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Governo ignorou alerta de que incentivos fiscais seriam ilegais

Por Jamil Chade e de Genebra
Atualização:

O governo foi alertado por especialistas em comércio internacional que os programas criados nos últimos cinco anos dando amplos incentivos fiscais poderiam ser questionados legalmente na Organização Mundial do Comércio (OMC). Mas tanto no Ministério da Fazenda, na Casa Civil, como no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, a ordem foi a de ir adiante com os programas. Conforme o Estado revelou em dezembro de 2014, a Europa acionou o Brasil nos tribunais da OMC no que é o maior questionamento contra a política industrial do País jamais realizado. Se o governo for condenado, Brasília sofrerá um impacto profundo na estratégia produtiva do governo e com a possibilidade de atingir investimentos feitos por multinacionais. Há duas semanas, a reportagem revelou que o Japão também decidiu abrir uma queixa na OMC, com os mesmos argumentos dos europeus. No centro do questionamento da UE e do Japão estavam alguns dos programas que serviram de carro-chefe do governo de Dilma: Inovar-Auto, Recap, Lei de Informática, Programa de Inclusão Digital, Programa de Incentivos ao Setor de Semicondutores e Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Equipamentos para TV Digital. Os europeus atacam os impostos aplicados de smartphones a carros, e alertam que o governo criou "escudos" para proteger uma indústria nacional que "não é competitiva". "O Brasil aplica altas taxas internas para vários setores, como automotivos, tecnologias de informação, máquinas", indicou a UE. Outra queixa da UE se refere às exigências do uso de componentes domésticos em produtos como condição para ter benefícios fiscais. Para os europeus, "isso promove a substituição de importações ao induzir o produtor europeu e realocar ao Brasil sua produção e limitar o fornecimento estrangeiro".Custos. Um exemplo dado pelos europeus é o do custo do smartphone no Brasil. Segundo o bloco, o aparelho no País custa 50% mais caro que na maioria dos mercados. Isso apesar de a indústria nacional de tecnologia contar com reduções de impostos de 80% a 100%. Nos documentos entregues pela UE aos juízes nas últimas semanas, nenhuma novidade em relação às demandas iniciais de 2014. Os mesmos programas indicados naquele momento aparecem como o centro da disputa. Apesar das centenas de páginas de processo, o caso segue as mesmas dimensões de outras disputas na OMC nos últimos anos. Mas, em Brasília, fontes de dentro do governo confirmam que alertas foram lançados internamente a quem estava organizando os programas para que cuidados fossem tomados para não violar as regras da OMC. A principal delas é de que um país não pode discriminar entre produtos importados e nacionais em matéria fiscal e que não se poderia usar o sistema tributário para camuflar subsídios.Comitê. O alerta sobre os riscos não foi feito apenas internamente no governo. Por dois anos, EUA, UE, Japão e até mesmo a China levaram os casos de isenções fiscais do Brasil aos comitês técnicos da OMC, exigindo mudanças. Em agosto de 2014, a Europa, segundo o Estado informou na época, já estudava lançar a ofensiva legal e que apenas aguardava a eleição ou não da presidente Dilma Rousseff para definir qual seria sua estratégia. Com a reeleição do governo, Bruxelas considerou que pouco mudaria na política industrial nacional e que, portanto, teriam de levar o caso aos tribunais. Agora, o Brasil terá até o dia 1 de setembro para apresentar sua defesa, no que promete ser uma das tarefas mais complicadas para o time de advogados internos do Itamaraty. A meta é a de mostrar que os programas não são discriminatórios. O governo informou por meio do MDIC que "tem plena confiança de que os argumentos que serão oferecidos pela defesa brasileira no decorrer do processo irão comprovar que a política industrial brasileira é compatível com as regras da OMC".

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