Em novo livro, economista Marcos Mendes trata da repetição de erros nas políticas públicas

Objetivo da obra, que reuniu 33 colegas de Mendes para se debruçarem sobre erros do passado, é evitar a repetição desses erros na formulação de novas políticas

Publicidade

PUBLICIDADE

Por Vinicius Neder
4 min de leitura

RIO - O economista Marcos Mendes, professor do Insper, reuniu 33 colegas para se debruçarem sobre erros de políticas públicas do passado. O resultado foi organizado no livro “Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil” (ed. Autografia, 831 páginas), que será lançado na próxima segunda-feira, 30. O objetivo é evitar a repetição de erros na formulação de novas políticas, mas a tarefa não parece fácil. 

A falta de planejamento, que muitas vezes levam a erros, parece estar se repetindo constantemente, como nos casos da transformação do Bolsa Família no Auxílio Brasil e do crescimento do uso das emendas de relator, que distribuem de forma pouco transparente recursos do Orçamento, de forma desconectada das políticas públicas, disse Mendes ao Estadão.

Leia também

O economista Marcos Mendes, professor do Insper. Foto: Rafael Arbex/Estadão

“Para começo de conversa, é preciso que a sociedade esteja informada dos custos e benefícios de cada proposta de política pública. Antes de implementar uma política pública, temos que ter um estudo bem embasado, definindo quais são os objetivos, como vamos chegar lá, quanto vai custar, quais os efeitos colaterais possíveis, quais os possíveis erros que podem acontecer”, afirmou o servidor de carreira de órgãos como o Tesouro Nacional, o Banco Central (BC) e o Senado Federal, que foi assessor do Ministério da Fazenda na gestão de Henrique Meirelles, durante o governo Michel Temer (MDB).

Segundo o economista, o problema do Brasil nessa área é que a fragmentação do sistema político e a necessidade de conciliar interesses divergentes, por causa da elevada desigualdade socioeconômica, dificultam esse processo decisório. A fragmentação da representação política facilita que parlamentares atuem mais no interesse de grupos específicos do que da sociedade como um todo. As desigualdades levam cada grupo social a ter um interesse muito diferente do outro em relação às políticas públicas.

“Interesses existem em todas as sociedades, mas é preciso ter instituições políticas e eleitorais que filtrem esses interesses, equilibrem esses interesses e, sobretudo, joguem luz sobre esses interesses”, afirmou Mendes.

Os 25 capítulos do livro reúnem autores como Edmar Bacha, um dos formuladores do Plano Real, Samuel Pessôa, sócio-diretor do Julius Baer Family Office e pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV), Elena Landau, que comandou a área de privatizações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nos anos 1990, e Ricardo Paes e Barros, professor do Insper. O prefácio foi escrito por Marcos Lisboa, também professor do Insper, e a apresentação ficou a cardo do ex-presidente do Banco Central Ilan Goldfajn, hoje diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Continua após a publicidade

Cada capítulo se debruça sobre um conjunto de políticas públicas, em diferentes áreas. Alguns dos temas são os estímulos fiscais (tanto adotados pelo governo federal quanto por Estados e municípios), o sistema de impostos e o uso de benefícios tributários. O próprio Mendes assina um capítulo sobre o Fundo Soberano do Brasil (FSB), criado para “aplicar os excedentes fiscais” e “fazer política fiscal anticíclica”, mas que acabou causando “prejuízos financeiros e patrimoniais”, até que foi extinto em 2019.

A política monetária do primeiro governo Dilma Rousseff (PT), frequentemente criticada por ter baixado a taxa básica de juros sem fundamentos econômicos para isso, também é objeto de análise. O Programa de Sustentação dos Investimentos (PSI), uma das “políticas anticíclicas” adotadas para mitigar os efeitos da crise financeira internacional de 2008, destino de boa parte dos aportes bilionários feitos pelo Tesouro Nacional no BNDES, também foi analisado.

“Seguindo o padrão típico de políticas públicas que beneficiam grupos bem organizados, o PSI foi prorrogado para além do período de crise econômica, deixando de ser uma ferramenta anticíclica e perenizando o subsídio e o direcionamento do crédito. Seu custo fiscal acumulado foi de R$ 285 bilhões”, resume Mendes, na introdução do livro.

A Previdência social, incluindo as regras especiais para os militares, mereceu dois capítulos. Instrumento criado com o intuito de ampliar a base de contribuição previdenciária, a figura jurídica do Microempreendedor Individual (MEI) também foi objeto de análise.

“O MEI é fonte de crescente déficit. Os autores calculam o valor presente do desequilíbrio atuarial em R$ 436 bilhões, mesmo partindo de hipóteses otimistas. O problema é que esse grande subsídio previdenciário não está sendo feito aos mais pobres: apenas 16% dos filiados ao MEI estão entre os 50% mais pobres”, diz a introdução do livro.

Há também análises sobre as políticas para os setores de energia elétrica e de petróleo e gás, incluindo as exigências de conteúdo local. As políticas de apoio ao setor automotivo também são criticadas, assim como a inserção da economia brasileira no comércio internacional. Políticas de educação são analisadas em quatro capítulos.

“Olhar para os erros não é questão de pessimismo. É cumprir a função essencial de aprender com eles”, afirmou Mendes ao Estadão.

Continua após a publicidade

LIVRO 

Título: “Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil”

Editora: Autografia

Preço: versão e-book gratuita pelos sites da Amazon, Barnes & Noble, Apple Books e Livraria Cultura 

Capa do livro 'Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil'. Foto: Divulgação

 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.