sobre o retorno aos princípios da Europa". Tsipras terminou alegando que, caso o Eurogrupo se manifestasse de forma positiva em relação à sua carta, o governo agiria imediatamente.

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As declarações aumentaram de imediato o mal-estar entre as autoridades europeias. Antes mesmo da abertura da reunião do Eurogrupo, o coordenador do fórum, o ministro de Finanças da Holanda, Jeroen Dijsselbloem, afastou a possibilidade de um acordo. "Nós temos de discutir as propostas, mas com esse último discurso vejo poucas chances de progresso", advertiu.

Menos de uma hora e meia depois, os ministros de Finanças responderam a carta e as declarações de Tsipras com a recusa de negociar até o plebiscito de domingo. "O Eurogrupo uniu-se para decidir esperar o resultado do plebiscito antes de continuar as discussões", explicou o ministro de Finanças da Eslováquia, Peter Kazimir. "Não se deve colocar o carro à frente dos bois."

Nos bastidores políticos em Bruxelas, Paris e Berlim, a estratégia de Tsipras é considerada incompreensível, marcada por idas e vindas, por críticas duras e por tentativas de aproximação depois retiradas.

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Divisão. Um dia depois do calote de pagamentos da Grécia ao FMI, a crise dividiu os governos dos dois países fundadores da União Europeia, Alemanha e França. Ontem, em novo pronunciamento ao parlamento, a chanceler alemã, Angela Merkel, afirmou que o futuro da Europa "não está em jogo", que não buscará "um compromisso a qualquer custo" e que "não há base" para um acordo "antes do plebiscito". 

Hollande falou após Merkel e foi no sentido oposto, sem deixar dúvidas sobre a divergência. "É preciso ser claro: o acordo deve acontecer agora", disse durante viagem a Lyon, ressaltando que a França está tentando mediar um entendimento sem vetos e sem radicalismos. "É nosso dever manter a Grécia na zona do euro. Isso depende da Grécia, mas também depende de nós. Como europeu, eu não quero a perda de sustentação da zona do euro."

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