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Foco fiscal

Em artigo anterior, mostrei a importância do uso de ativos para abatimento da dívida bruta e da redução da Selic como condição necessária para frear a relação dívida/PIB. Propus o uso dos seguintes ativos: a) excesso de US$ 200 bilhões de reservas internacionais e; b) metade de R$ 1 trilhão da disponibilidade de caixa do Tesouro Nacional no Banco Central, que não rendem nada. Isso permitiria, junto com a redução da Selic, abater metade da dívida com títulos da União.  Nas simulações apresentadas, parti da hipótese de que o governo conseguiria aprovar a PEC 241 (congelamento de despesas) e a reforma da Previdência, bem como de crescimento econômico de 2% ao ano a partir de 2017. No espaço de duas semanas, o quadro piorou com as resistências do Congresso Nacional em aceitar as contrapartidas que os Estados teriam que cumprir para poderem se beneficiar da nova renegociação de suas dívidas com a União. Ganhou força também a reivindicação dos Estados do Norte e do Nordeste por novos benefícios uma vez que os maiores beneficiários da renegociação foram os Estados do Sudeste e do Sul, que detêm a maior parte da dívida estadual, uma vez que, salvo Alagoas, todos os demais Estados têm relação dívida/receita inferior a 100%, quando o limite é de 200%. É mais uma derrota da equipe econômica face ao front político do Congresso. Fato é que Michel Temer está mais para primeiro ministro do que para presidente. Não dá um passo que possa desagradar sua problemática base política, que parece refratária à disciplina fiscal. Enquanto isso, coincidindo com a aprovação final do impeachment da presidente afastada, tem-se o avanço nos bastidores do Congresso de uma anistia para políticos que tiveram seus nomes envolvidos na Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. Só agora, após a finalização do impeachment, aparece o desrespeito de governos estaduais à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) na desobediência aos limites de despesas de pessoal, o principal limite da LRF. O acordão entre Temer e governadores vai ferir mais uma vez a LRF ao deixar fora das despesas de pessoal vários componentes dessas despesas. Este governo que veio para restaurar a disciplina fiscal, em pouco tempo, dá exemplos contrários de forte impacto fiscal. Enquanto isso tenta pôr a culpa do desajuste fiscal nas despesas previdenciárias.

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Por Amir Khair
Atualização:

Previdência. Embora não seja fácil aprovar nova reforma previdenciária é lamentável a superficialidade dos argumentos que preveem o estouro das contas do regime geral da Previdência. Para início de conversa, que estouro é esse em que não são apresentados os números acompanhados das premissas e memória de cálculo como determina a LRF? Há que se discutir com profundidade a questão previdenciária. É a maior política social do País. É fato que suas despesas irão crescer, mas as premissas de projeção devem contemplar a precária gestão de receitas e despesas do INSS, onde cerca de 30% da receita é sonegada e a despesa é desviada devido ao fraco controle sobre as mesmas. A assistência social rural, considerada uma das principais causas do déficit, não pode ser classificada como previdenciária uma vez que não é contributiva e deve ser prevista receita compatível com sua despesa, majoritariamente composta por salários mínimos aos beneficiários. Deve-se considerar, também, que aumento de salário mínimo não aumenta só despesa, mas receita previdenciária, além de maior atividade econômica. Enfim, na medida em que for avançando a discussão técnica e política sobre uma nova reforma não apenas as centrais sindicais de trabalhadores como entidades da sociedade civil e da academia vão exigir debate mais qualificado do que o que vem sendo colocado. Foco fiscal. Se o desafio é o equilíbrio fiscal, não pode ficar escondido o principal causador deste desequilíbrio que são os juros responsáveis em 2015 por 82% (!) do déficit fiscal. Chega de proteger o sistema financeiro liderado pelos grandes bancos. Há que os pôr no centro do debate, juntamente com os danos causados pelo Banco Central.  *MESTRE EM FINANÇAS PÚBLICAS PELA FGV E CONSULTOR. ESCREVE QUINZENALMENTE