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O real diante do novo cenário externo

A recente decisão do Fed (o banco central dos EUA) de adiar a redução dos estímulos à economia norte-americana tem provocado alterações nos mercados financeiros internacionais, com impactos no Brasil. Uma das consequências internas está na reversão da desvalorização do real, que também foi influenciada pelas intervenções que têm sido feitas pelo Banco Central brasileiro.É curioso observar a volatilidade do real, que ao longo dos últimos anos alternou períodos de forte valorização com outros de desvalorização. A instabilidade da moeda gera dificuldades para os investidores. Diante da incerteza, os formadores de preços perdem parâmetro para o fechamento de contratos, o que gera adiamento de decisões importantes para os investimentos, produção e negociações comerciais.A tendência à desvalorização do real, no entanto, é inexorável. A mudança do quadro internacional provocada pela retirada dos estímulos nos EUA pode demorar, mas em algum momento ela ocorrerá.Do ponto de vista das condições internas, também há fatores que devem impulsionar a tendência à desvalorização do real. A situação das transações correntes do balanço de pagamentos, que já acumula um déficit de US$ 80,6 bilhões nos últimos 12 meses até agosto, equivalente a 3,6% do PIB, é um fator que levará à desvalorização do real.A situação do déficit não é expressiva, tendo em vista o razoável conforto das reservas cambiais brasileiras, de US$ 375 bilhões (em 20/9/2013), e o ingresso de capitais externos, com destaque para o investimento direto estrangeiro, acumula US$ 61 bilhões nos últimos 12 meses até agosto. Não estamos, portanto, diante de um risco de insolvência externa, muito pelo contrário. No entanto, apesar disso, chama a atenção a velocidade de deterioração do déficit em conta corrente brasileiro, que em apenas cinco anos quintuplicou. Trata-se, evidentemente, de uma trajetória insustentável e que tem de ser revertida, pois, no limite, nos levaria a uma crise cambial de consequências nefastas para a economia brasileira.Nesse sentido, a desvalorização do real poderá ser uma aliada importante no ajuste das contas externas brasileiras. Assim, o fundamental para as autoridades monetárias será conduzir o processo de desvalorização de forma a preservá-la em termos reais, ou seja, evitando ao máximo os repasses aos preços.O real mais desvalorizado tem impactos positivos sobre a competitividade da produção brasileira, fomentando exportações e inibindo parte das importações. Mas esse não é um processo imediato e automático. Depende da alteração de estratégias empresariais, que leva certo tempo, até que aqueles que tomam decisões se convençam da nova realidade cambial e retomem a produção local ou seus clientes no exterior, o que nem sempre é fácil e rápido. Além disso, há outros fatores de competitividade desfavoráveis e que afetam nossa capacidade de concorrer pelo menos em igualdade de condições, seja no mercado doméstico ou no internacional.Será muito importante evoluir na melhora do ambiente sistêmico, de forma a propiciar mais condições para a geração de valor agregado local. Da mesma forma, é importante rever a estrutura tarifária, que apresenta distorções. É preciso favorecer as importações de matérias-primas, máquinas e componentes que possam dar mais competitividade à produção doméstica, deixando a proteção para os elos finais da cadeia de produção.Essas medidas se tornaram ainda mais prementes tendo em vista um quadro no cenário internacional que acirrou a concorrência, como tende a ocorrer nos períodos de "vacas magras" da economia mundial. A integração do Brasil às cadeias globais de valor também passa por uma postura mais ativa nas negociações bilaterais, destravando amarras e buscando facilitar o acesso aos mercados de interesse das empresas aqui instaladas.*Antonio Corrêa de Lacerda é economista, professor-doutor da PUC-SP, consultor e coautor do livro 'Economia Brasileira'. 5ª edição, 2013. E-mail: lacerda.economista@gmail.com

Por Antonio Corrêa de Lacerda
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