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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Guerra dos BCs?

Trump ataca as políticas monetárias dos grandes bancos centrais e comete algumas confusões

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Mais por reação visceral do que pela lógica, o presidente Donald Trump começa a fustigar as políticas monetárias dos grandes bancos centrais (BCs).

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Estão errados, segundo ele, o Banco Central Europeu, o Banco do Japão e o Banco do Povo da China. Todos eles produziram, argumenta ele, políticas de desvalorização de suas próprias moedas, com brutais perdas para os Estados Unidos em comércio exterior e nível de emprego.

Nesses ataques, Trump se envolve em algumas confusões. A mais profunda é a mistura que faz entre política monetária e política comercial. Com a possível exceção do Banco do Povo da China, os grandes bancos centrais não procuraram desvalorizar suas respectivas moedas em relação ao dólar de maneira a aumentar a competitividade do produto do seu país e, assim, açambarcar mais fatias do comércio exterior. Eles emitiram moeda e derrubaram os juros para lubrificar o crédito e garantir a recuperação da atividade econômica e queda do desemprego. Os efeitos sobre os mercados de câmbio devem ser entendidos como efeitos colaterais.

E, atenção: esses grandes bancos não fizeram nada diferente do que fez, com os mesmos objetivos, o Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, que, entre 2008 e o início de 2017, injetou nada menos que US$ 4,45 trilhões nos mercados (veja o gráfico) e derrubou os juros a níveis próximos de zero. Ou seja, se há uma moeda superdesvalorizada em consequência de políticas de afrouxamento monetário (quantitative easing), esta é o dólar. Razão adicional que levou o Fed a essa política foi a necessidade de produzir mercado para enorme volume de títulos públicos e privados que encalharam no mercado e estavam sendo substancialmente desvalorizados. Essa desvalorização derrubou o patrimônio de fundos de pensão e de fundos de investimento.

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Curiosamente, Trump está se dedicando agora ao mesmo discurso sobre guerra cambial entre parceiros comerciais que em 2010 se empenhou o então ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega, quando se queixava do impacto sobre o real (baixa do dólar em reais) produzido pela política expansionista do Fed.

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No entanto, o que importa agora não são os erros de diagnóstico cometidos por Trump, mas o que pode vir aí em consequência deles.

Quando se queixa do dólar excessivamente valorizado em relação às outras moedas, Trump, ao menos implicitamente, se insurge também contra a  política adotada atualmente pelo Fed, que é de retirada de dólares dos mercados, alta de juros e, consequentemente, de valorização do dólar.

E, se pretende expandir as despesas públicas para financiar projetos de infraestrutura a fim de aumentar o emprego numa situação de pleno-emprego e, nessas condições, obrigar o Fed a aumentar a velocidade de enxugamento de liquidez, a trombada entre políticas tende a se acirrar.

Em tudo isso há um grave erro de foco. Embora as políticas de expansão de moeda estejam sendo pilotadas pelos bancos centrais, o presidente Trump dirige suas ameaças aos governos, no caso, aos governos da Alemanha e do Japão, como se estes fossem responsáveis pelas políticas dos bancos centrais, que detêm, na verdade, autonomia. Seria como reclamar dos governos que o poder judiciário de seus países estivesse despachando sentenças que, em algum nível, fossem prejudiciais aos Estados Unidos.

Se Trump pretende responder com guerra comercial, como ameaça desencadear contra o México – e, presumivelmente, também contra a China –, e com guerra cambial, como ameaça fazer contra a União Europeia e o Japão, os efeitos não se restringirão apenas ao comércio global. Extravasarão para todo o mercado financeiro, porque produzirão impacto sobre todos os ativos: moedas, títulos, ações, commodities, contratos de hipotecas e imóveis. Em todo caso, não dá para ter certeza de nada, dada a enorme confusão que tomou a administração Trump.

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Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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