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Economia e políticas públicas

Opinião|O capitão do Titanic

Segundo Julio Bueno, para cada coronel da Polícia Militar no Rio na ativa, há 60 inativos

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

O secretário da Fazenda do Rio de Janeiro, Julio Bueno, relata mudança de tratamento por parte do Ministério da Fazenda no governo de Michel Temer. “Antes, eu me sentia como o cliente inadimplente de um banco alemão; agora, pela primeira vez, fui tratado corretamente e me perguntaram qual é o meu problema.”

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Bueno, engenheiro da Petrobrás, ex-presidente do Inmetro e da BR Distribuidora, está no meio do furacão da crise financeira dos Estados. O Rio já deixou de fazer um pagamento da dívida externa, estourou o limite de endividamento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e atrasou salários, aposentadorias e pagamento de fornecedores.

Recentemente, o secretário foi cobrado por causa do salário de R$ 65 mil, acúmulo do ganho de secretário estadual com o de executivo licenciado da Petrobrás, prática corrente com funcionários de estatais cedidos a governos. “Quem faz meu salário não sou eu, é quem me emprega, seguindo as regras estabelecidas”, ele diz.

Com seu jeito intenso e vocabulário entremeado de gírias cariocas, Bueno é um narrador adequado para a grande crise dos Estados brasileiros.

Com receitas anuais de R$ 50 bilhões ou um pouco mais, o Rio tem despesas de aproximadamente R$ 70 bilhões. Um total de R$ 42 bilhões é gasto com salários e Previdência do funcionalismo; R$ 10 bilhões são serviço da dívida com a União; e R$ 13 bilhões são transferências obrigatórias para municípios. Do restante, boa parte é “custeio indexado”, como Saúde e Educação, atreladas à receita corrente líquida (RCL), ou custeio dos outros poderes na esfera estadual.

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Tirando R$ 1 bilhão para custeio da segurança, onde naturalmente não é aconselhável economizar, sobram R$ 3,5 bilhões para custear todo o resto do governo. E é apenas desses R$ 3,5 bilhões, segundo Bueno, que o Rio pode economizar para fechar um rombo que se aproxima de R$ 20 bilhões. Com exceção, é claro, da “economia” no serviço da dívida com a União, objeto de dificílima negociação do governo federal com os Estados.

Antes de explicar como o Rio (com vários outros Estados) chegou a esse ponto, Bueno ressalva: “Sou o capitão do Titanic, mas não projetei nem construí o Titanic, nem inventei o iceberg”. O seu diagnóstico é simples: a conjunção de uma “depressão econômica”, que devastou as receitas estaduais (intensificada no Rio pela queda dos royalties do petróleo e da atividade da Petrobrás e da cadeia petrolífera), com uma Previdência do funcionalismo dos Estados que é absolutamente inviável. Quanto ao primeiro fator, ele explica que a receita do Rio, em termos reais, se expandia 6% ao ano entre 2007 e 2013, e cai a um ritmo anual de 10% em 2015 e 2016.

Já a Previdência apresenta um déficit entre receita e despesa de R$ 13 bilhões a R$ 14 bilhões, o grande vilão do rombo estadual. E não é para menos. Regida por leis federais, como em todos os Estados, a Previdência do Rio destina 66% dos pagamentos para professores e policiais militares, que têm regimes especiais. Assim, reúne os benefícios muito mais altos (comparados ao INSS) do servidor público com idade média de aposentadoria de apenas 56 anos. O ganho dos inativos está ligado aos salários dos ativos. Para cada coronel da PM no Rio na ativa, há 60 inativos, diz.

Outros Estados “quebrados” como o Rio vivem situação semelhante, diz Bueno: Minas tem um rombo previdenciário de R$ 10 bilhões e o Rio Grande do Sul, de R$ 9 bilhões. O de São Paulo é de R$ 18 bilhões, mas o secretário coloca o Estado numa categoria mais sólida, por conta da enorme receita líquida.

Possivelmente com algum exagero (já que ele mesmo menciona situações melhores de alguns Estados), Bueno profetiza que “todos quebrarão”. E é bem possível mesmo que muitos Estados quebrem. Como se já não faltassem problemas para o governo Temer com o ajuste das contas federais.

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