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Licenciamento ambiental pode deixar de existir

Sem alarde, comissão do Senado aprovou PEC que derruba a legislação ambiental para licenciamento de obras públicas

Foto do author André Borges
Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA - Em meio ao terremoto político que toma conta de Brasília, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira, 27, sem alarde, uma Proposta de Emenda à Constituição que simplesmente rasga a legislação ambiental aplicada em processos de licenciamento de obras públicas.

A PEC 65, proposta em 2012 pelo senador Acir Gurgacz (PDT-RO) e relatada atualmente pelo senador Blairo Maggi (PR-MT), estabelece que, a partir da simples apresentação de um Estudo Impacto Ambiental (EIA) pelo empreendedor, nenhuma obra poderá mais ser suspensa ou cancelada. Na prática, isso significa que o processo de licenciamento ambiental, que atualmente analisa se um empreendimento é viável ou não a partir dos impactos socioambientais que pode gerar, simplesmente deixa de existir.

O senador Blairo Maggi (PR-MT) é o relator do projeto Foto: JEFFERSON RUDY/AGÊNCIA SENADO

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Em um documento de apenas três páginas, os parlamentares informam que "a proposta inova o ordenamento jurídico", por não permitir "a suspensão de obra ou o seu cancelamento após a apresentação do estudo prévio de impacto ambiental (EIA), exceto por fatos supervenientes". A mudança, sustentam os parlamentares, "tem por objetivo garantir a celeridade e a economia de recursos em obras públicas sujeitas ao licenciamento ambiental, ao impossibilitar a suspensão ou cancelamento de sua execução após a concessão da licença".

O licenciamento ambiental, seja ele feito pelo Ibama ou por órgãos estaduais, estabelece que qualquer empreendimento tem que passar por três etapas de avaliação técnica. Para verificar a viabilidade de uma obra, é preciso os estudos de impacto e pedir sua licença prévia ambiental. Este documento estabelece, inclusive, quais serão as medidas compensatórias que a empresa terá de cumprir para realizar o projeto. Ao obter a licença prévia, o empreendedor precisa ainda de uma licença de instalação, que permite o início efetivo da obra, processo que também é monitorado e que pode resultar em novas medidas condicionantes. Na terceira etapa, é dada a licença de operação, que autoriza a utilização do empreendimento, seja ele uma estrada, uma hidrelétrica ou uma plataforma de petróleo. O que a PEC 65 faz é ignorar essas três etapas.

"Estamos simplesmente perplexos com essa proposta. Se a simples apresentação de um EIA passa a ser suficiente para tocar uma obra, independentemente dese documento ser analisado e aprovado previamente, acaba-se com a legislação ambiental. É um flagrante de desrespeito à Constituição, que se torna letra morta em tudo o que diz respeito ao meio ambiente", disse ao `Estado' a coordenadora da 4ª câmara de meio ambiente e patrimônio cultural do Ministério Público Federal, Sandra Cureau. "É muito simbólico passar essa PEC nesse momento. Entramos em um vale-tudo". 

O Ministério Público Federal e os estaduais, segundo Sandra, vai adotar um posicionamento contundente contrário a proposta. "Estamos todos perplexos. Temos que mostrar aos parlamentares o absurdo que estão cometendo. O Brasil é signatário de vários pactos internacionais de preservação do meio ambiente. A Constituição tem que ser harmônica, não contraditória em seus incisos", comentou.

A PEC tem um regime especial de tramitação. Ela precisa ser discutida e votada em cada uma das casas do Congresso Nacional, em dois turnos. Para ser aprovada em ambas, precisa de três quintos dos votos (60%) dos respectivos membros do Senado e da Câmara. A emenda constitucional tem que ser promulgada pelas mesas das duas casas, e não necessita de sanção presidencial.

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Em sua análise da proposta, Blairo Maggi sustentou que a PEC "visa garantir segurança jurídica à execução das obras públicas", quando sujeitas ao licenciamento ambiental. "Certo é que há casos em que ocorrem interrupções de obras essenciais ao desenvolvimento nacional e estratégicas ao País em razão de decisões judiciais de natureza cautelar ou liminar, muitas vezes protelatórias", declarou.

Segundo Maggi, claramente se pode observar que a proposta não objetiva afastar a exigência do licenciamento ambiental ou da apresentação de um de seus principais instrumentos de avaliação de impacto, o EIA. Não afeta, assim, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e consagra princípios constitucionais da administração pública, como a eficiência e a economicidade.