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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Inflação, meio ponto a menos

Com critérios de medição do consumo das famílias mais atualizados, a inflação brasileira seria menor

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Atualização:

Em vez de 2,76% nos 12 meses terminados em abril, como divulgado nesta quinta-feira, a inflação do Brasil deve ser em torno dos 2,25%.

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Isso ocorre porque a cesta de consumo utilizada como base para o cálculo do IPCA está desatualizada em quase dez anos. A última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que retrata os hábitos de consumo da sociedade e que continua a ser a base para o IPCA, é datada de 2009. (Sobre a inflação de abril, veja o Confira.)

A existência desse atraso, de cerca de 0,5 ponto porcentual ao ano, foi avaliada por pesquisadores do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, que analisaram dados de 2000 até 2015.

Desde 2017, uma nova POF está sendo produzida pelo IBGE e terá seus resultados conhecidos em 2019. Deverá conferir que produtos e serviços deixaram de ser consumidos, quais passaram a ser e em que proporção. Em 2009, por exemplo, os celulares não eram tão inteligentes como os atuais e não havia aplicativos para pedir comida ou conhecer ofertas de supermercado. Tampouco o brasileiro, à época, pensava em trocar o DVD da locadora pelo catálogo da Netflix.

O estudo do Ibre, que mede a cesta de consumo atualizada anualmente pelo PIB, concluiu que o IPCA de 2015 teria ficado em 8,9%, e não em 10,7%. Assim, por falta de revisão da cesta de consumo, a inflação medida pelo IPCA ficou imprecisa e também não consegue captar o chamado efeito substituição, que é a troca automática de produto quando o consumidor considera a primeira opção cara demais. É, por exemplo, quando substitui carne de vaca por carne de frango ou por ovos.

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Como salários e contratos são corrigidos pela inflação do ano anterior, o índice superestimado influenciou o salário mínimo e até mesmo os lucros das empresas, que arcaram com custos mais elevados. Essa conclusão poderia levar a outra: nos últimos sete anos, os juros básicos (Selic), que têm de ser calibrados pela inflação, podem ter ficado mais altos do que deveriam.

A recomendação internacional é de que a pesquisa seja realizada a cada cinco anos, mas o IBGE tem enfrentado restrições orçamentárias. A POF tem custos altos. A de 2017/2018 se estende por 12 meses, coleta dados em 75 mil domicílios, exige alta qualificação dos pesquisadores e, pela primeira vez, usa tablets, e não só planilhas de papel, para registrar informações.

Em outros países, essa revisão é mais frequente. No Reino Unido, por exemplo, ocorre todos os anos desde 1947. Isso permitiu que o cálculo de inflação considerasse serviços de streaming de música, como o Spotify. Também registrou curiosidades históricas. Mais caros do que carnes enlatadas, os cortes de carne fresca só entraram na cesta de consumo a partir de 1956, dez anos após a 2ª Guerra, indicando que a economia voltava a se aquecer.

A tecnologia, no entanto, deve garantir um avanço da nova POF em relação às anteriores: a tabulação dos dados será mais fácil, possibilitando a atualização, já em 2019, da cesta de consumo usada para o cálculo do IPCA. A POF de 2008/2009 só foi adotada no IPCA a partir de 2012.

CONFIRA

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»Sem surpresas

A inflação de abril (0,22% no mês e 2,76% em 12 meses) veio dentro das expectativas. O elemento novo é o esticão do dólar, que puxou os preços no atacado. Mas não teve grande influência no mês, porque seu impacto será medido em maio e semanas seguintes. Ainda assim, é preciso ver até que ponto essa alta persistirá, coisa que ficará mais clara em 15 dias. Quanto aos juros, continua de pé o corte de 0,25 ponto porcentual no próximo dia 16. Está em aberto o que virá na reunião seguinte do Copom.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

Raquel Brandão
Filipe Strazzer
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