PUBLICIDADE

Publicidade

Justiça abre ação contra BankBoston no âmbito da Operação Zelotes

Ex-diretor do banco e outras 10 pessoas são acusadas de pagamento de propina; instituição teria deixado de recolher R$ 509 milhões ao Fisco

Foto do author Adriana Fernandes
Por Adriana Fernandes e Fabio Fabrini
Atualização:

BRASÍLIA - A Justiça Federal abriu nesta segunda-feira, 24, ação penal contra 11 pessoas por corrupção na Receita Federal e no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão que julga as apelações contra multas aplicadas pelo Fisco. O grupo é acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de envolvimento em esquema de pagamento de propina para livrar o BankBoston de autuações que superam meio bilhão de reais.

Conforme os investigadores, a empresa fez várias subcontratações para que o dinheiro chegasse aos julgadores da Receita Federal e do Carf. Foto: Divulgação

PUBLICIDADE

Entre os réus estão o ex-diretor jurídico do BankBoston Walcris Rosito, o auditor da Receita Eduardo Cerqueira Leite e os ex-conselheiros do Carf José Ricardo da Silva, Valmir Sandri e Paulo Cortez. Além de corrupção, os implicados vão responder por gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, apropriação de dinheiro de instituição financeira e organização criminosa.

++ Fazenda quer anular julgamentos no Carf que somam multas de R$ 30 bi

A suposta atuação na Receita e no Carf teria feito com que o Fisco deixasse de recolher R$ 509 milhões. Na ação, os procuradores do caso - que integra a Operação Zelotes - pedem que os citados também sejam condenados a pagar uma indenização de R$ 100 milhões por “danos morais coletivos”. Por conta do esquema de lavagem de dinheiro detectado na investigação, a Receita já multou os envolvidos em R$ 60 milhões. O Bank of America, antigo dono do Bank Boston, reconheceu as irregularidades e pagou à vista R$ 29 milhões ao Fisco, que autuou a instituição no início do ano.

O BankBoston foi adquirido pelo Itaú Unibanco durante a tramitação dos processos sob suspeita. Não há, contudo, executivos do Itaú Unibanco entre os denunciados.

Para obter o benefício milionário, o então diretor jurídico do Bank Boston teria feito pagamentos ao escritório Pagnozzi & Associados Consultoria Empresarial, de São Paulo. Conforme os investigadores, a empresa fez várias subcontratações para que o dinheiro chegasse aos julgadores da Receita Federal e do Carf. O próprio diretor jurídico do banco, segundo os investigadores, teria ficado com parte dos recursos do esquema.

++ Empresas questionam bônus a auditores que fazem parte do Carf

Publicidade

Os investigadores sustentam que Cerqueira Leite, lotado na Delegacia da Receita em São Paulo, tinha acesso a informações relevantes referentes a processos administrativos e, ao longo do tempo, acumulou experiência sobre os trâmites da fiscalização tributária de instituições financeiras, tornando-se um “valioso ativo” para empresas que queriam driblar o Fisco. Conforme a denúncia, o servidor recebeu R$ 1 milhão para favorecer o BankBoston.

“Ele não hesitou em mercanciar a coisa pública em detrimento dos princípios do órgão que o remunerava, vendendo por propina atos de ofício como o de informar sobre a interpretação e aplicação da legislação tributária”, descreve um dos trechos da denúncia.

A Procuradoria da República no Distrito Federal, responsável pela ação, diz que Cerqueira Leite concedeu, de ofício, uma revisão administrativa solicitada pelo banco. Só esse ato teria garantido o encerramento de um caso em que a instituição financeira sofria uma cobrança de R$ 20 milhões do Fisco.

Subcontratação. Na denúncia, consta ainda um relatório da Receita Federal elaborado a partir da análise de demandas apresentadas pelo BankBoston. Foram analisados cinco dos 31 procedimentos que passaram pela Divisão de Orientação e Análise Tributária, setor chefiado por Cerqueira Leite. Em todos, segundo o documento, há indícios de irregularidades e da concessão de benefícios indevidos ao contribuinte.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

A denúncia diz que repasses autorizados por Walcris Rosito foram feitos a partir do uso de várias empresas e de sociedades em conta de participação (SCP). O diretor jurídico do BankBoston teria ficado com R$ 880 mil.

Entre as provas incluídas no processo, constam trocas de mensagens entre os envolvidos, o que permitiu aos investigadores concluírem, por exemplo, que os contratos usados para dar aparência de legalidade aos pagamentos foram feitos posteriormente ao suposto “trabalho” prestado.

A estratégia da subcontratação se repetiu para garantir a remuneração de ex-conselheiros do Carf. A denúncia diz que em 2008, mesmo sendo contratado de forma indireta para atuar na defesa do BankBoston, o então conselheiro José Ricardo da Silva votou a favor da empresa num processo. “Pelo ato, José Ricardo recebeu a promessa de vantagens indevidas da ordem de R$ 6 milhões. Ele teria atuado em outros recursos de interesse do banco.

Publicidade

Em 2012, segundo a ação, José Ricardo apresentou, como sendo de sua autoria, um voto favorável ao banco que, na realidade, foi elaborado com a participação de outros dois conselheiros, Paulo Cortez e Valmir Sandri, agora denunciados. Valmir Sandri e um de seus sócios teriam recebido R$ 2,3 milhões.

Outro lado. O Itaú Unibanco informou que não é parte do processo e não teve acesso à decisão mencionada. O banco reafirmou que, em 2006, adquiriu as operações do BankBoston no Brasil, “sendo que o contrato de aquisição não abrangeu a transferência dos processos tributários do BankBoston, que continuaram sob inteira responsabilidade do vendedor, o Bank of America”.

“O Itaú não tem e não teve qualquer ingerência na condução de tais processos nem tampouco qualquer benefício das respectivas decisões. O Itaú esclarece, ainda, que nenhum dos denunciados foi funcionário ou diretor desta instituição”, acrescentou, em nota.

O Bank of America no Brasil foi procurado mas não se manifestou sobre o assunto. O advogado de José Ricardo da Silva, Marlus Arns disse que a defesa só vai de pronunciar depois de intimada da decisão. O defensor de Paulo Cortez, Ivan Morais, disse que não há elementos para justificar uma denúncia criminal contra seu cliente.

Ele afirmou que acredita na inocência do ex-conselheiro do Carf e que os fatos serão esclarecidos durante a “instrução probatória”. O Estado telefonou para o escritório Pagnozzi & Associados Consultoria Empresarial, mas não obteve retorno a pedido de informações sobre a denúncia. A reportagem não localizou Walcris Rosito, Eduardo Cerqueira Leite e Valmir Sandri ou algum de seus representantes.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.