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Na Grécia, disputa feroz entre o 'sim' e o 'não'

Pesquisas mostram empate técnico em plebiscito que pode definir o rumo do país

Foto do author Fernando Scheller
Por Fernando Scheller
Atualização:

ATENAS - Dois protestos, opiniões diversas, estilos diferentes. Ontem, Atenas viveu uma pacífica "batalha" de manifestações. De um lado, os defensores do "oxi" (não) reuniram uma multidão em frente à praça do parlamento grego, no centro da capital. Nas proximidades do estádio Kallimarmaro, em um bairro nobre da cidade, outro grupo considerável, mas notadamente menor, reuniu-se para advogar em favor do "nai" (sim). Enquanto diversos partidos políticos comandaram o evento em frente ao parlamento - entre eles o Syriza, do primeiro-ministro Alexis Tsipras, e o KKE, de ideologia comunista -, com discursos agressivos, a festa nas proximidades do estádio era bem mais calma. No lugar de alto-falantes ensurdecedores, apitos intermitentes. De um lado, empurra-empurra; de outro, era fácil transitar no meio da multidão. Na praça central, cães de rua circulavam tranquilamente entre os manifestantes; no bairro nobre, eles eram trazidos em coleiras e "vestiam" pequenos acessórios. No centro, um grupo passou gritando palavras de ordem: foi o suficiente para que a polícia fizesse uma fileira de proteção e que algumas lojas baixassem as portas automáticas. Nas proximidades do estádio, uma pâtisserie com portas de vidro manteve as portas abertas e aproveitou para lucrar com a aglomeração. Vendia bolos decorados, sorvetes e limonada congelada - uma tradição grega.País dividido. Segundo pesquisas divulgadas ontem, é quase impossível prever o resultado das urnas, mesmo a quase 24 horas do plebiscito. Ontem, uma pesquisa do instituto Alco mostrou uma vantagem de 1 ponto porcentual para o "sim". Outro levantamento mostrou uma diferença ainda menor. E um terceiro colocou o "não" com uma pequena vantagem. Ou seja: empate técnico. O resultado é imprevisível. O tira-teima virá só no domingo. Na praça do parlamento, o primeiro-ministro Alexis Tsipras, um ferrenho defensor no voto no "não" amanhã - até porque seu governo não conseguiu chegar a um acordo com os credores - conclamou os manifestantes a votarem contra aqueles que oprimem e ameaçam a Grécia. Ele urgiu a população a virar as costas para os opressores. O evento do "oxi" também teve participações especiais. O Enam - movimento popular de esquerda da Grécia - trouxe da Espanha uma das principais lideranças do movimento Podemos, Rafael Mayoral. Em discurso, ele afirmou que o país precisa defender sua soberania para poder definir o futuro com liberdade. E disse que a chanceler alemã Angela Merkel e a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, têm "medo" do resultado das urnas gregas.Cansaço. Entre os manifestantes na praça do parlamento, predominava o cansaço com o estado da economia grega e a falta de perspectiva para as gerações futuras. Casado com uma brasileira, o engenheiro Theofilos Ioannidis, 47 anos, citou o desemprego entre os jovens, na casa de 50%, como um motivo para uma mudança imediata de política. "Por cinco anos, nós seguimos todas as regras. E para onde foi o nosso dinheiro? Para o bolso dos políticos." Pai de dois filhos - um rapaz na universidade e uma menina no ensino médio -, ele diz que os mais jovens precisam sempre ter em mente a possibilidade de deixar o país diante da falta de oportunidades locais. "Hoje, os estudantes não têm uma perspectiva de conseguir um emprego decente nos próximos dez anos. Eu pago 55% de imposto sobre minha renda e digo que isso não pode ficar assim." Entre os manifestantes a favor do "sim", predomina o discurso de que a Grécia não vai conseguir sobreviver muito tempo sem a ajuda da União Europeia. "Nós não produzimos nada, até a nossa comida é importada", diz o advogado Anastasius Konstantinidis, 54 anos, que foi acompanhado de seu cocker spaniel à manifestação. Para ele, a situação dos bancos é tão dramática que o funcionamento precário do sistema - talvez só com os caixas eletrônicos e mais uns poucos serviços - pode durar semanas ou até meses. "Não há confiança nenhuma. Se os bancos abrirem, as pessoas simplesmente vão lá tirar o dinheiro. Somente quando tivermos um acordo definitivo com a União Europeia é que os bancos vão poder funcionar." O também advogado Dimitri Katsaounis, 37 anos, afirma que a decisão de amanhã é muito simples: "A Europa representa proteção e crescimento. A escolha é entre ficar na Europa e defender a democracia ou tentar destruir tudo com mentiras e jogos de poder", afirmou o advogado. "Estou ofendido com tudo isso." Dimitri disse que, diante da gravidade do problema, saiu pela primeira vez às ruas para protestar.  

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