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‘O ritmo da retomada ainda está muito lento’, diz economista da FGV

Para a coordenadora do Boletim Macro Ibre, com o cenário econômico atual, ainda não dá para descartar um PIB zero ou negativo no ano

Por Vincíus Neder
Atualização:
No cenário atual, qualquer sinal de fraqueza vira um alerta, afirma Silvia Matos 

RIO- Economistas do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) ainda não revisaram projeções para o PIB de 2017 após a frustração com dados de janeiro sobre os setores de comércio e serviços e o desempenho da indústria no primeiro bimestre, mas estão preocupados. O viés, agora, é para baixo, segundo Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro Ibre. A seguir, os principais trechos da entrevista: 

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Mudaram as projeções diante dos dados do primeiro trimestre? Refazer todas as projeções demora um pouco, mas começamos a ficar um pouco preocupados. Antes, eu tinha segurança maior sobre os números do PIB. Esperamos crescimento na margem (no primeiro trimestre em relação ao quarto trimestre de 2016) de 0,3%, com a agropecuária ajudando. Sem ela, seria uma queda de 0,3%. Esse número do primeiro trimestre, de maneira qualitativa, não deve mudar muito.

Qual dado é mais importante? Um fator superimportante é como a gente está vendo a indústria. Ela tem mostrado desempenho melhor, sem dúvida, do que foi observado ano passado, mas esse dado de fevereiro soou um alarme. Estava um pouquinho mais otimista com a indústria de transformação. A extrativa vai contribuir positivamente para o PIB, mas a transformação tem mostrado crescimento abaixo do esperado. Isso tem impacto não só no número de curto prazo, mas na dinâmica que vamos observar ao longo do ano. Tem um risco, realmente, de ter de fazer uma revisão para baixo no PIB.

Por que a indústria é tão relevante? Os dados de indústria alimentam outras projeções. A gente sabe que o PIB de serviços vai demorar um pouco mais a recuperar. Então, quem está liderando esse processo de recuperação gradual é a indústria. Há algum tempo a produção industrial parou de cair e há alguns meses tem mostrado alguma recuperação, na indústria agregada. A indústria de transformação é a que tem rateado um pouco mais. Qualquer sinal de fraqueza dá um certo alerta. Vimos a indústria de transformação em terreno positivo em janeiro, mas em fevereiro já ficou em terreno negativo. Se confirmar o cenário mais pessimista, esse número para o ano fechado, não dá para descartar um PIB zero ou negativo. Como tem espaço de queda de juros, a gente pode acelerar mais para o segundo semestre, mas tem de contar com apoio político para as reformas. 

A recuperação pode ser interrompida? É um ritmo lento, talvez um pouco mais lento do que esperava. Por enquanto, não é um cenário de reversão. Mas um cenário com alguma dificuldade mais clara do governo com a reforma da Previdência pode gerar mau humor no mercado, com alta do câmbio e do risco país. O mercado está esperando com paciência, mas até quando aguenta más notícias?

Qual a maior frustração com os dados divulgados até agora? Talvez o que mais me frustrou foi o dado de emprego. O emprego formal tem mostrado alguma melhora, apesar de muito pequena. Aquele emprego por conta própria, que estava segurando, está mostrando recuo muito grande. A gente sabe que tem um efeito retardado no mercado de trabalho, mas eu esperaria um resultado um pouquinho mais otimista. Dos nossos números, um dos que mais surpreenderam foi a piora no pessoal ocupado, não causada pelo emprego formal, mas por causa do trabalho por conta própria. Isso é muito ruim para o cenário de consumo. Hoje, a proporção de trabalhadores por conta própria na Pnad Contínua é mais de 20 milhões de pessoas. 

Está pessimista com a economia? Ainda não, pois vejo os industriais falando que está melhorando. A situação melhorou. Isso dá um certo alento. A construção está um desastre, mas já sabia que seria assim. Tanto que o investimento agregado vai ser um desastre. Se a indústria ficar um pouco mais lenta, o investimento do setor também fica limitado. Este ano é muito melhor do que o ano passado, mas é um ritmo ainda muito lento. Estamos aprendendo que o cenário é muito devagar e sempre. E quando é muito devagar, a gente começa a se questionar se realmente há riscos de demorar muito mais para sair dessa recessão. 

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Há algum sinal de alento? O que dá um certo alento são nossos indicadores qualitativos. Continuam mostrando melhora, não só em relação ao futuro. A situação atual ainda está rateando bastante, mas não houve reversão. Ou seja, há melhora gradual na confiança dos empresários e dos consumidores. Além disso, ainda temos espaço para reduzir juros. O Banco Central tem colocado isso na mesa. Para este ano, a inflação não é problema.

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