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Economia e políticas públicas

Opinião|Nuvens pesadas

Há uma catástrofe fiscal se desenrolando em diversos Estados brasileiros

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Atualização:

O governo Temer toca o barco, mas certamente seus tripulantes mais antenados já divisam no horizonte pesadas nuvens de tempestade. Até agora, o presidente vinha desfrutando da combinação de certa apatia social, sucesso na tramitação de legislações no Congresso e otimismo e altas no mercado financeiro. Não é uma fórmula mágica de popularidade, mas dá para o gasto de governar sem maiores trepidações.

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O quadro, porém, está mudando, e para pior. A primeira e provavelmente maior perturbação é que a tão acalentada recuperação da economia, depois da pior recessão em um século, está vindo (se é que está vindo) num ritmo e numa intensidade muito decepcionantes.

Para perceber isso, é só observar o mergulho das projeções de crescimento do PIB no terceiro trimestre. “O mercado inteiro está revisando para baixo”, diz Solange Srour, economista-chefe da gestora de recursos ARX, no Rio.

Há alguns meses, havia economistas que apontavam chances razoáveis de o PIB parar de cair no terceiro trimestre deste ano. Eles se referiam à comparação com o segundo trimestre, livre de influências sazonais. Nessa base de comparação, o PIB já vem caindo há seis trimestres.

Mais recentemente, as previsões pioraram para uma pequena queda do PIB no terceiro trimestre, algo como -0,2%. Mas a coisa não ficou por aí. A indústria despencou em agosto, recuperou-se pouco em setembro, e os serviços continuaram piorando, na esteira da deterioração do mercado de trabalho. Como resultado, as projeções para o PIB do terceiro trimestre sofreram mais uma rodada de piora, e já há quem preveja queda de 1%.

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Aliás, é precisamente -1,0% que aponta o cálculo adaptado para o Brasil da metodologia do americano Índice de Atividade Nacional do Fed de Chicago (CFNAI, na abreviação em inglês), num exercício feito por Leandro Padulla, economista da consultoria MCM. O CFNAI é um sofisticado indicador mensal de atividade econômica. Mesmo com o resultado do exercício, Padulla ainda prefere calibrar sua projeção para o terceiro trimestre em queda de 0,8%, o que já é uma piora em relação à previsão anterior de -0,6%.

No frigir dos ovos, o que importa mesmo é o que o PIB do terceiro trimestre e outros indicadores vêm sinalizando sobre a economia em 2016 e 2017: respectivamente, uma queda de aproximadamente 3,5%, seguida por um crescimento pífio, em torno de 1% ou até menos.

Do ponto de vista da governabilidade de Temer, essa decepção com o crescimento (que bate diretamente na população por meio do desemprego e da queda da renda) se combina com a “elevação da temperatura social”, nas palavras do analista político Ricardo Ribeiro, também da MCM.

Há uma catástrofe fiscal se desenrolando em diversos Estados brasileiros

Os exemplos mais recentes desse “clima quente” são a invasão do Congresso Nacional por um grupo de extrema-direita e o clima de guerra que se instaurou em torno da Assembleia Legislativa do Rio, com servidores enfurecidos com o pacote de ajuste fiscal do governador Luiz Fernando Pezão.

Há uma catástrofe fiscal se desenrolando em câmera lenta em diversos Estados importantes brasileiros. Esse fato, por sua vez, pode despertar o tipo de ira e combatividade dos setores afetados que o PT e a esquerda tentaram inutilmente insuflar na população em geral para fazer frente ao impeachment e à PEC 241, do limite de gastos. A grande questão, portanto, é se a revolta contra o governo do Rio, que pode se replicar em outros Estados, poderia eventualmente subir para o nível federal, criando um custo real de impopularidade para os políticos que apoiarem as reformas de Temer.

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Como se tudo isso não fosse problema suficiente, Donald Trump ganhou a eleição americana, levando à desvalorização do real e à alta dos juros internacionais e domésticos – tudo de que a economia brasileira menos precisa neste momento. As habilidades de capitão de Michel Temer serão duramente testadas.

COLUNISTA DO BROADCAST E CONSULTOR DO IBRE/FGV

Opinião por Fernando Dantas
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