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‘Mercado entende que é preciso mudar governo’

Para presidente do Credit Suisse, há consenso de que o governo Dilma não tem condição de fazer reformas para tirar País da crise

Foto do author Alexandre Calais
Por Ricardo Grinbaum , Alexandre Calais e Luiz Guilherme Gerbelli
Atualização:
Cenário. Para José Olympio, a situação é complicada e 'chegou a hora de os políticos pensarem com grandeza e se unirem para consertar o País' Foto: ALEX SILVA/ESTADAO

Nas incertezas que dominam o Brasil, o presidente do banco Credit Suisse, José Olympio Pereira, acredita em pelo menos um sinal bastante claro: o mercado entende que o melhor para a economia seria a interrupção do atual mandato da presidente Dilma Rousseff. “Existe um consenso na economia e no mercado de que este governo não tem condição de implementar as reformas estruturais de que nós precisamos”, disse. “Das alternativas de interrupção do mandato da presidente Dilma, a renúncia é a menos traumática.”

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O executivo mostra uma grande preocupação com a trajetória de alta da dívida pública, que pode trazer graves consequências para o País, e prevê um cenário muito difícil para as empresas. “Vamos ver empresas ótimas com problemas”, disse. Em relação à Petrobrás, acredita ser indispensável uma capitalização. Mas teria de ser algo muito expressivo. “Tem de ser algo mais para R$ 150 bilhões a R$ 200 bilhões”, disse. A seguir, os principais trechos da entrevista: 

Alguns empresários passaram a defender a renúncia da presidente Dilma Rousseff. Qual é a opinião do sr. sobre isso? Existe um consenso na economia e no mercado de que este governo não tem condição de implementar as reformas estruturais de que nós precisamos. Essas reformas são as únicas coisas que vão nos tirar da atual situação. Estamos pagando a conta da Constituição de 1988. Ela deu muito mais direitos do que o País pode arcar. 

Quais seriam essas reformas? A presidente já reconheceu que a reforma da Previdência é importante, que é inviável que os brasileiros queiram se aposentar aos 54 anos de idade. Isso não existe em lugar nenhum. O ministro Jaques Wagner (da Casa Civil) reiterou esse ponto. Mas, embora o governo até concorde que é necessário, ele não tem capacidade para fazer isso. Então, o mercado em geral entende que, para que as reformas ocorram, é necessário uma mudança de governo. 

Diante desse cenário, como o sr. vê o desenrolar da crise política? Nós temos duas alternativas: uma interrupção do governo agora por diversas razões – impeachment, TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ou renúncia – ou nós temos o processo eleitoral de 2018. Levar mais dois anos e meio sem reformas será muito penoso para o País. Das alternativas de interrupção do mandato da presidente Dilma, a renúncia é a menos traumática. A visão geral é de que a melhor solução para a economia é uma interrupção do governo. No mercado, é só olhar para o câmbio e a Bolsa. Qualquer movimento que mostre que a saída do governo pode ser antecipada cria um otimismo enorme. O mercado está dizendo para todo mundo que a interrupção desse governo é a melhor solução para o País pela simples razão de que ele não tem capacidade de fazer o que precisa para consertar o Brasil. 

Num cenário de interrupção, um novo governo teria capacidade para mudar a situação da economia? Um novo governo representa uma possibilidade de melhora, mas não é uma garantia. Tudo vai depender da capacidade desse novo governo de implementação de reformas e de convencimento da população e do Congresso de que nós temos de fazer os ajustes. 

Quais ajustes são necessários? Temos de fazer mudanças na Previdência, nas leis trabalhistas e desindexar gastos do salário mínimo. O bom de hoje é que até um estudante de economia sabe o que precisa ser feito. Eu gosto de fazer a distinção com a crise que vivemos na hiperinflação. Nós levamos anos fazendo planos com todas as melhores cabeças do País. Nós trabalhamos em planos que sucessivamente davam errado até o Plano Real. Só aí a gente acertou. Mas ninguém sabia. Ao contrário do período da hiperinflação, agora todo mundo sabe (o que fazer), o que não torna a solução menos difícil. 

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Qual é a possibilidade de essas mudanças serem implementadas? Acredito que essas mudanças, a capacidade de implementá-las, dependem de uma boa crise, porque ninguém toma decisão dolorosa e difícil no tempo bom. Nós temos essa oportunidade. Nós temos uma crise sem precedente no País. Tenho 30 anos de mercado e nunca vi uma situação como a que estamos vivendo. E é preciso um segundo ingrediente: uma liderança muito forte, capaz de comunicar tudo isso para a nação e, como líder, levar essas questões para frente. Esse segundo aspecto é a grande questão. 

O sr. vê uma liderança forte? O vice-presidente Michel Temer teria essa capacidade? Ou é preciso uma nova eleição? Existe tanta alternativa hoje em dia que é difícil dizer. Ao mesmo tempo, a Lava Jato está tão dinâmica que nunca se sabe quais os desdobramentos que podem ocorrer. 

Podem surgir novas lideranças? Existe essa possibilidade, mas estamos vivendo um grande vácuo. E não é só aqui, mas no mundo. O fenômeno Donald Trump e Bernie Sanders (candidatos republicano e democrata, respectivamente, que disputam a indicação para a eleição presidencial nos EUA) mostra que a população em geral está meio cansada do mesmo. Isso abre espaço para novas lideranças, o que pode ser uma grande oportunidade ou um grande risco. Há gente muito boa e capaz que pode exercer essa função. Em 2014, batemos na trave com o senador Aécio Neves. Ele estava com uma equipe excepcional montada pelo Armínio Fraga. Há a possibilidade de um grupo se unir e colocar o Brasil nos trilhos. Mas não é garantia. Tem muito risco de trocarmos o governo e o novo não conseguir implementar as reformas e restaurar a confiança.

O PMDB e PSDB começaram a se movimentar para a eventualidade de o governo Dilma acabar. O sr. considera esse o melhor cenário para a economia? A situação brasileira é de tal ordem que chegou a hora de os políticos pensarem com grandeza e se unirem para tentar consertar o Brasil. O País é estruturalmente muito atraente como destino de capitais. Continuo acreditando nisso por causa do tamanho da população, do potencial de crescimento, da força das nossas instituições quando comparadas a outros países emergentes. E ainda temos uma riqueza de empreendedores inacreditável. Esses fatores fazem com que todo mundo continue interessado no Brasil. Até 2018, eu não estou contando muito com uma volta (da economia). Minha grande preocupação é: todo mundo tem paciência para aguentar, mas se o salvador não vier em 2018, eu não sei como a gente vai ficar. 

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Por quê? Apesar dos fatores atraentes do País, pode ficar tão complicado e difícil que as pessoas podem deixar o Brasil de lado. Não vão dar mais o benefício da dúvida e aí podemos ter um problema mais sério do que temos hoje.

O cenário econômico traçado por vocês já é bastante preocupante... No final de 2015, a gente tinha feito uma estimativa de contração de 3,5% do PIB para este ano. Mas, tendo em vista o último trimestre do ano passado e os primeiros números que começamos a ver neste primeiro trimestre, revisamos a nossa projeção para uma contração de 4,2%. 

Esse é um cenário base... Não ficaríamos surpresos se essa contração ficar acima de 5%. Isso é loucura. Mas vamos ficar no cenário base, que já é horroroso. Com um PIB de 0,1% em 2014, -3,8% em 2015 e -4,2% neste ano, que economia que aguenta isso? O sofrimento que a população tem é dramático. 

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Há economistas preocupados com o risco de o Brasil quebrar. O sr. acredita nessa possibilidade?  Estamos numa trajetória de dívida pública muito preocupante. Temos de mudar e não adianta colocar um band-aid. Temos de mudar estruturalmente. Nesse momento, temos um escudo muito forte, as reservas cambiais. O déficit de conta corrente também está zerando, e a desvalorização cambial fez com que a balança comercial tivesse uma recuperação muito forte. Do ponto vista externo, estamos ok. O investimento estrangeiro direto continua vindo. Mas temos um fator negativo. O mercado internacional, em geral, está fechado para emissores brasileiros. Então, eu não vejo risco de o Brasil quebrar no curto prazo. Agora, numa trajetória em que a dívida pública continua a crescer initerruptamente, esse cenário que eu mencionei desaparece. Aí começa a ter uma desconfiança maior da capacidade de o governo honrar suas obrigações.

Há um número enorme de empresas em dificuldade. Qual é a avaliação do sr. sobre essa piora? O cenário de crédito das empresas é dramático. Nós temos uma combinação perversa de contração da economia e o resultado das empresas está caindo muito. 

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Quais são as consequências? Veja o caso das empresas que tinham um grau de alavancagem moderado, de duas vezes o seu Ebitda (lucro antes de impostos, juros, depreciação e amortização) de dívida. O Ebtida cai para a metade ou um terço e esse dois vira quatro ou cinco vezes. Tem um aumento de endividamento geral das empresas simplesmente porque o resultado está sumindo, com uma escassez de crédito grande. À medida que os bancos sentem esse problema, eles têm dificuldade em aumentar as suas posições de crédito. Antes também contávamos com o mercado externo como uma outra fonte de crédito, mas essa alternativa secou. 

Vamos ver mais empresas em recuperação judicial? Vamos ver mais empresas em recuperação judicial este ano, vamos ver mais empresas quebrando, vamos ver empresas ótimas com problemas. Vamos viver um quadro nas empresas muito ruim. 

A Petrobrás vai precisar de uma capitalização? Acredito que a Petrobrás não escapa de uma capitalização. E acho que ela tem de ser em um montante suficiente para resolver a situação da empresa. Não adianta ser pequena. Uma capitalização de R$ 50 bilhões não resolve nada.

De quanto deveria ser? Tem de ser uma capitalização mais para R$ 150 bilhões a R$ 200 bilhões. No entanto, tem uma série de mudança em gestão que a Petrobrás precisa fazer. A capitalização pode ser usada como catalisadora dessas mudanças dentro da corporação. Numa capitalização dessas, se o minoritário não acompanhar de maneira proporcional, o governo poderia aumentar a fatia na empresa para 70%, 80%. Hoje, tem um pouco menos de 50%. E se o petróleo voltar para outros níveis, o governo poderá até ter feito um bom negócio. 

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