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‘Excesso de incentivos contribuiu com a recessão’

Para economista, ferramenta abalou a geração de recursos do governo, deixando a política fiscal atada

Por Alexa Salomão
Atualização:
Para Afonso, é preciso vontade política para fazer cortes Foto: FÁBIO MOTTA|ESTADÃO CONTEÚDO

O economista José Roberto Afonso, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia do Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), tem produzido uma série de estudos sobre os benefícios fiscais. Como explicou em sua entrevista ao Estado, a meta é desvendar quanto, afinal, eles custam ao País.

O que motivou o estudo?

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Conhecer e estudar uma forma de gasto público sobre o qual pouco se sabe, pois os benefícios fiscais são uma forma disfarçada de gasto público. No agregado, chegam a superar o orçamento da maioria dos ministérios da União.

O levantamento mostra que houve um aumento na concessão desses benefícios...

Sim. No passado recente, o governo concedeu desonerações e renúncias, que tanto pecaram pelo excesso, quanto, sobretudo, pela seletividade na escolha dos beneficiados. Em ambos os casos, não produziu o então prometido esforço de fomentar a economia. Paradoxalmente, o excesso de incentivos ajudou a empurrar o País para o abismo da pior recessão do pós-guerra.

Como assim: ajudou a empurrar para a recessão?

O excesso de benefícios abalou a geração de recursos pelo governo. Hoje, a política fiscal está atada. Perdeu o seu potencial de combater a crise.

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Que isenções, na sua opinião, criaram as maiores distorções, em vez de benefícios?

Aqueles que foram concedidos de forma seletiva e sem um critério ou racionalidade técnica para se justificar porque ora se escolhia este ou aquele setor e, às vezes, até mesmo um contribuinte para ser beneficiado. A desoneração da folha é certamente o maior erro de política fiscal e econômica. Partia de um diagnóstico correto – que é o excessivo custo tributário de contratar mão de obra no Brasil comparado ao resto do mundo, mas não se limitou a beneficiar os setores mais expostos à concorrência internacional. Os setores beneficiados foram arbitrados por decisão do governo, sem a menor lógica, nem proximidade entre si. O pecado capital foi criar o benefício quando se estava próximo do pleno emprego e não se comprovou que alguém contratou mais por causa dele. Pior foi quando o cenário mudou radicalmente, o governo manteve o benefício, que ainda existe até hoje. Mas isso não impediu uma disparada do desemprego. Ou seja, o governo continua pagando para os empregadores continuarem a demitir seus empregados.

Por outro lado, benefícios têm um papel: como condenar um programa que beneficia a moradia para a baixa renda, por exemplo? Quais são as alternativas?

Fazer uma correlação entre custos e oportunidades. Não houve um programa consistente, envolvendo outros governos, para criar moradia e, ao mesmo tempo, infraestrutura urbana e social, com creches, escolas, postos de saúde, transportes. A distribuição das moradias parece ter tido muito mais uma finalidade eleitoral imediata. Pode ter beneficiado mais os proprietários de terras e construtores do que as famílias mais pobres.

Os benefícios fiscais contornam o sistema de cobrança de impostos. A reforma tributária seria uma alternativa melhor?

Sim. Mas o sistema atual tem tantas distorções que nem dá mais para ser reformado. É preciso construir, ainda que aos poucos, um novo e moderno sistema tributário. É melhor reduzir o imposto para todos do que fazer concessões absurdamente caras que beneficiam muitos poucos.

Como se reverte tantos benefícios, que agora já comprometem mais de 6% do PIB?

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Com vontade política. A mesma vontade que se teve para fazer as concessões de benefícios dispararem, deveria se ter para cortar. Também é preciso ter capacidade técnica, para dar total transparência sobre quanto custa, quem beneficia, trazer à luz o resultado e, a partir daí, avaliar quais são os bons e maus benefícios. 

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