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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Mais arrocho nos juros

O Banco Central teve de recalibrar sua política de juros para adequá-la à mais frágil política fiscal

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Foto do author Celso Ming
Atualização:

Não sobrou outra opção ao Banco Central (BC) a não ser aumentar em mais meio ponto porcentual os juros básicos, que agora estão no nível dos 14,25% ao ano. Além disso, a decisão foi de não permitir nova trinca à credibilidade da autoridade monetária. A convergência da meta de inflação de 4,5% está mantida para o final de 2016.

O plano era aparentemente pingar mais uma ou duas doses de alta de 0,25 ponto porcentual e parar por aí. Mas as coisas mudaram substancialmente e o Comitê de Política Monetária (Copom) teve de recalibrar sua política de juros para adequá-la à mais frágil política fiscal.

 Foto: Infográficos/Estadão

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Tudo havia sido montado no pressuposto de que o governo federal cumprisse o prometido: que retiraria do mercado R$ 66,3 bilhões (superávit primário de 1,1% do PIB) para pagamento da dívida. Agora, reconhece que não conseguirá retirar mais do que R$ 8,7 bilhões (0,15% do PIB). E só aí, a diferença já vai para R$ 57,6 bilhões. Mesmo assim, não garante que cumprirá a meta, estabeleceu novo limite de estouro sobre os R$ 8,7 bilhões, de até R$ 26,4 bilhões.

Como o governo parece em voo cego, aumenta a incerteza. O resumo da ópera é o de que, em vez de encolher, a dívida se expandirá. Mais dinheiro levantado com dívidas do Tesouro circulará na economia e o BC não poderá contar com jogo a favor da política fiscal, como esperava, para controlar a inflação. Sobrou mais trabalho para a sobrecarregada política de juros.

A inflação não sofrerá apenas com o impacto da atuação mais frouxa do Tesouro. Será puxada para cima também pela alta do dólar, que, apenas em julho, deu um salto de 7,11% e concorre para encarecer em reais os importados.

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Outra vítima do novo quadro econômico é o discurso mantido com o objetivo de conduzir as expectativas. O BC vem repetindo que o impacto da política fiscal sobre a inflação tende a ser neutro, ou seja, que não aumenta nem diminui os preços. Agora se vê que a mais desejada do que real neutralidade do setor fiscal ficou mais distante. O que se espera é que também o Copom reconheça que já não conta com ela. Sem esse reconhecimento, há prejuízo para a credibilidade da autoridade monetária, um capital abalado durante o primeiro período Dilma.

O comunicado emitido após a reunião do Copom deixou as explicações para a ata a ser editada na próxima quinta-feira. É lá que deverão estar as razões pelas quais o BC optou por prolongar o arrocho monetário, apesar da recessão, da queda do consumo e da nova “ola” de flexibilização do governo Dilma. 

Será inevitável que a nova carga de juros dos títulos do Tesouro seja incorporada ao principal da dívida. Como o nível da dívida é indicador da qualidade da saúde das contas públicas, aumentará a probabilidade de que os títulos do Brasil percam o grau de investimento e passem a ser considerados junk bonds (títulos lixo), como uma das agências de rating, a Standard & Poor’s, avisou anteontem.

Se os juros básicos subirem e outros subsídios praticados no crédito, como a TJLP e os que compõem as prestações habitacionais, ficarem nos mesmos níveis de hoje, a política monetária perderá ainda mais eficácia contra a inflação.

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Desvio O Tesouro explicou nesta quarta-feira por que as projeções da dívida pública expostas por ocasião da revisão da meta fiscal ficaram tão diferentes das apresentadas pelos bancos. A divergência está nas projeções da economia usadas para os cálculos. O Tesouro adotou números excessivamente otimistas, como a queda do PIB neste ano de apenas 1,5% e uma Selic de 14,0% ao ano. O otimismo irrealista é um desvio persistente do governo. O resultado é a perda de credibilidade.

Indefinição Não ficou claro no comunicado do Fed divulgado nesta quarta-feira quando, afinal, começará o processo de alta dos juros básicos nos EUA. O Fed não vê melhoras significativas no mercado de trabalho nem avanço da inflação. Essa situação se prolonga por meses, o que sugere que a alta pode não começar em 2015. Se assim for, a valorização do dólar diante das outras moedas também pode ser adiada. A definição é aguardada em todos os mercados porque servirá de base para grande número de decisões de investimento e de administração de carteiras.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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