Alguma ficha deve ter caído. A presidente Dilma parece convencida agora de que tem de governar e, neste momento, governar significa trabalhar com o orçamento equilibrado. Se vai conseguir, são outros quinhentos.
Falta muito para saber se as novas propostas são suficientes para garantir a sustentabilidade da dívida bruta e as bases para a retomada do crescimento econômico e do emprego. A redução das despesas depende demais de decisões do Congresso e de dobrar os servidores públicos para aceitar o congelamento dos salários. Depende também de que a base do governo aceite a redução de despesas sociais, especialmente do Programa Minha Casa, Minha Vida.
O aumento da arrecadação está fortemente dependente da volta da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), várias vezes rejeitada pelo Congresso. Dessa teta se espera, em 2016, uma receita de R$ 32 bilhões, maior que o rombo fiscal da proposta orçamentária, de R$ 30,5 bilhões.
Na prática, o governo empurrou para o Congresso a maior parte da responsabilidade pela tomada de decisões impopulares, cujo objetivo é consertar os estragos que ele próprio produziu.
A volta da CPMF vem com nova destinação. Não é mais para a Saúde, o discurso enganador de antes. É para ajudar a cobrir o déficit da Previdência Social e, de quebra, não ter de repartir a arrecadação com Estados e municípios.
A alegação de que se trata de um tributo provisório beira o cinismo. Essa lorota é conhecida. Também a velha CPMF chegou como provisória, até no nome (que é o P da sigla), mas foi ficando. O ministro Joaquim Levy disse na entrevista em que apresentou o novo pacote que a intenção da equipe econômica é que de dure quatro anos, quando o governo já será outro e os ministros, também.
Se vem para cobrir o rombo da Previdência, já se vê que tende a continuar em vigor enquanto houver rombo. Para que o rombo não exista, será necessária profunda reforma do sistema a que o governo se negou até agora, sob o argumento de que não há déficit da Previdência, “essa invenção dos neoliberais”.
A alíquota dessa nova CPMF é 0,20% sobre cada operação bancária. O ministro Levy tentou vender essa facada com o argumento de que é indolor, que implica desconto de “tão somente” 2 milésimos em cada compra, como se 2 milésimos fossem uma insignificância. Vale lembrar que a CPMF também foi criada em 1996, com uma alíquota de 0,20%, que depois foi puxada para 0,38%.
Nenhuma observação dos ministros sobre o maior defeito desse tributo, que é o caráter cumulativo (efeito cascata), que onera todo o sistema produtivo, tira a competitividade do produto brasileiro e, por isso, é vedado pela Constituição.
O governo desistiu, também, de aumentar, como antes pretendia, a Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico (Cide), que incidiria sobre os combustíveis, provavelmente porque não quis jogar ainda mais gasolina no fogaréu da inflação. Com isso, não ajuda a recuperar o setor do etanol, dizimado no primeiro quadriênio Dilma.
Falta saber se o corte pretendido das despesas é suficiente para resgatar a confiança perdida após tantas estripulias na condução da política econômica. Em todo o caso, parece finalmente caído o tabu de que não podem ser cortadas despesas sociais. Mas pode ser pouco.
CONFIRA:
As projeções do mercado levantadas pelo Banco Central indicam um pessimismo crescente na definição dos principais indicadores econômicos deste ano. Aí estão as previsões para o PIB e para a inflação.
Expectativas Esse maior pessimismo indica que o Banco Central não está conseguindo administrar as expectativas, uma das exigências do sistema de metas de inflação. Os “fazedores de preços” não estão se deixando convencer de que o Banco Central vai obter a convergência da inflação para o centro da meta no final de 2016.