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O que virá depois?

O déficit nominal – soma do déficit primário (receita tributária menos gastos não financeiros) com os encargos da dívida pública (juros) –, que estava em 2,27% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2012, ultrapassou 6% em 2014, chegando a 10,38% em 2015. Esse descontrole crescente nas contas públicas provocou a queda da confiança dos investidores e, em consequência, a retirada do selo de bom pagador atribuído ao Brasil pelas agências internacionais de rating.

Por Paulo Paiva
Atualização:

Reverter essa tendência é o principal desafio do governo Temer para reconquistar confiança. Por isso encaminhou Proposta de Emenda Constitucional (PEC 241) ao Congresso Nacional limitando o crescimento das despesas da União à variação da inflação no ano anterior. Essa drástica medida tem como objetivo estancar o crescimento desordenado dos gastos públicos, permitindo a volta do equilíbrio fiscal e, depois, do crescimento da economia.

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Se, na composição do déficit público nominal, o déficit primário representa apenas 18% do seu total, por que não mirar, então, nos outros 82%, reduzindo a taxa de juros para antecipar a retomada do crescimento? Porque política fiscal restritiva contribui para a redução da inflação e dá maior flexibilidade ao Banco Central para conduzir a política monetária, visando a atingir a meta de inflação e a baixar a taxa de juros. A combinação de responsabilidade fiscal com meta de inflação é o único caminho para que, simultaneamente, o déficit público, a inflação e a taxa de juros caiam. Não há mágica.

Nesta semana, acordado com os governadores, Temer deu outro passo importante na construção de um novo regime fiscal ao estender aos Estados o teto de gastos estabelecido na PEC 241.

Essas decisões repercutiram positivamente no mercado, que já via sinais de reversão do processo recessivo com a desaceleração recente da queda na economia. A volta da confiança é condição necessária, mas não suficiente, para a recuperação econômica. O risco está na demora da passagem das expectativas para os resultados concretos.

Inicialmente caberá ao Congresso Nacional, nesses tempos tão conturbados, entender a sua responsabilidade para a recuperação da economia brasileira, aprovando a PEC 241, para que seus efeitos impactem o Orçamento em 2017.

Depois virá a difícil tarefa do governo de adaptar sua gestão à nova realidade dos próximos 10 anos. O limite global dos gastos e a vinculação dos gastos com educação e saúde à inflação impõem maior rigidez ainda à execução orçamentária e, em consequência, requerem mudanças profundas na sua gestão.

Algumas despesas significativas, como com a Previdência Social, que, com a inclusão de novos beneficiários, vem na última década crescendo acima da inflação, e com o pessoal ativo, que tem um crescimento vegetativo em função de promoções em diversas carreiras, provocarão necessariamente a redução de outras despesas. O caminho de menor resistência para esse ajuste será, inicialmente, cortar despesas discricionárias, reduzindo até a sua eliminação total os investimentos da União e as transferências voluntárias para os Estados e municípios. Mas e depois?

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Torna-se necessária uma gestão competente para melhorar a eficiência governamental, que avalie a eficácia de programas e estabeleça algum tipo de incentivo para órgãos e ministérios, que, reduzindo gastos, obtenham ganhos de produtividade. Fazer mais e melhor com menos.

Ainda, do lado das despesas, há que eliminar por completo as isenções tributárias, algumas que também incidem sobre os orçamentos estaduais e subsídios, como a diferença entre as taxas Selic e TJLP, por exemplo.

O governo federal, ademais, terá de adequar ao novo regime algumas decisões suas que impõem gastos aos governos estaduais, como a fixação do piso salarial para professores e a política de salário mínimo.

Para reduzir o tempo de ajuste ao novo regime, não se pode descartar o aumento da receita com mais imposto, cuja discussão deverá voltar após o término da interinidade. Que seja provisório, coincidindo, no máximo, com o período de vigência do limite dos gastos, e decrescente em razão do crescimento da economia.

Enfim, o sucesso em conciliar sustentabilidade fiscal com crescimento econômico dependerá do que virá depois.

Professor associado da Fundação Dom Cabral. Foi ministro do Trabaho e do Planejamento e Orçamento no governo FHC